Amazônia tem potencial para novas pandemias

Pesquisadora da UFRJ faz parte de grupo que alerta sobre a relação entre o desmatamento e a emergência de novos vírus

Se preservar a Amazônia, região que inclui nove países sul-americanos, já é relevante para atenuar as mudanças climáticas, cada vez mais se descobre que combater o desmatamento é importante para evitar a propagação de vírus que podem se transformar em pandemias as quais afetam toda a humanidade. A professora Mariana Vale, do Departamento de Ecologia da UFRJ, é uma das pesquisadoras mundiais da relação entre o desmatamento das florestas e as emergências de novas infecções transmitidas por animais que moram em biomas os quais sofrem com a ação humana. Em decorrência da enorme biodiversidade, ao mesmo tempo em que guarda a resposta para diversos males, a Amazônia também pode ser uma ameaça.

De acordo com a professora, a região abriga alta concentração de mamíferos portadores de vírus com potencial patogênico e que podem ser transmitidos aos seres humanos. A brasileira integra um grupo internacional de cientistas os quais vêm alertando que a devastação da floresta precisa ser discutida pela comunidade global com mais vigor. No final de março, Mariana Vale foi uma das autoras de um estudo intitulado Uma futura pandemia vir da Amazônia?. Na análise, os pesquisadores pedem uma ação urgente para diminuir as chances de que outro vírus causador da pandemia seja transferido da vida selvagem para os humanos.

O estudo foi liderado por Mariana Vale, com modelagem de Pablo Marquet, da Pontifícia Universidade Católica do Chile, e apoiado por oito coautores adicionais, incluindo Carlos Scaramuzza, do Instituto Internacional de Sustentabilidade do Rio de Janeiro, e os cientistas Patrick Roehrdanz e Jonah Busch, da Conservation International Lee Hannah.

O estudo aponta que pandemias modernas são causadas por vírus e estão em ascensão. A cada 20 anos aproximadamente, ao longo dos últimos 150 anos, surge uma nova disseminação mundial de uma doença, e a COVID-19 mostrou que mais vale investir bilhões de dólares na prevenção do que ter perdas econômicas globais de dezenas de trilhões de dólares, perda de milhões de vidas e incalculável perturbação social. Para o grupo, há o risco crescente de ocorrer o processo chamado “transbordamento”, no qual, nas áreas limítrofes, os morcegos, por exemplo, podem carregar vírus da vida selvagem para os humanos.

Para a professora da UFRJ, doenças como a malária e a febre amarela já mostraram uma relação clara entre desmatamento e epidemias e pandemias. O novo coronavírus e o HIV são exemplos de que existem muitos vírus desconhecidos que vivem em macacos, morcegos e roedores, entre outros possíveis hospedeiros que habitam a região amazônica. “À medida que se desmatam as florestas para a extração de madeira e atividade agrícola, pecuária, campos de mineração, assentamentos ou expansão de centros urbanos em direção à floresta, ampliam-se as bordas das florestas tropicais, que são importantes plataformas de transbordamento de novos vírus para os humanos.”

Mariana Vale explica que não é possível prever com exatidão quando e onde ocorrerá uma próxima pandemia, mas existem mapeamentos das áreas de risco para a emergência de novas doenças infecciosas. Segundo ela, existe um projeto de pesquisa internacional, o Projeto Viroma Global (PGV), que pretende mapear, nos próximos dez anos, 99% de todos os vírus com potencial pandêmico do mundo. O Brasil é um dos principais lugares a ser pesquisado em escala global. “Fazer o levantamento para medir o tamanho da população humana nas áreas onde é alta a taxa de contato com animais silvestres também é essencial para diminuir os riscos”, concluiu Vale.

Por Sidney Coutinho