Teve início na quarta-feira, dia 16 de junho, o evento “Alternativas de esquerda à crise capitalista”, promovido pela revista Versus, do Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas (CCJE) da UFRJ, com o intuito de debater a atual crise econômica mundial sob a visão socialista. Na palestra de abertura, "A esquerda e a crise", os professores Roberto Leher, do Instituto de Economia (IE/UFRJ), e Virgínia Fontes, historiadora da Universidade Federal Fluminense (UFF), defenderam a ideia de que o colapso econômico atual não teve início no ano passado, como afirmam os neoliberais, mas sim na crise da década de 70 que perduraria até os dias de hoje.
“A crise não nasceu em 2008, no entanto há uma construção da imagem da crise que tenta nos convencer de que ela teve origem na irresponsabilidade do setor financeiro”, afirmou Roberto Leher. Segundo os professores, os capitalistas criaram uma falsa imagem da crise que atende às suas necessidades de manter o sistema em funcionamento. Ao dizer que a crise tem origem na movimentação irresponsável de títulos, os economistas desenvolvimentistas estariam mascarando a sua real causa e abrindo espaço para uma saída conservadora: a recuperação da economia real através do aumento da extração de mais-valia.
Para Leher, a crise está sendo apresentada pelas classes dominantes como exclusivamente financeira, quando, na realidade, possui também aspectos econômicos, ambientais e alimentares. Os professores defenderam que, no Brasil, os discursos sobre esses outros aspectos da crise estão dominados pela perspectiva desenvolvimentista, que, mascarando a preocupação com uma condição melhor de vida dos trabalhadores, visa, na verdade, à manutenção do sistema capitalista.
Segundo Virgínia, a esquerda brasileira está mais distante da esquerda anticapitalista e revolucionária e cada vez mais próxima da direita. “Vivemos hoje um processo dramático. Os movimentos de esquerda agem a favor do capitalismo, desgastam, banalizam, corrompem o próprio processo histórico das lutas socialistas.” A professora disse ainda que uma grande parcela da esquerda no Brasil e no mundo se adequou ao capitalismo de tal modo que formula políticas para a manutenção do sistema.
Uma das estratégias utilizadas por essa “falsa esquerda” seria a formulação das chamadas “políticas de gotejamento”, definidas por Virgínia como formas de “impedir que a pobreza se converta em algo muito agressivo”. Tais políticas funcionariam como uma torneira que pinga apenas o necessário para que uma planta não morra. “O argumento usado por quem pratica essa política é de que ela funciona para diminuir a pobreza, mas na realidade ela só impede que a pobreza se torne muito evidente. No Brasil essa política é usada em larga escala. Goteja-se apenas o necessário para as populações que precisam daquela gota. Gota de leite, de escola, universidade, saúde, alimentação.”
Ambos os professores concordaram que, apesar da importância da reflexão sobre a crise, ela não deve ser entendida como uma saída ao capitalismo. “Nenhuma crise é saída para o capitalismo. A gente só sai dele se organizando para querer sair dele”, afirmou Virgínia. Segundo Leher, esta crise não deve ser pensada como origem de uma revolução social, pois não possui as características necessárias para tal. “A crise não é uma parteira da revolução em si mesma, não é um sujeito histórico. Lênin já disse que a crise só tem potencial de transformação social se tem dramaticidade econômica, se os dominantes já não conseguem dominar como antes e, finalmente, se os subalternos atuam como sujeitos e protagonizam a História.”
A solução apresentada pelos professores para o fim da crise capitalista inclui a auto-organização dos trabalhadores em movimentos de luta. Apesar de admitir que a esquerda sindicalista não esteja conseguindo ter voz neste momento de crise, Leher vê a formação política de militantes como a melhor estratégia. Virgínia compartilha esse raciocínio. “Entender a crise hoje é entender que essa massa de capitalistas só vai parar de avançar se a população se colocar contra a exploração. Frente a esta disputa pela imagem da crise, temos que disputar a imagem da crise também”, defendeu Virgínia.