Categorias
Cultura Institucional

Museu Nacional realiza balanço de peças recuperadas após o incêndio

Evento virtual apresentou livro retratando os desafios enfrentados pela equipe de Resgate e de esqueleto parcial de um dinossauro encontrado

O Museu Nacional (MN) da UFRJ apresentou hoje, 6/4, em uma coletiva de imprensa virtual, um balanço do trabalho de recuperação de objetos encontrados nos escombros da sede consumida pelas chamas em setembro de 2018. As vértebras praticamente intactas de um dinossauro que havia sido encontrado no Mato Grosso, mas não estavam expostas ao público, e o lançamento da publicação 500 Dias de Resgate: Memória, Coragem e Imagem, foram os destaques do evento virtual, que reuniu representantes da UFRJ, do governo alemão e de instituições germânicas.

Entre setembro de 2018 e março de 2020, uma equipe de poucos profissionais conseguiu resgatar cerca de 5.000 lotes, reunindo objetos de grande importância que integravam 14 das 25 coleções que se encontravam no palácio. De acordo com Luciana Carvalho, vice-coordenadora da equipe de Resgate de Acervos do MN, entrar em um ambiente que havia sido devastado pelas chamas e onde ocorrera o desmoronamento de três andares para encontrar as peças foi um desafio. “A certeza de que havia objetos que poderiam ser recuperados nos motivava. Nos primeiros dias, havia limitações de equipamentos simples como luvas e botas e não pudemos contar com a ajuda de ninguém além dos profissionais do próprio Museu, devido aos riscos envolvidos naquele ambiente, apesar do interesse de voluntários”, relatou ela.

Carlos Frederico Rocha, vice-reitor da UFRJ, agradeceu “a toda a comunidade acadêmica do Museu Nacional pelo incansável trabalho de resgate nos escombros pós-incêndio. É, realmente, uma equipe sensacional, muito resiliente, que conseguiu fazer um resgate com todas as características técnicas fundamentais de excelência. Agradeço enormemente a toda essa equipe e desejo muita força neste período de reconstrução e de reorganização do acervo. Agradeço enormemente também ao governo alemão, que tem nos ajudado muito, não apenas sob o ponto de vista financeiro, de apoio, mas também com a possibilidade de recomposição do nosso acervo”.

De acordo com Alexander Kellner, diretor do MN, a contribuição alemã foi uma das primeiras a chegar após a tragédia. “Eles nos passaram informações que foram vitais para a realização desse trabalho de resgate e nos apoiaram sempre. Além disso, servidores dos mais diferentes setores do Museu não mediram esforços para recuperar as peças que se encontravam sob os escombros. Com a ajuda de diversos parceiros, como a Unesco e o governo da Alemanha, foram criadas as condições para que a equipe de Resgate conseguisse desenvolver esse importante trabalho”, disse Kellner.

A ajuda do Goethe-Institut e da Fundação Gerda Henkel, segundo o diretor do Museu, foram essenciais também para produzir a publicação “que leva um pouco da informação e emoção desse trabalho para o público”. Editado por Cláudia Rodrigues-Carvalho, Luciana Carvalho, Gabriel Cardoso e Silvia Reis, o livro 500 Dias de Resgate: Memória, Coragem e Imagem, narra as atividades da equipe no período, com imagens e depoimentos dos pesquisadores envolvidos.

Robin Mallick, diretor do Goethe-Institut, destacou a parceria entre as instituições. “Desde o trágico incêndio no Museu Nacional, o Ministério das Relações Externas da Alemanha e o Goethe-Institut estão envolvidos no trabalho de resgate e no processo de desenvolvimento de um conceito para um novo museu. Parte deste compromisso é também enfatizar a importância social dos museus como um todo. Muitos parceiros de museus da América do Sul estão enfrentando enormes desafios em vista da situação econômica e política volátil no continente e os efeitos da pandemia. Eles devem ser apoiados por uma cooperação mais estreita entre as instituições culturais e a sociedade civil, bem como pelo intercâmbio internacional. Este livro é também fruto da cooperação internacional.”

