Categorias
Meio Ambiente

Expedição Darwin200 na UFRJ

Na passagem pelo Rio de Janeiro, embarcação que refaz a trajetória do cientista Charles Darwin conhece projetos de conservação ambiental

Depois de passar por Fernando de Noronha e Salvador, a escuna Oosterschelde está fundeada no Rio de Janeiro para conhecer os projetos científicos voltados para a preservação ambiental. A embarcação refaz a trajetória do cientista Charles Darwin ao redor do planeta, que há 200 anos percorreu quatro continentes coletando espécies da fauna e flora que serviram de inspiração para o livro revolucionário Origem das Espécies. Batizada de Darwin200, a expedição esteve na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), na primeira quinzena de novembro, para conhecer os trabalhos desenvolvidos pelos laboratórios de Ecologia e Conservação Marinha (Ecomar) e de Ecologia e Conservação de Populações (LECP), ambos do Instituto de Biologia (IB).

Em cada uma das 32 paradas, um pequeno grupo de jovens pesquisadores, chamados carinhosamente de “líderes Darwin”, junta-se ao time embarcado para desenvolver um projeto científico envolvendo espécies descritas no diário do jovem Darwin ou um trabalho que busca a conservação da fauna e flora do planeta. A ideia é que esses líderes desenvolvam competências e habilidades, trazendo a experiência para as próprias carreiras para mudar o futuro do mundo. Os líderes ficam hospedados no Oosterschelde pelo tempo de estada em cada local. O barco Darwin200 estará atracado nas redondezas do Museu do Amanhã até o dia 15 de novembro.

O coordenador do Ecomar, professor Rodrigo Tardin, explicou que os cinco jovens que ingressaram na aventura a partir do litoral fluminense conheceram o projeto Botos da Costa Verde, realizado nas baías de Sepetiba e Ilha Grande. “Na região, o laboratório faz pesquisas para investigar o impacto das atividades humanas, o comportamento e vocalizações dos botos-cinza (Sotalia guianensis) que vivem naquele habitat”, disse o estudante Tomaz Cezimbra, aluno de doutorado do programa de pós-graduação em Ecologia (PPGE/IB), aos visitantes, enquanto dava suporte ao laboratório na recepção.

Segundo Tardin, o projeto Botos da Costa Verde usa modelos ecológicos para avaliar o impacto e permitir uma capacidade preditiva da interação da espécie com os seres humanos, além de também serem realizadas estimativas de fidelidade e abundância populacional dos botos. “Por uma questão logística, nos concentramos mais na Baía de Sepetiba, onde os líderes Darwin entrevistaram os responsáveis pela conservação do ambiente marinho e o líder dos pescadores. Além de realizar avistamentos do boto-cinza, uma espécie que está sofrendo muito com o que acontece no continente”, afirmou.

Para a estudante francesa Juliet Derozario, os relatos dos entrevistados mostraram como o poder econômico está influenciando tanto a pesca artesanal, que sustenta a população caiçara local, quanto a dinâmica que ameaça a preservação de espécies da região. “Entrevistamos o chefe da área protegida para o boto-cinza e uma liderança de pesca. O gestor falou dos desafios de proteger a baía, que teve um crescimento grande nos últimos 20 anos, com portos e indústrias, que restringem em parte o poder de quem quer proteger a região. Já o líder de pesca nos contou que a baía está sofrendo um loteamento das águas, perdendo o direito dos pescadores de ir e vir com cada novo empreendimento que surge e cria nova área de exclusão de pesca. Está cada vez mais difícil pescar e, daqui a pouco, pescador só vai existir nos museus. O conhecimento deles do ambiente será perdido também”, contou Derozario.

Bugios na Floresta da Tijuca

A participação do Laboratório de Ecologia e Conservação de Populações (LECP) contou com o apoio do pesquisador Marcelo Lopes Rheingantz na visita à Floresta da Tijuca. Ele fez a apresentação do projeto Refauna para os jovens conservacionistas e para a tataraneta de Charles Darwin, a botânica Sarah Darwin. Ela também vai realizar palestras no Museu do Amanhã, abordando a relevância contínua do trabalho do pai da biologia moderna. A apresentação da expedição Darwin200, conduzida por Stewart McPherson, e a exposição de projetos inovadores criados por jovens líderes brasileiros também fazem parte da programação no espaço cultural.

