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Nova ética no RJ: para além do túnel

 A ética é um produto de seu tempo. Ao Brasil foram impostos os valores europeus. “A nossa marca de origem é uma deformação.” Com esses pensamentos, o filósofo e professor da UFRJ Marildo Menegat abriu a segunda mesa-redonda do seminário “Rio: que cidade é essa? – A ética na contemporaneidade” dessa sexta (16/10). Em seu segundo ano, o projeto reuniu ainda o ator e músico Alexandre Akerman, a médica e diretora da ONG Criola, Jurema Werneck, e o antropólogo Júlio Tavares, sob a mediação do psicanalista Benilton Bezerra no Fórum de Ciência e Cultura (FCC).

Não há como pensar os valores de uma sociedade sem olhar primeiramente para seu contexto. O Brasil nasceu para ser extensão da Europa, que vivia sob a ética do trabalho, construída pela sociedade burguesa. Desse modo, explicou Menegat, nunca tivemos uma moral própria e tentamos explicar o nosso atraso buscando culpados.

Jurema Werneck mostrou como essa necessidade de achar culpados se reflete até hoje na vida dos negros no Rio de Janeiro. Com base em gráficos, provou que o IDH dos brancos é superior e que o número de mortes por tuberculose é maior entre os negros. Além disso, a violência contra as mulheres negras ocorre com mais incidência do que contra as brancas. “Essa cidade não é tão maravilhosa para nós”, concluiu.

Alexandre Akerman dá aula de música para os presos em Bangu e confirmou que a grande maioria de seus alunos é de negros. Emocionado, contou que eles são muito interessados e disciplinados, e destacou a importância da educação para garantir igualdade social. Akerman atacou a mídia e sua influência dentro dos lares mais pobres, chamando-a de vaidosa, glamouriosa e desgraçada. Muito aplaudido, terminou seu discurso com a frase: “Ou a liberdade é assunto de todos ou não é de ninguém”.  

Todos concordaram que é preciso reformular a sociedade para incluir toda a sua diversidade. Menegat propôs que os princípios éticos devem se basear numa estrutura mais abrangente, e não no trabalho. Júlio Tavares afirmou que uma pedagogia cívica seria a solução, pregando o respeito, atitude que “tira a ética do plano abstrato”. O antropólogo concluiu que o desafio para a próxima década será a reconstrução do Rio de Janeiro:  “Devemos olhar para além do túnel”.