Michel Nussenzweig, da Rockefeller University, foi convidado pela COPEA, Coordenação de Programas de Estudos Avançados da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), para integrar os Encontros Científicos promovidos para o mês de Agosto pelo Forum de Ciência e Cultura. Foi escolhido como tema os “Avanços recentes em Imunologia”, exposto ontem no Salão Pedro Calmon, no campus da Praia Vermelha da UFRJ.
O especialista convidado começou por definir o sistema imune humano por seu funcionamento de proteção do organismo contra bactérias, vírus, parasitas e outros invasores que venham a surgir. É um complexo mecanismo que protege o homem, inclusive, contra irregularidades internas, a exemplo dos tumores.
Segundo ele, a Imunologia do homem pode ser dividida em três propriedades: especificidade, diversidade e memória. A primeira refere-se ao fato de cada célula de defesa automaticamente se especializar em um tipo de invasor. Ao reconhecer o organismo estranho — antígeno — uma célula reage a ele e começa um procedimento intenso de multiplicação para, em seguida, poder atacá-lo. Pela propriedade de memória do processo imunológico, todo antígeno que é detectado uma vez, fica registrado para possíveis invasões futuras. É esta memorização que constitui a base das vacinas, responsável por incentivar a produção de anticorpos antes mesmo de o corpo entrar em contato com algum agente estranho.
Já a capacidade de diversidade do sistema imune é muito importante, revela Michel. É o que possibilita que a defesa humana responda até contra invasores que não existem espontaneamente na natureza. O mecanismo do homem contra os antígenos é construído a partir de recombinações entre genes, através do qual cada célula cria sua própria solução de combate a um determinado invasor. São recombinações independentes, imprecisas e casuais que permitem um alto índice de possibilidades combinatórias, logo, ampliam significativamente a habilidade de proteção do organismo humano.
Avanços nos estudos dos quais Michel participa evidenciaram alguns desafios no campo da Imunologia. Neles, são investigadas quais as regras do sistema imune, se elas podem ser manipuladas para técnicas de vacina, quais os geradores da diversidade imunológica e as prováveis conseqüências de haver a produção desses altos índices de variedade. A última questão, de acordo com o pesquisador, é de grande relevância. Ele reflete: com toda essa capacidade de diversificação de células de defesa, como impedir a criação de um sistema imune que atue contra o próprio organismo humano? Não longe da realidade, este problema pode ser percebido nas chamadas doenças auto-imunes, das quais é possível citar algumas alergias.
Michel e os colaboradores de seu estudo usaram a doença Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES) — desencadeada por agentes externos desconhecidos, que podem ser bactérias, vírus, entre outros — para uma intensa pesquisa de observação do sistema imunológico. Esta enfermidade é caracterizada por induzir uma produção inadequada de anticorpos (células de defesa) que atacam o próprio homem, lesionando a pele e outros tecidos, como os do aparelho digestivo. A partir daí, foram descobertos dois locais no organismo humano em que ocorre a reatividade do sistema imune contra constituintes saudáveis do corpo.
Por suas propriedades de diversidade, especificidade e memória, conclui o especialista, o mecanismo de defesa nos homens começa com uma quantidade inicial de anticorpos que vão se adicionando no sistema ao longo da vida, conforme as pessoas entram em contato com agentes estranhos. Constatado isso, o próximo passo na pesquisa de Michel é descobrir como manipular esse funcionamento imunológico para o combate a doenças auto-imunes e, principalmente, checar a possibilidade de recombinar os genes para a produção de uma célula de defesa capaz de suprimir reações no corpo que evoluiriam para o câncer.