De acordo com Rheingantz, um vídeo com o histórico do surgimento da Floresta da Tijuca e de como ocorreu a defaunação está sendo produzido, contando a participação do Refauna na reintrodução de espécies. É importante lembrar que a expedição transforma a embarcação na “sala de aula mais emocionante do mundo”, com a divulgação das descobertas e dos esforços de conservação durante toda a viagem através das mídias sociais.

Marcelo Rheingantz também contou que nos próximos dias deverá haver uma reintrodução do macaco bugio (Alouatta guariba), algo que não acontece desde 2017, por conta de um surto de febre amarela e da pandemia da covid. “É preciso resolver uma pendência antes da liberação dos animais. Precisamos de monitoramento por telemetria e o rádio estava machucando as fêmeas. Vamos fazer um colete para a colocação no macho para acompanhar os bichos que serão liberados. Atualmente, há oito bugios ao todo na floresta, filhotes do casal Kala e Juvenal, que foram os primeiros a serem libertos. Todo o grupo segue unido”, explicou o pesquisador.

A Expedição Darwin200

A equipe da expedição Darwin200 se preparou ao longo de uma década para seguir a trajetória do jovem Charles Darwin no HMS Beagle pelos mares. Duas viagens de testes foram realizadas no litoral do Reino Unido até a partida do porto de Plymouth, no dia 14 de agosto, para a jornada até julho de 2025. Foi de lá que partiu o Beagle também. Eles navegam na escuna de três mastros Oosterschelde, que, por questões logísticas, navegará apenas uma vez pelo litoral da América do Sul, diferente do Beagle, que ia e voltava ao longo do norte e do sul da costa leste.

Na rota, estão previstas paradas em alguns locais que Darwin não visitou. As paragens adicionais permitem reparações e manutenções essenciais, reabastecimento e eventos publicitários planejados. Elas também melhoram a viagem global e permitem que a navegação seja feita em períodos de clima ideal. Está previsto o regresso da Austrália através do Cabo Horne para permitir visitas à Geórgia do Sul e a Tristão da Cunha. Com exceção de Cocos (Keeling) e Maurício, todos os principais locais visitados por Charles Darwin durante sua viagem a bordo do HMS Beagle serão visitados.

A estudante brasileira Larissa Vidal Melo, que faz graduação em Biologia na UFRJ, participou de uma das paradas, quando a embarcação esteve em Cabo Verde, na África, em setembro. Ela atuou em um projeto que envolve tubarões e raias, da ONG Biosfera. “Lá participei da instalação de um equipamento denominado BRUV (Baited Remote Underwater Video), que faz filmagens subaquáticas. Assim, identificamos os comportamentos das espécies que vivem ou passam pela região. Duas espécies estavam ameaçadas de extinção e não são vistas no litoral brasileiro. Além disso, conseguimos conhecer o presidente de Cabo Verde, José Maria Neves, em uma rápida e excepcional velejada para buscá-lo nas ilhas do arquipélago a fim de que conhecesse melhor a expedição”, relatou.

Quem quiser conhecer mais sobre o projeto, não deixe de visitar o Museu do Amanhã no dia 11/11, a partir das 18h, quando a instituição receberá a expedição Darwin200. A programação incluirá palestras de Sarah Darwin, uma apresentação da expedição conduzida por Stewart McPherson, e a exposição de projetos inovadores criados por jovens líderes brasileiros. Além disso, terá a participação em vídeo da renomada pesquisadora Jane Goodall e discursos de Sérgio Besserman e Fabio Scarano, professor do Laboratório de Limnologia da UFRJ, que, por meio de uma parceria entre a Universidade e o Museu do Amanhã, participa da Cátedra Unesco de Alfabetização em Futuros, a primeira concedida pela Unesco sobre o tema no Brasil.