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Déficit de Atenção: da genética à influência do meio social

O centro de estudos do Instituto de Psiquiatria (IPUB) da UFRJ recebeu nesta sexta, dia 12, o médico Daniel Segenreich, integrante do Grupo de Estudos de Déficit de Atenção (GEDA) da unidade, para a palestra “Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade: da clínica aos estudos da genética”. O pesquisador traçou um breve histórico sobre a patologia e abordou as suas possíveis causas genéticas sem descartar a influência do meio para o seu desenvolvimento.

O Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), também chamado de Distúrbio do Déficit de Atenção (DDA), é um transtorno neurobiológico crônico que surge na infância e pode acompanhar o indivíduo ao longo da vida. Nos últimos anos, este distúrbio ganhou repercussão na mídia e o surto de crianças diagnosticadas com TDAH contribui para a desconfiança de que tudo não passe de uma espécie de mania patológica e de que, na realidade, não exista.

Porém o surto é real e, segundo Daniel, atinge em média 3% a 5% das crianças em todo o mundo, caracterizando-se pela desatenção, hiperatividade e impulsividade. A pessoa com o TDAH apresenta falta de persistência em atividades que requeiram atenção e sente dificuldade de permanecer atenta a um estímulo. Nas crianças, o transtorno torna-se perceptível geralmente quando há uma falta de limites, problemas com comportamento ou dificuldade no rendimento escolar.

Na maioria dos casos, o TDAH permanece na vida adulta, porém o acompanhamento psiquiátrico e o tratamento multimodal — uma combinação de medicamentos, orientação aos pais e professores e técnicas específicas que são ensinadas ao portador — podem evitar que isto ocorra. “Nos adultos há a inquietude, mas nem sempre a agitação é perceptível, pois ele se controla melhor” disse Segenreich, acrescentando que o sintoma mais marcante do transtorno, que deve ser levado em consideração ao se fazer o diagnóstico, é a desatenção.

O TDAH, em geral, se manifesta até os 12 anos de idade. O diagnóstico, segundo ele, é feito através de testes como o ASRS, questionário auto-aplicável que mede os sintomas do transtorno: se o resultado for a presença de mais de 6 sintomas, o paciente é diagnosticado como portador. Caso algum sintoma só se manifeste em uma situação ou lugar específico de convivência, a criança não tem o TDAH, afirma Segenreich. “A criança que tem falta de atenção no terceiro tempo de aula da escola, provavelmente tem um problema com a professora, mas não tem o transtorno do déficit de atenção”. O médico também comenta sobre os sintomas do transtorno ao longo do tempo:

— A hiperatividade tende a diminuir, a impulsividade também diminui ou se modifica e a disfunção executiva e desatenção permanecem, gradativamente comprometendo mais o indivíduo — disse. Segundo ele, a disfunção executiva, dificuldade de planejamento e organização, parece variar de acordo com o grau de responsabilidades e exigências que sofreu o paciente quando era criança.

Segenreich contou que os primeiro casos relatados do transtorno remetem ao século XVIII. Somente há cerca de 50 anos, começaram as pesquisas clínicas dos sintomas e, posteriormente, surgiram os estudos em neuropsicologia para a formulação de modelos que qualificassem a desatenção e de neurotriagem para localizar regiões comprometidas do cérebro ligadas ao transtorno. Essas pesquisas não tiveram êxito e mais recentemente iniciaram-se os estudos genéticos a procura de uma causa para o TDAH, baseados na observação de que são freqüentes os casos em uma mesma família.

A hereditariedade ainda não é comprovada, mas, segundo Segenreich, os genes parecem ser responsáveis por uma predisposição ao TDAH. A partir desta idéia, cientistas procuram hoje “genes candidatos” que estejam associados às funções comprometidas pelo transtorno.

Atualmente as pesquisas apontam para o sistema dopaminérgico, ligado aos mecanismos de memória e responsável pelo controle e execução dos movimentos voluntários, como local da disfunção que geraria o TDAH. O gene responsável pela produção da proteína que faz o transporte da dopamina em transmissões cerebrais foi o candidato inicial para essas investigações, pois a produção desta proteína é inibida pelos estimulantes usados no tratamento do TDAH.

Segenreich apontou que o fator genético não é o único que deve ser considerado nos estudos da doença, ressaltando a importância das pesquisas associarem os genes também ao ambiente. “Nunca devemos falar em determinação genética, mas sim em predisposição ou influência genética” disse o médico. Segundo ele, pode haver casos em que, por exemplo, um pai tenha a predisposição genética e até alguns sintomas do transtorno e não o desenvolva, enquanto que seu filho, criado em diferentes condições de ambiente com mais estressores (agentes produtores de estresse), desenvolva a doença.

Segundo o médico, existem hoje sete genes descritos que podem definir o risco do TDAH. O indivíduo que possua alteração em alguns desses genes não necessariamente vai desenvolver o transtorno, pois pode ocorrer uma situação em que a alteração não seja suficiente para gerar o quadro clínico. Este indivíduo possuiria apenas uma disfunção intermediária, apresentando alguns sintomas que não interfeririam de modo significativo em seu cotidiano. “O meio ajuda ou não cada paciente no desenvolvimento do transtorno. A genética define um risco, mas o meio sempre vai se importante” reafirmou o médico, lembrando da importância do ambiente saudável na infância.