Teve início ontem, dia 10, o III Seminário do Núcleo Interdisciplinar de Estudos Migratórios (NIEM), que se estende até o dia 12, das 9h às 17h, no Salão Moniz de Aragão do Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ, no campus da Praia Vermelha. O evento, discutindo o tema das migrações no Brasil e no mundo, recebeu ontem Luís Edmundo de Souza Moraes, professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ); Giralda Seyferth, pesquisadora do Departamento de Antropologia do Museu Nacional da UFRJ; Joana Bahia, antropóloga da Faculdade de Formação de Professores da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e Fania Fridman, professora do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (IPPUR) da UFRJ. Eles participaram da mesa “Os estudos históricos sobre a imigração no Brasil: perspectivas atuais”.
Na comunicação “Política e espaços políticos em comunidades de imigrantes: considerações sobre o espaço público de língua alemã em Blumenau”, Luís Edmundo de Souza Moraes desconstruiu o perfil, difundido entre pesquisadores da área, do colono alemão como politicamente apático. “A pesquisa do colono alemão no Brasil já forneceu material suficiente para colocar em questão essa imagem do colono e seus descendentes. O que está por trás desta avaliação é uma falta de material empírico e uma concepção específica de política”, afirmou.
Segundo Luís Edmundo, por trás desta avaliação está o pressuposto de que falar de política implica o reconhecimento de uma esfera destinada especificamente para a política, quando na verdade a política pode se dar em qualquer espaço. “A avaliação do alemão como politicamente desinteressado está no fato de que eles não transitam pelas instituições políticas formais do país, como o parlamento e o executivo, de maneira proporcional a sua importância econômica e política”.
O pesquisador defende a idéia de que estes colonos participavam sim da política, mas da chamada “política de grupo”, ou seja, uma disputa em torno da possibilidade de impor representações sobre um grupo e, a partir dessas representações, criar o contorno do próprio mundo. Como exemplo dessas políticas, Luís Edmundo citou as colônias de imigrantes, seus clubes e associações, nos quais foram construídas as identidades dos chamados “alemães do Brasil” no final do século XIX e início do XX.
Luís Edmundo contou que a colônia de Blumenau, assim como as outras comunidades, era um conjunto de diferentes grupos culturais germânicos com diferentes línguas e costumes, não havendo uma unidade. Segundo ele, os próprios colonos não se intitulavam alemães. Luís Edmundo afirma que a identidade destes colonos se dava nos seus espaços de socialização: “A história da construção da colônia alemã no Brasil é marcada pelo paralelismo entre o processo de construção do grupo e o das instituições coloniais desse grupo”.
O processo de conciliação de diferenças dentro destes grupos começou a mudar com a constituição do Estado Alemão, quando este passou a ser o referencial da identidade para os imigrantes. “O reconhecimento do estado trouxe uma politização e uma nacionalização antes desconhecida e também uma ‘alemanização’ dos clubes e associações, com a expulsão dos que não falavam alemão”, disse o professor. Segundo ele, esse processo significou a resignificação das diferenças entre os grupos de colonos de modo a se tornar um traço demarcatório que passa a exercer uma função política central.
— Ganha força a idéia de que existe uma vinculação política entre as instituições coloniais daqui e o cenário europeu. O patriotismo passa a ser mantido e cultivado, e o Estado torna-se a referência necessária — explicou o pesquisador, reiterando que o fato de ser alemão estava no posicionamento do imigrante diante do Estado Alemão. Nesse sentido, prossegue Luís Edmundo, nas colônias onde este vínculo não existia, só havia “germanidade” e não “alemanidade”.
O pesquisador contou que o esforço desses imigrantes de manter os traços nacionais foi apoiado pelo Estado Alemão, que financiou atividades culturais e artísticas, enviando para o sul do Brasil professores, estudiosos, pintores, escultores e acadêmicos.
Segundo Luís Edmundo, a 1ª Guerra Mundial, que teve início a partir do conflito entre Alemanha e Rússia, também contribuiu para produzir uma homogeneidade entre os imigrantes alemães. Foi a época dos protestos e da proliferação das instituições nacionalistas puramente alemães. “Era decisivo que os alemães no exterior tomassem parte. Dessa forma não tinha sido o Império alemão o derrotado na guerra, mas a própria ‘alemanidade’. Não era o Estado Alemão que estava sendo ameaçado pelos inimigos, mas a cultura”, concluiu.