Dirk Augustin, representante do Ministério das Relações Externas da Alemanha, ressaltou que “o Ministério das Relações Externas da Alemanha fez questão de apoiar o Museu e a equipe de Resgate desde o primeiro dia após o desastre, porque em momentos tão dolorosos solidariedade é fundamental. Fornecemos os meios para que os técnicos pudessem começar: luvas, caixas para os achados, escovas, martelos; em seguida, providenciamos a renovação do sistema elétrico, microscópios etc. Os resultados do trabalho são apresentados no livro. O incêndio foi terrível, mas marcou o início de uma cooperação internacional profunda”, destacou.

O “titanossauro fênix”

Os integrantes da equipe de Resgate, embora não tivessem esperanças de encontrar o esqueleto do dinossauro em boas condições, localizaram dois blocos com vértebras articuladas e outros ossos associados que estavam soterrados por toneladas de escombros provenientes dos andares superiores que desabaram com o incêndio. O fóssil com aproximadamente 80 milhões de anos, pertencente ao período Cretáceo, provavelmente um titanossaurídeo, havia sido originalmente resgatado em uma das expedições realizadas pelos integrantes do setor de Paleovertebrados do MN, entre 2003 e 2006, próximo ao Córrego Confusão no município de Tesouro, no Mato Grosso. Segundo os pesquisadores, os ossos ficaram protegidos do contato direto com o fogo pelos destroços. Além disso, os especialistas concluíram que a substituição mineral pela qual os ossos passaram durante o processo de fossilização possa ter sido um fator importante para a resistência ao soterramento.

A equipe de Resgate, composta por 76 técnicos, professores, estudantes e profissionais terceirizados, passou a trabalhar em prol da recuperação do maior número possível de peças do acervo do Museu tão logo o acesso às ruínas havia sido liberado. Em uma área total de 21.000m², sendo 11.417m² de área construída, o Paço de São Cristóvão abrigava aproximadamente 5.000 itens nas salas de exposição e 3.500.000 itens no acervo da seção de Memória e Arquivo.

Dentre as peças resgatadas, destacam-se o crânio de Luzia, esqueleto mais antigo descoberto no Brasil; o escaravelho coração e outros oito amuletos que estava no interior do sarcófago da múmia Sha-Amun-em-Su, consumida pelas chamas; os afrescos de Pompeia, que já haviam sobrevivido à erupção do vulcão Vesúvio; parte da Coleção Werner, a mais antiga do MN; o Psaronius brasiliensis, primeiro fóssil de vegetal registrado para o Brasil; além de pterossauros da Coleção de Paleovertebrados e meteoritos, como o Bendegó e o Santa Luzia.

Após serem resgatadas, as peças passaram por uma triagem, na qual foram fichadas, fotografadas, identificadas e limpas. A fase seguinte, a da estabilização, garantiu que os danos e alterações nas peças não se agravassem. Por fim, todo o material foi acondicionado em embalagens personalizadas para evitar novos danos.

A publicação apresenta as diferentes etapas do trabalho realizado, algumas peças icônicas recuperadas e a impressão que o incêndio deixou na equipe de Resgate. Para Luciana Carvalho, a publicação não tem o intuito de esgotar o assunto. ”Ela também não encerra esta atividade, porque ainda precisamos terminar três salas dentro do palácio e proceder ao inventário das peças resgatadas. Portanto, é uma maneira de dar uma satisfação à sociedade que vem acompanhando todo o desenrolar dos fatos e deixar registrado, na forma de livro, um pouco dessa história”, destaca a vice-coordenadora da equipe de Resgate. A obra está disponível para download no site do MN (link para download: http://museunacional.ufrj.br/destaques/docs/500_dias_resgate/livreto_500_dias_de_resgate.pdf).