Categorias
Cultura Sociedade

Acima de tudo, o amor pelo carnaval

A maior festa popular do país segue caracterizada pela resistência, tanto econômica quanto política

Fantasias, purpurina, alegria e celebração. O amor ao carnaval e às suas inúmeras formas de realização é uma das marcas da cidade do Rio de Janeiro, que tem o maior carnaval do mundo, de acordo com o Guinness Book. Além do já conhecido espetáculo promovido pelas escolas de samba, nos últimos anos as festas de rua também cresceram, ultrapassando o número de 600 blocos desfilando pela cidade – 500 deles oficialmente registrados na Empresa de Turismo do Município do Rio de Janeiro (Riotur). Os números são do levantamento Carnaval de Dados, divulgado em fevereiro de 2022 pela Prefeitura do Rio e a Fundação João Goulart. 

Em 2022, após um ano parado em virtude da pandemia do coronavírus, o carnaval na cidade aconteceu oficialmente em abril, ocasião na qual haviam sido liberados pela Prefeitura apenas os desfiles no Sambódromo. Apesar dos números de casos da doença ainda altos, tanto em fevereiro quanto em abril as ruas se encheram de foliões que celebraram a festa em menor proporção. Neste ano, o carnaval de rua do Rio de Janeiro pode voltar a acontecer oficialmente e com toda força – com números cada vez mais expressivos, mas com dificuldades em angariar subsídios públicos que acompanhem esse crescimento. 

Ainda que o carnaval tenha previsão de movimentar cerca de R$ 4,5 bilhões em 2023 segundo a Riotur, alguns blocos não vão desfilar por falta de verba, enquanto outros vão encontrando maneiras próprias de fazer a festa continuar. É o caso do Cordão do Boitatá, tradicional agremiação que completa 27 anos de existência. No domingo de carnaval, os foliões celebram em frente ao palco montado na Praça XV. Já o cortejo sai pelas ruas do Centro do Rio uma semana antes, no domingo que precede a festa. 

Em 2023, sem auxílio financeiro, o Boitatá está fazendo uma arrecadação coletiva para  custear a estrutura de som, palco e gerador, além da rede de 137 técnicos, músicos e equipe que realiza a festa. Em sua rede social, o bloco lançou inclusive um concurso de jingles para ajudar na divulgação da “vaquinha”, que, até o momento da publicação desta reportagem, havia alcançado 18%. 

Foliões seguram estandartes do Cordão do Boitatá pelas ruas do Centro do Rio
Cortejo do Cordão do Boitatá. | Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

Se uma agremiação com quase três décadas de existência tem passado por esse tipo de dificuldade, a situação se repete com grupos mais novos. O bloco Timoneiros da Viola, criado em 2012 para homenagear o sambista Paulinho da Viola, decidiu não desfilar pelas ruas de Oswaldo Cruz e Madureira em 2023, em virtude da falta de verba recebida. Da mesma forma, o Afoxé Maxabomba não recebe orçamento para desfilar desde 2015, ano que marcou sua última participação no carnaval. 

Para Helenise Guimarães, professora da Escola de Belas Artes, essa é uma questão complexa de analisar, pois a expansão de blocos e bandas tem sido constante, mas o direcionamento de verbas não acompanha esse crescimento. “Blocos tradicionais têm públicos fixos e contam com o apelo afetivo de suas histórias. São apelos que funcionam, mas que não substituem as necessárias verbas e apoios dados pela gestão pública e que, de um modo geral, são sempre escassos para todas as modalidades”, defende.

Carnaval e Economia 

Segundo a pesquisadora de carnaval e festas populares, a tendência é que os blocos sigam o crescimento vertiginoso dos últimos anos. A variedade das manifestações acaba sendo o diferencial para a expansão, bem como a fácil adaptação a diferentes sonoridades e espaços e o baixo custo para participar. Apesar de, em uma visão geral, os holofotes estarem voltados aos desfiles das escolas de samba, dados da Riotur em parceria com a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Inovação e Simplificação (SMDEIS) e a Fundação João Goulart (FJG) mostram que neste ano o carnaval de rua movimentará 20% a mais do que em 2020, o equivalente a R$ 1,2 bilhão.

No que se refere à geração de empregos em todos os segmentos, o carnaval movimenta a captação de recursos e mobiliza artistas, artesãos, profissionais de manutenção de diversos produtos e produção artística. Na economia, o estudo Carnaval de Dados de 2022 apontava a grande movimentação do período: mais de 20 mil trabalhadores se concentram nos serviços oferecidos para quem quer curtir a folia, principalmente no setor de alimentação e produção de eventos. As empresas de comunicação, sobretudo de mídias jornalísticas, também ganham destaque nessa relação. Os servidores da Prefeitura do Rio também trabalham de maneira mais direcionada. Nesse caso, a Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb) fornece maior número de funcionários: quase 8 mil durante todo o período.

Ou seja, o carnaval produz uma economia eclética e vital para o desenvolvimento de uma indústria que envolve materiais, técnicas, distribuição de produtos, capacitação de profissionais e otimização de soluções, bem como a formação cada vez mais qualificada de gestores especializados. É o que defende Helenise, reforçando que resistência é uma palavra que define o nosso carnaval. 

“O Rio de Janeiro, com sua multiplicidade de festas foliãs, ainda é o celeiro da cultura carnavalesca, e seus carnavais promovem uma economia de grande porte, pois a geração de renda e empregos não se limita ao período do carnaval, mas se estende por todo o ano. Que o clima seja ameno e as chuvas sejam só de confetes e serpentinas, ecoando pelas ruas e avenidas os ritmos pulsantes de baterias e batuques, as risadas e requebros, a dança desenfreada e doida de seus blocos e o grito secular de “é campeã” para aquela escola que arrebatar nosso coração folião”, concluiu.