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Concordata Brasil-Santa Sé X Estado laico

 A mesa-redonda “A Concordata Brasil-Santa Sé: política, direito e religião” debateu as contradições do acordo entre o Brasil e o Vaticano frente à Constituição brasileira, que prega o Estado laico. Sediado no auditório da Decania do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH), o evento realizado na sexta-feira (27/11) teve como mediador Luiz Antônio Cunha, coordenador do Observatório da Laicidade do Estado (OLE), e reuniu Carlos Roberto Jamil Cury, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG), Daniel Sarmento, Procurador Regional da República e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), além de Emerson Giumbelli, sociólogo e professor da UFRJ.

“Estamos em um momento de retrocesso do processo da laicidade”, afirmou Cunha. Os palestrantes concordaram que o tratado assinado por Lula e pelo papa Bento XVI representa uma afronta ao Estado laico brasileiro, acordado em 1890. “Apesar de a laicidade ser antiga aqui, a separação do Estado e da religião ainda não se consumou”, alegou Sarmento, exemplificando com o elevado número de feriados religiosos no calendário do país. 

Segundo Sarmento, a laicidade permite igualdade entre as crenças, liberdade de culto e autonomia das religiões em relação ao Estado, e vice-versa. “Não implica o Estado ser ateu, ele não deve ter posição nenhuma.” O advogado afirmou que o objetivo não é excluir expressões religiosas do espaço público ou da política. “É preciso apenas ter certeza de que os atos do Estado serão baseados em razões públicas.” 

Sarmento acredita que um dos pontos mais problemáticos da Concordata é o que se refere à adoção do ensino religioso nas escolas públicas. “Não acho que haveria chance de considerar toda a Concordata inconstitucional, mas temos chance com o ponto do ensino.” Cury concordou com o advogado: “Ao especificar a confessionalidade, a Concordata pesou sobre a Constituição brasileira”.

Cury ainda defendeu ampla votação para que a Concordata seja implementada. Giumbelli também atentou para o fato de que a maioria dos pronunciamentos foi contrária ao acordo. “Apesar da oposição, ela foi aprovada e não houve qualquer consulta à sociedade.”

Em contrapartida à Concordata Brasil-Santa Sé, os parlamentares evangélicos escreveram a Lei Geral das Religiões. De acordo com Giumbelli, foi uma tentativa de mostrar a força política dessa instituição, apesar de se referir às religiões em geral. O sociólogo, no entanto, afirmou ser muito difícil regulamentar os diversos e miscigenados credos do Brasil. “Será que essa intervenção não passará por cima das assimetrias das religiões?”, questionou.