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Meu Olhar: arte e toque

Nosso olhar sobre a exposição Corpocosmo, que apresenta obras visuais inéditas de alunos da EBA

Eu nunca havia ido naquele espaço. O Centro Municipal de Artes Hélio Oiticica fica bem perto da Praça Tiradentes, no Centro do Rio de Janeiro, um lugar por onde passo com frequência e, ainda assim, não havia ouvido falar dele. Bom, antes tarde do que nunca, já que estava indo para encontrar os alunos da Escola de Belas Artes que haviam recém-inaugurado ali uma exposição de obras visuais e instalações. 

Eles entraram em contato com a SGCOM apenas para que fossem feitas algumas fotos, mas o meu instinto jornalístico me disse que poderíamos aproveitar mais daquilo. Agendei com a Ellen, a extensionista responsável por coordenar a produção da exposição, e ela reuniu, em um mesmo dia, a maioria dos artistas criadores possíveis, bem como os bolsistas do projeto e a curadora e professora Mari Fraga. Para mim, a exposição Corpocosmo falou sobre o toque. E, para falar sobre isso, eu precisaria usar o Meu Olhar. 

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O último andar do centro cultural que homenageia um dos artistas brasileiros mais respeitados do mundo, Hélio Oiticica, estava repleto de esculturas, fotografias e obras interativas. No entanto, para chegar até ele, era necessário atravessar uma instalação que mesclava experiências sonoras e corporais, a partir de uma estética que propunha uma união entre o mundo virtual e real. Apenas um prelúdio do que viria a seguir, pois já começávamos a adentrar a exposição Corpocosmo, composta, exclusivamente, por obras de estudantes da Escola de Belas Artes da UFRJ. 

Tudo começou a partir da UFRJ na Cultura, uma parceria entre a Universidade e a Prefeitura do Rio, que possibilitaria a ocupação de espaços culturais do município a partir de fazedores de arte da instituição. Sabendo disso, em 2022, a idealizadora do projeto de extensão “Cosmo-poiesis”, a professora Mari Fraga, propôs o que seria uma série de encontros dos estudantes selecionados com grandes nomes das artes visuais.

As rodas de conversa, que foram realizadas no Centro Cultural Hélio Oiticica, se desdobraram em um período de concepção dos projetos e sua produção, na EBA. Após todo o processo, as criações seriam expostas no espaço. E foi assim que nasceu a Corpocosmo, inaugurada em 3/6.

Voltando, então, à instalação inicial, vivemos a experiência chamada pelo artista ANTi de “ciberespaço material”, nessa obra intitulada como “MetaHall”. Por aqui, a materialidade era sentida na vontade de experimentar as máscaras, tocar as correntes e pisar nas latinhas de bebidas que imprimiam sonoridade à instalação. Tudo ali era pensado a partir da mente do estudante de Pintura da EBA, que utilizava materiais ligados à sua trajetória, como tecidos cedidos pela irmã, que faz peças de crochê, por exemplo.

“Aqui eu quis trazer sobre o atravessamento da pessoa no mundo e do mundo na pessoa. A dialética de corpos e mundos, porque, pra mim, é como vamos construindo as nossas culturas. Máscaras, emojis e roupas são pra mostrar como a cultura atravessa os corpos”, explica o artista do interior do Rio.

Subindo as escadas, vários outros mundos também estavam ali dispostos. E a maioria deles poderia ser sentida pelo toque. A experiência de vivenciar a arte de forma interativa não é nova, mas fez um sentido a mais quando a proposta é pensar o corpo. A interpretação é livre e permite várias possibilidades, como é o caso da obra “De dentro para fora”, da estudante de Artes Visuais – Escultura Anna Frieiro. O que para uns pode representar vísceras expostas em um açougue, para outros pode funcionar como um coração cheio de bifurcações e capilaridades, no qual é possível tocar e sentir.

Da mesma forma, na instalação “Nude”, a artista Ellen Mucci traz as diferentes possibilidades que um corpo feminino pode oferecer: os sons que emanam de cada escultura podem ser tanto gritos de socorro quanto de manifestação para que esses corpos sejam vistos como reais. “Eu cresci em uma família formada apenas por mulheres e aprendi com elas a realizar tudo. Uma das obras é em homenagem a uma das minhas familiares, que teve câncer de mama. Isso não a fez ser menos mulher”, defende a estudante, que também foi responsável por coordenar a produção da exposição.

Seria impossível falarmos de todas as esculturas, pinturas, fotografias ou instalações que encontramos ao visitar a Corpocosmo, embora tenhamos passado por cada uma delas e conversado com os artistas presentes, que se mostraram muito felizes com a nossa presença e interesse em compartilhar o trabalho. Cada obra, um mundo. Como a possibilidade de voltar a ser criança com o “Telefone Sem Fio”, da Alícia Nolyq, ou de dar uma pausa no tempo com o que Philippe Honorato traz em “Relógio (som/ambiente nº 1)”.  

Para Mari Fraga, a oportunidade é especial para os alunos, pois dá a eles a chance de expor em um espaço reconhecido no Centro da cidade, por onde circulam outros nomes importantes. “Foi possível que eles acompanhassem todas as etapas: formação, produção e montagem. O que faz com que possam se enxergar não como artistas “puros”, mas artistas que se deslocam em diversas funções, o que faz com que eles cresçam com esses diferentes conhecimentos também”, conclui a curadora.

Pessoas sentadas em roda no chão.
Mari Fraga (de amarelo) conversa com os alunos/artistas. | Foto: Raphael Pizzino (SGCOM/UFRJ)

A exposição está aberta à visitação até o dia 15/7, no qual será realizado seu encerramento acompanhado do lançamento do livro Cartas de Hélio, às 15h, e da transmissão do documentário Hélio Oiticica, produzido por César Oiticica, sobrinho-neto do artista.