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Os desafios do diagnóstico psiquiátrico

 O Instituto de Psiquiatria da UFRJ discutiu no auditório Leme Lopes nesta sexta-feira, dia 14 de março, o tema Diagnóstico Psiquiátrico: propósitos, níveis e contextos, em sessão do Centro de Estudos. Para a palestra, foram convidados os professores da UFRJ Marco Antônio Brasil, do Departamento de Psiquiatria e Medicina Legal da Faculdade de Medicina, Theodor Lowenkron, coordenador do Laboratório de Psicopatologia e Psicanálise, e Erotildes Maria Leal, pesquisadora do IPUB.

Antes de dar inicio à palestra, Lowenkron esclarece que os três relatores da mesa apresentaram essa exposição no Simpósio do Departamento de Diagnóstico e Classificação Psiquiátrica, durante o Congresso Brasileiro de Psiquiatria realizado ano passado em Porto Alegre.

Marco Antônio inicia a apresentação destacando a fala de José Leme Lopes, mestre da Psiquiatria brasileira, que dá nome ao salão onde é proferida a sessão de estudos. “O problema do diagnóstico em Psiquiatria é central. Sua aceitação identifica o modelo médico. É um processo fundamental na clínica, pesquisa e na doutrina psiquiátrica”, cita o médico, lembrando que a dificuldade do diagnóstico em psiquiatria é reafirmada por vários especialistas de renome. “Não há um denominador comum ou conceito essencial de base às diferentes formas de transtorno, pois até indivíduos com o mesmo diagnóstico diferem em vários aspectos”, explica o professor.

Brasil explica que segundo o sistema classificatório de psiquiatria DSM IV-TR, transtorno mental é “uma síndrome ou padrão comportamental ou psicológico clinicamente significativo que ocorre em um indivíduo que é associado a um desconforto, aflição ou com um aumento significativo do risco de sofrer a morte, dor, incapacidade, ou uma perda importante de liberdade. Em acréscimo, essa síndrome deve ser uma resposta esperada e culturalmente sancionada a um evento particular”, conta o médico.

O especialista critica então a classificação dos distúrbios psiquiátricos, atualmente por categorias, o que não permite delinear claramente suas fronteiras. Para ele, a classificação por dimensão apresenta uma abrangência maior, embora também possua dificuldades de definição. “Segundo Kraepelin (1920), é constante a impossibilidade de se fazer um diagnóstico com cem por cento de certeza”, cita Marco Antônio, chamando também a atenção para o perigo da medicalização. “Devemos atentar para não ‘converter’ os doentes à medicina científica, oferecendo-lhes a ‘saúde psíquica’ através de medicamentos desnecessários”, adverte.

Theodor Lowenkron completa o discurso de Brasil, citando os sistemas classificatórios e atuais em psiquiatria CID-10, de 1992, e DSM IV-TR, de 2000, lembrando que “toda classificação não é o trabalho exclusivamente científico ou um instrumento político; ela é o conjunto, de modo geral, desses fatores. Cabe aos que produzem as classificações e aos que se utilizam delas que estejam cientes desses propósitos, de suas finalidades e de seus limites”, define o especialista, apresentando o dilema existente entre a singularidade de cada paciente e a necessidade de um sistema de classificação universal.

Lowenkron propõe, então, uma definição de transtorno: “esta é uma condição intermediária entre síndrome e doença, em que a etiologia e os mecanismos subjacentes estão sendo investigados e que ainda não alcançou o status de doença, como acontece nas demais especialidades médicas. Considerando as classificações contemporâneas da Psiquiatria, o diagnóstico nosológico (ramo da Medicina que estuda e classifica as doenças), enquanto fundamento e princípio geral, não é possível no atual estágio de conhecimento em nossa especialidade”, explica o médico.

Erotildes Leal, por fim, defende que devem ser consideradas certas características do adoecimento mental: “o adoecimento se constitui na relação do sujeito com o mundo e isso constitui ambos os lados. Dessa relação, dois aspectos ganham importância: a vivência do cuidado e a experiência do adoecimento”, aponta a palestrante, que completa: “Por exemplo, a aparente desconexão do mundo e às vezes de si próprio, não diz apenas da sua doença e de seus sintomas, mas de um modo de relação consigo e com o outro", afirma, destacando então a construção do diagnóstico como o desafio central da psiquiatria.