Em seu artigo publicado na revista científica Nature, nesta terça-feira (5/3), a professora Renata Libonati, do departamento de Meteorologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), definiu duas palavras-chave para a mitigação de incêndios florestais e seus riscos para a humanidade: prevenção e regulamentação. Segundo ela, os “megaincêndios”, cada vez mais frequentes ao redor do mundo, continuarão a existir, e o aquecimento global não é o único responsável pelo crescimento destes eventos. “Esses incêndios florestais não são uma calamidade única”, afirmou.
A cientista se refere aos megaincêndios ocorridos no mês passado no Chile, que deixaram centenas de pessoas feridas, mais de 300 desaparecidos e 132 mortos. No artigo, a professora cita outros diversos incêndios florestais que promoveram catástrofes nos EUA (Havaí), Canadá e Grécia, em 2023. Renata Libonati também cita outros, de um passado não tão distante, como a temporada de eventos descontrolados na Austrália entre 2019 e 2020, além dos mais mortais de todos, os incêndios na Califórnia em 2018. “Como cientista de incêndios da Universidade, no Brasil, perdi a conta de quantas vezes me esforcei para analisar as consequências mortais de incêndios cataclísmicos em todo o mundo”, escreveu ela.
Além da má gestão de terras, outro fator destacado por Renata é a proximidade das vegetações inflamáveis com as zonas urbanas. No Chile, por exemplo, a área que abrange essa interação entre esses dois espaços compreende 80% dos lares dos chilenos e 60% dos incêndios florestais. “Pastagens e áreas agrícolas são fontes típicas de ignição. Acidentalmente, por negligência ou incêndio criminoso, os seres humanos foram responsáveis por cerca de 98% das causas conhecidas dos incêndios chilenos entre 1985 e 2018.”
Segundo um relatório de 2022 do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, as mudanças do clima e da cobertura do solo, incluindo o desmatamento, a urbanização, a exploração mineira e a utilização de terras para agricultura e pastagens, aumentaram a probabilidade de incêndios florestais extremos nas últimas décadas.
No entanto, para Renata, é preciso que os países façam algo além de combater as causas das alterações climáticas: é necessário implementar políticas de gestão de terra e fogo eficazes e urgentes. Além disso, ações voltadas para a conservação de espécies nativas e para a educação populacional sobre os riscos desses eventos também são essenciais. É fundamental a ruptura do que ela chama de “ciclo de feedback positivo” dos incêndios, no qual as políticas de supressão dos eventos de fogo levam à formação de um solo mais seco e suscetível a incêndios mais intensos. “Quebrar este ciclo exige uma interação ciência-política eficaz e contínua.”
O comportamento e o engajamento da sociedade também são essenciais nesse processo. Segundo Renata, os governos locais, organizações não governamentais e empresas podem promover o envolvimento da comunidade na prevenção de incêndios através de campanhas educativas, e a mídia pode divulgar informações para aumentar a sensibilização das pessoas sobre as consequências de práticas irresponsáveis. “Os megaincêndios são uma crise humanitária (…) As nações precisam de uma abordagem holística à governança do fogo, ajustando a prevenção, a regulação e o planejamento, conforme cada contexto local e ecológico”, finaliza a professora.
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