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Os Impasses do Contemporâneo e o Cuidado em Questão

 Aconteceu nessa sexta-feira, dia 7 de março, a conferência inaugural da segunda turma do curso de especialização “Atenção Integral à Saúde Materno-infantil”, realizada no auditório da Maternidade-Escola (ME) da UFRJ. A coordenação do curso, representada por Marcus Renato de Carvalho, pediatra, sanitarista e consultor em amamentação, e Marisa Schargel Maia, psicanalista e pesquisadora na Maternidade-Escola, convidou para a ocasião o professor Carlos Alberto Plastino, psicanalista e professor do Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), que ministrou a palestra Impasses do Contemporâneo e o Cuidado em Questão.

A abertura do evento ficou por conta de Rita Bornia e Joffre Amim Junior, respectivamente diretora e vice-diretor da ME/UFRJ, que deram as boas-vindas aos novos alunos do curso de especialização, destacando a importância do mesmo. “É de grande orgulho para a Maternidade-Escola proporcionar um curso que apresenta uma visão interdisciplinar importantíssima de assistência à mulher e à criança”, afirma a diretora, ao que Joffre Amim completa: “A primeira turma apresentou um resultado bastante satisfatório, contando com a contribuição de profissionais excelentes, que proporcionaram uma boa experiência de troca tanto com o corpo discente quanto com a própria ME”, lembrou o vice-diretor, fazendo votos para a continuidade do sucesso que teve a primeira turma do curso.

Em seguida, a mediadora da conferência Antônia Lúcia Marins, enfermeira e professora de um dos módulos do curso, passou a palavra a Carlos Plastino, que inicia sua fala destacando a importância da atenção à saúde materno-infantil, encaixando essa questão do cuidado no contexto da contemporaneidade. Para o professor, os impasses contemporâneos são bastante contraditórios. “Por um lado, há uma fantástica explosão do progresso científico tecnológico em todas as áreas, incluindo a da saúde, que caracteriza conquistas irrenunciáveis para a sociedade. Ao mesmo tempo, entretanto, temos um profundo sentimento de vulnerabilidade, assustados com os processos políticos, econômicos e sociais, com a disseminação da violência, com a experiência da solidão, cada vez mais séria. Estamos preocupados quando vemos a disseminação de um narcisismo que aparece em uma forma defensiva, onde cada um se esconde em seu quintal, tentando sobreviver”, compara.

Para o especialista, essa forma de sofrimento psíquico contemporânea evidencia o fato de que todos os recursos desenvolvidos pelo homem não são suficientes para permitir uma vida considerada boa.  “Além do mais, o progresso tecnológico e científico não chega a todos, considerando também que uma boa parte da humanidade ainda padece de necessidades materiais básicas. Esses são os impasses do contemporâneo: a dinâmica que movimenta nossa sociedade se sustenta precisamente da manutenção dessas contradições”, afirma Plastino, que propõe: “há a necessidade de uma mudança radical, e o cuidar aparece como uma linha mestra para se pensar essa mudança. Como atitude o cuidar supõe, antes de tudo, uma atitude ética. O reconhecimento do outro como o outro, torna importante a ruptura do modelo narcíseo de vida e organização social, levando à adoção de um olhar para um coletivo que precisa ser constitutivo da vida e do social”.

O professor alega que o homem é mais do que defende a modernidade, para quem o humano é um corpo-máquina com capacidade racional. “Sem dúvida o homem é um ser de razão, o que é uma grande potência. Mas também é intuição, emoção, ação e imaginação”, defende. Ele também afirma que a ciência trabalha com conceitos, o que considera uma pretensão moderna. “O conceito, a explicação das ciências duras, busca esgotar tudo o que se pode saber, atrelar efeito à causa. O ideal seria a compreensão. Pode ser menos satisfatória do ponto de vista da clareza, porém é mais eficiente para o conhecimento de vida”, disse o palestrante.

No que concerne à questão da atenção materno-infantil, o especialista afirma que o homem nasce com determinações e tendências, relacionadas ao ambiente, à função materna do cuidar. “Além das práticas concretas, pode se dizer que o cuidar marca a direção que toma uma civilização, uma cultura, no sentido de que esse gesto supõe tirar o ser humano de seu narcisismo, de sua individualidade que nasce egoísta e isolada, colocando-o numa referência com o outro, com a alteridade. A mãe não assume uma postura narcisista, pois é o amor materno que seduz o bebê para a vida. Deste modo, em pouco tempo a criança adquire a capacidade de entender o que é o outro”, declara o psicanalista, que completa: “A experiência é aquilo que se vivencia na abertura para o outro, para o diferente, o imprevisível, a surpresa e a criatividade, que surge do respeito ao próximo, que é fruto do cuidado. Se queremos sobreviver,é necessário meditar sobre a dualidade antagônica entre o competir e o cuidar”, finaliza Plastino.