Categorias
Memória

Especialistas debatem comunicação na América Latina

“Venho aqui falar de esperança.” Foi com essa frase que Dênis de Moraes, doutor em Comunicação e Cultura e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), abriu seu discurso sobre o tema “Concentração das Indústrias Culturais na América Latina”, nesta quinta (15/04), no auditório Manuel Maurício de Albuquerque, do Centro de Filosofias e Ciências Humanas (CFCH). O evento, organizado pelo Grupo de Pesquisa em Políticas e Economia Política da Informação e da Comunicação (Peic), da UFRJ, reuniu ainda Guillermo Mastrini, pesquisador da Universidade de Buenos Aires, João Brant, membro do Grupo Intervozes, e Marcos Dantas, professor da Escola de Comunicação (ECO) da UFRJ, que atuou como mediador.

O monopólios das comunicações na América Latina foram o tema central do debate. Para Moraes, “são raros os países latino-americanos que não têm dinastias familiares no poder de seus meios de comunicação, cultura e entretenimento”. Segundo o docente, porém, alguns governos recentemente têm realizado ações de democratização da liberdade de expressão, o que representa uma esperança para a inclusão dos grupos sem voz. Para se ter uma idéia, de acordo com números apresentados por Mastrini, 80% da audiência na região é dominada por apenas quatro empresas do setor. “Se em qualquer indústria quatro empresas controlam 50% do mercado, já se configura um caso de concentração muito alto”, salientou o pesquisador argentino.

Veículos de comunicação cujo acesso é gratuito, o rádio e a televisão alcançam, por exemplo, pelo menos 90% da população desses países. Todos os outros serviços pagos, como as TVs a cabo, os livros e os cinemas, ainda de acordo com a opinião do pesquisador da Universidade de Buenos Aires, têm pouquíssimo espaço entre os consumidores.  “O setor da telefonia móvel só cresceu e tornou possível que a maioria das pessoas comprasse seu celular através dos planos pré-pagos”, lembrou Mastrini, ao mencionar sua preocupação com a exclusão cultural de grupos sociais menos favorecidos economicamente.

A fala de Dênis de Moraes, entretanto, “trouxe acalento”, segundo suas próprias palavras, “para esta situação”. De acordo com o professor da UFF, “após verificar como os atuais governos latino-americanos atuaram e ainda atuam, porque alguns foram reeleitos, no enfrentamento aos conglomerados das comunicações, descobri que nem tudo estava perdido”, afirmou, fazendo referência a algumas iniciativas. Entre elas, Moraes citou a criação de cadeias de rádio comunitárias indígenas na Bolívia; a lei audiovisual venezuelana que garante reserva para os filmes nacionais; as redes culturais comunitárias que, através de um circuito itinerante, levam outras formas de expressão a equatorianos e bolivianos; a nova lei de comunicação da Argentina, que envolveu em um amplo debate todos os setores da sociedade; além da lei de radiodifusão comunitária do Uruguai, considerada a melhor do mundo.

Já João Brant criticou o debate – ou a falta dele – sobre o monopólio dos meios de comunicação no Brasil, na opinião dele, muito conservador. “Quando tentamos estabelecer uma discussão, somos tachados de radicais perigosos da esquerda censora, como se fôssemos as verdadeiras ameaças à liberdade de expressão”, pontuou. O Estado deveria exercer as funções de provedor e regulamentador das formas culturais democráticas, na visão de Brant, mas, ao invés disso, “o que se observa é o fechamento de rádios comunitárias, a violência a jornalistas e o domínio de 95% do espectro brasileiro por parte do sistema comercial”.

Ponto comum entre a fala dos três debatedores, o engajamento da sociedade civil é fundamental através da exigência de políticas públicas das autoridades que visem à construção de uma comunicação aonde todos tenham voz. “Essa é uma luta de ocupações de espaço”, resumiu Moraes, ao afirmar que os governos dos países que vislumbram um espaço democrático enfrentam violentas agressões dos veículos que majoritariamente dominam a mídia. “O Brasil vive um momento em que se faz necessário um debate para mudar esse conceito ‘chinfrim’ de liberdade de expressão em que meia dúzia de famílias toma conta dos meios de comunicação”, concluiu Brant.