O debate “Realidade do Aborto Inseguro: o Impacto da Ilegalidade do Abortamento na Saúde das Mulheres e nos Serviços de Saúde do Rio de Janeiro” aconteceu nessa quarta (7/10), promovido pela Frente Nacional pelo Fim da Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto. A Escola de Enfermagem Anna Nery (EEAN) da UFRJ e a Associação Brasileira de Enfermagem do Rio de Janeiro (ABEn/RJ) apoiaram o evento, realizado no auditório Quinhentão do Centro de Ciências da Saúde (CCS) da UFRJ. A programação começou com a exibição do filme “O Aborto dos Outros”.
Rogéria Peixinho, membro da Frente Nacional pelo Fim da Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto, lembrou da abertura da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Aborto, destinada a investigar e perseguir movimentos como o que ela realiza. “A CPI está debaixo do pano e a qualquer momento pode vir à tona. As perseguições chegam aos nossos telefones e somos acusadas de fazer apologia ao crime”, relata.
A frente defende a ideia de que nenhuma mulher deve ser presa, humilhada ou punida pela prática de aborto. Deve haver igualdade de tratamento a todos que procuram serviços de saúde pública, inclusive mulheres que se decidem pelo aborto.
O catolicismo segue uma ideologia de oposição à prática do aborto. Maria Antonieta Rubio Tyrrel, diretora da EEAN, argumentou que, na Itália, país onde está situado o Estado do Vaticano, o aborto é legalizado. “Trata-se de uma perspectiva de luta pelos direitos humanos”, diz ela. Segundo a diretora, a EEAN tem um compromisso com a população, por ser parte de uma instituição pública; portanto precisa defender questões que são deste domínio.
Para Iraci França, presidente da ABEn, é preciso refletir sobre a democracia, os direitos e o entendimento de certa autonomia do cidadão. Ela considera o aborto um grave problema de saúde pública e acredita que é preciso desvincular a ideia de enfermagem atrelada à religião, preceito de valor caritativo e filantrópico. De acordo com ela, essa associação foi bastante marcante ao longo da história.
O advogado Rulian Emmerick, mestre em Direito Constitucional, acredita que pode haver um retrocesso na lei, uma vez que, apesar da repugnância da prática do aborto por parte da igreja e do Estado, ela ainda não era tida como crime no Brasil colonial. “Mesmo com todas as condenações morais ao aborto por parte da Igreja Católica durante muito tempo, o abortamento só passou a ser criminalizado no Brasil Império, a partir da vigência do Código Criminal de 1830”, aponta.
Contudo, o dispositivo deixava dúvidas se a condenação valia inclusive para o autoaborto, ou só atingia a terceiros que realizavam o aborto na mulher, independentemente de seu consentimento. Segundo Rulian, o dispositivo só era claro quando o crime era praticado por terceiros. “Somente a partir do século XIX, quando o Brasil passa à categoria de República, é que o autoaborto passará a ter status de crime, conforme tipificado no Código Penal”, conclui.