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UFRJ e Instituto Ziraldo debatem parceria para  restauração de mural no Canecão

Obra de 33 metros de comprimento será recuperada a partir de parceria entre Universidade e Instituto

A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e o Instituto Ziraldo reuniram-se na sexta-feira, 8/11, para discutir a recuperação do mural realizado pelo artista na antiga casa de shows Canecão. Em posse da UFRJ desde 2010, o espaço está sendo reformulado e, entre as intervenções previstas, está a restauração da obra monumental de 32 metros de comprimento.

“Esta reunião é um momento histórico, pois marca o início de um processo que há muito tempo buscamos concretizar”, afirmou Tarcísio Vidigal, do Instituto Ziraldo, explicando que a recuperação do mural era uma grande preocupação do artista, considerado uma das obras mais importantes de sua carreira. “Ele me perguntava ‘o que será do meu mural?’, e eu respondia ‘calma, com o tempo resolveremos isso'”, relembra Vidigal.

De acordo com a divisão de responsabilidades estabelecida na concessão do Canecão (veja mais informações no final da matéria), cabe à concessionária Bônus-Klefer preservar o mural durante as obras e mantê-lo conservado após a inauguração do novo espaço de eventos. A UFRJ, por sua vez, será responsável pelo restauro da obra, que se encontra bastante danificada devido a intervenções feitas pelo antigo proprietário. Estima-se que apenas cerca de 30% do mural original poderá ser recuperado.

“Esta é uma obra extremamente significativa para nós, e podemos colaborar muito para devolver ao público tanto o mural original, na medida do possível, quanto a reprodução em um espaço aberto e convidativo”, destacou a vice-reitora da UFRJ, Cassia Turci.

UFRJ e Instituto Ziraldo discutem parceria na recuperação de mural | Foto: Fábio Caffé (SGCOM/UFRJ)

Presente e futuro

Atualmente a G+P, empresa responsável por gerenciar a obra, está elaborando um relatório do estado do mural, bem como das ações que serão tomadas para a sua preservação durante as obras de reconstrução do espaço, que devem começar nos próximos meses. A UFRJ será responsável por avaliar as estratégias de proteção propostas, além de fiscalizar a proteção do que resta do mural.

Enquanto isso, a Universidade elaborará e executará o plano de restauro: a definição de como a obra de Ziraldo será recuperada. Há possibilidade de se refazer a parte que foi destruída, ou de elaborar outro tipo de intervenção, como o redesenho dos traços feitos pelo artista, para dar uma ideia de como o mural era, sem necessariamente refazê-lo – uma estratégia recorrente em casos em que partes de murais são destruídas definitivamente.

A ideia é que a família e o Instituto Ziraldo possam contribuir nesse processo de recuperação, inclusive respeitando os desejos do artista, morto em abril de 2024. Há, por exemplo, uma farta documentação do mural, que incluem fotografias e outros registros, que poderão ser utilizados para a elaboração do plano de recuperação e restauro. Para isso, a Universidade e o Instituto devem elaborar um Acordo de Cooperação Técnica.

Serão envolvidos, por parte da Universidade, docentes e especialistas da graduação em  Conservação e Restauração, da Escola de Belas Artes (EBA), que já atuam na recuperação de obras de arte e de construções tombadas, como o Museu Nacional, pertencentes à UFRJ. Assim, o mural do Canecão deve ser incluído no projeto de recuperação do acervo institucional já em curso.

A obra e o Espaço

Produzido ao longo de seis meses em 1967, o mural é considerado um dos trabalhos mais relevantes de Ziraldo. Com 32 metros de comprimento e seis de altura, a obra reinterpreta “A Santa Ceia” ao incorporar elementos emblemáticos da cultura carioca e brasileira, como os arcos da Lapa, malandros e boêmios, além de referências religiosas, como a própria composição da ceia, a Arca de Noé e a serpente do Éden.

Inspirado em murais de Portinari e Picasso, Ziraldo optou por não retratar personagens comendo, criando uma ode ao ato de beber e celebrar. Dada a conjuntura política do Brasil sob a ditadura civil-militar, o mural foi inicialmente visto como transgressor e provocador, recebendo críticas à época de sua inauguração.

O Canecão, inaugurado em 1967, consolidou-se como a principal casa de espetáculos do Rio de Janeiro e do Brasil, sendo palco de turnês de alguns dos mais importantes artistas nacionais desde o final da década de 1960. O espaço foi cenário de gravações de discos emblemáticos da música brasileira, como Canecão Apresenta Maysa (1969), Brasileiro, Profissão Esperança (1974), com Paulo Gracindo e Clara Nunes, Chico e Bethânia ao Vivo no Canecão (1975), Tom/Vinicius/Toquinho/Miucha – Gravado ao Vivo no Canecão (1977), O Tempo Não Pára – Cazuza ao Vivo (1988), e O Grande Encontro (1996), de Alceu Valença, Geraldo Azevedo, Zé Ramalho e Elba Ramalho.

Localizado em um terreno pertencente à UFRJ, o Canecão passou definitivamente para a posse da Universidade em 2010, após disputa judicial que durou mais de quatro décadas. Em 2023, a UFRJ concedeu o espaço à iniciativa privada, com o objetivo de viabilizar sua reabertura e promover uma série de melhorias no campus Praia Vermelha, onde ele está localizado. O contrato prevê, entre as contrapartidas pela concessão, a construção de um restaurante universitário, um centro cultural e um edifício acadêmico. A inauguração está prevista para 2026.

Veja Google Arts sobre o mural de Ziraldo no Canecão.

Instituto Ziraldo e UFRJ devem colaborar na elaboração do projeto de restauro do mural de mais de 30 metros | Foto: Fábio Caffé (SGCOM/UFRJ)