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UFRJ cria modelo preditivo para evolução da pandemia de COVID-19

Estudo foi feito em parceria com a Universidade de Bordeaux, da França

Os pesquisadores do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe/UFRJ) Carolina Naveira-Cotta e Renato Cotta e o especialista em simulação de epidemias Pierre Magal, da Universidade de Bordeaux (França), desenvolveram um modelo matemático que permite traçar previsões para o número de casos da COVID-19, reportados e não reportados, bem como o pico da pandemia em cenários com diferentes medidas de saúde pública.

Produzido com apoio da Marinha do Brasil, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), o estudo foi publicado no site MedXriv, no final de março, e será publicado em um número especial da revista Biology, em maio.

Por solicitação da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), os cientistas da Coppe têm fornecido simulações demandadas para diferentes cenários e regiões do Brasil. O artigo chamou a atenção da Abin, que havia formado um grupo de trabalho interdisciplinar para avaliar diferentes ferramentas de simulação da evolução da COVID-19, doença provocada pelo novo coronavírus.

O trabalho é baseado em modelo epidemiológico que lida com a pandemia introduzindo casos não reportados na modelagem e avalia as consequências das intervenções de saúde pública.

“Os casos reportados são apenas uma fração do número total de indivíduos com os sintomas. É preciso considerar também os casos não reportados. Usamos como referência o modelo já utilizado em previsões relacionadas a outras doenças/epidemias, como casos recentes de epidemias de influenza (gripes), cujo número de infectados não reportados é grande, assim como no caso da COVID-19”, explicou Carolina.

Segundo ela, a intenção da pesquisa é suprir, com uma ferramenta complementar, aquelas ferramentas já empregadas pelos órgãos responsáveis pelo controle da epidemia, seja regional, seja nacionalmente.

Os dados disponíveis acerca dos casos confirmados no Brasil, entre 25/2 e 29/3, foram usados para estimar parâmetros e prever a evolução da epidemia. Os pesquisadores consideraram 25/2, data do primeiro caso reportado no país, o marco temporal para prever o pico da doença no Brasil.xa0Em seguida, simularam as intervenções de saúde pública, tanto para o controle da taxa de transmissão do vírus, quanto para a fração do número total de indivíduos reportados com os sintomas.

Até a data de fechamento do estudo, os autores traçaram cinco cenários hipotéticos com medidas de saúde pública para controle da doença no Brasil.

“Os cenários estudados incluem variações em parâmetros que resultam de fatores como distanciamento social, hábitos de higiene e proteção individual, intensificação de testes para isolamento de infectados e outras medidas de reorganização social. A sensibilidade do modelo a esses parâmetros foi então avaliada por meio de cinco cenários: 1º) manter-se as medidas de contenção e mitigação no nível atual; 2º) intensificar progressivamente o distanciamento social; 3º) reduzir progressivamente o distanciamento social; 4º) intensificar o isolamento de infectados pela testagem mais numerosa da população; 5º) combinar a testagem ampliada com a intensificação do distanciamento social”, explica a pesquisadora.

 


Carolina Naveira-Cotta é pesquisadora da UFRJ – foto: Coppe

Sobre o modelo e sua confiabilidade

De acordo com o artigo assinado pelos pesquisadores, intitulado Parametric identification and public health measures influence on the COVID-19 epidemic evolution in Brazil, cada país ou região requer uma combinação específica de medidas, devido à distribuição espacial de sua população, estrutura etária, capacidade do sistema de saúde e características socioeconômicas. “Essas especificidades exigem um modelo matemático que permita, com urgência e agilidade, simular as intervenções possíveis para controle da epidemia”, destacou.

Os autores aperfeiçoaram um modelo epidemiológico chamado SIRU para traçar prognósticos do avanço da COVID-19 no Brasil, analisar a efetividade das medidas de saúde pública e simular o controle da doença. SIRU é o acrônimo para indivíduos suscetíveis (S), infectados assintomáticos (I), infectados sintomáticos reportados (R) e infectados sintomáticos não reportados (U).

O novo coronavírus, SARS-CoV2, causou os primeiros casos de contaminação humana no final de 2019, em Wuhan, na China, e, no dia 11/3, a COVID-19 foi considerada uma pandemia pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Os países e cidades atingidos implementaram uma série de medidas para conter o avanço da doença, incluindo distanciamento social, quarentena e testes em massa. A China, por ser o local de origem do vírus, oferece as séries de dados mais longas tanto em relação ao avanço da doença, quanto aos efeitos das intervenções de saúde pública.

Carolina Naveira-Cotta, Renato Cotta e Pierre Magal utilizaram os dados chineses, considerando que a epidemia estava na fase final de sua evolução, para “treinar” o modelo.xa0“Usamos um terço dos dados disponíveis da China para estimar os parâmetros do modelo e depois fazer a previsão dos outros dois terços dos dados. Ao compararmos a nossa previsão com esses dois terços restantes, observamos uma excelente concordância do modelo com os dados reais da China. Isso foi bastante animador e, por isso, passamos para a análise dos dados do Brasil. Cerca de 30 dias depois de termos realizado as estimativas, obtinha-se ainda uma boa concordância com os dados de casos reportados fornecidos diariamente pelo Ministério da Saúde, como no exemplo da China, com um desvio médio inferior a 5%. Esse modelo só precisou ser reestimado a partir do final de abril, com a intensificação da testagem no país, um cenário de intervenção em saúde pública anteriormente previsto pelo modelo no estudo original”, avalia a professora do Programa de Engenharia Mecânica (PEM) da Coppe.

“Nossa ideia inicial não foi disponibilizar a ferramenta ao público porque, para isso, teríamos o desafio de criar uma interface amigável em um espaço de tempo muito curto, mas, voluntariamente, oferecemos o nosso conhecimento para implementar quaisquer cenários planejados pelos órgãos responsáveis. Continuamos à disposição para colaborar e, mais recentemente, fomos contatados pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde”, complementa Carolina Naveira-Cotta.

Os cientistas da Coppe fizeram contato com diferentes colaboradores, dentro e fora da UFRJ, para colher críticas e sugestões, estimular iniciativas similares e oferecer melhoramentos e comparações, visando reforçar a confiança no uso dessas simulações pelos gestores em diferentes níveis.

Da Assessoria de Comunicação Social da Coppe/UFRJ (com adaptações)