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Nona edição da Semana de Biomedicina reúne professores e estudantes

Foi aberta, nessa segunda-feira, dia 13, a Semana de Biomedicina. Em sua nona edição, o evento é organizado por alunos e sempre aborda os principais assuntos da ciência e da clínica. Para o primeiro dia, a professora adjunta da UFRJ Regina Coeli ministrou a palestra: “Terapia celular na cardiopatia chagásica experimental”.

A abertura contou com a presença do professor Roberto Lent, diretor do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB), que elogiou a iniciativa dos estudantes e ressaltou a importância do evento para a formação dos futuros profissionais.

Primeiro dia: pesquisas sobre a cardiopatia chagásica

No Brasil estima-se que tenhamos de três a cinco milhões de pacientes com a doença de Chagas. Transmitida pelo mosquito popularmente conhecido como barbeiro, a doença se prolifera facilmente. Os sintomas são pouco característicos, o que dificulta o diagnóstico. Entretanto, após um período, quase 30% dos pacientes evoluem para um estado de cardiopatia.

Estima-se que, no Brasil, há mais de um milhão de pacientes com cardiopatia chagásica — estado para o qual não existe tratamento especifico, a não ser o transplante. A professora ressaltou as dificuldades desse tipo de tratamento: “Sabemos dos problemas da recepção, da própria doação desses órgãos, além do risco inerente da cirurgia do transplante.”

Nesse contexto de entraves e dificuldades, um tratamento alternativo vem se tornando cada vez mais necessário. A terapia celular, segundo a professora, surge como uma possibilidade real de tratamento. A célula tronco se apresenta como a opção ideal para o processo. “É uma célula indiferenciada, com capacidade de auto-renovação e de se transformar em uma célula especializada”, explica Regina.

Essas características podem ser encontradas em células oriundas de diversas partes do corpo. O tratamento combinado de células diferentes vem sendo experimentado, bem como a combinação entre células tronco e medicamentos. Em 2000, a literatura especializada sinalizou para o grupo de pesquisas de Regina Coeli uma direção a seguir: a célula da medula óssea. Os artigos publicados indicaram que este tipo de célula tem uma capacidade pluripotente, isto é, funciona no tratamento de qualquer tecido.

Os primeiros passos para a comprovação da eficácia do método de terapia celular devem passar pelos experimentos, primeiramente em animais. A professora relatou parte do trabalho do grupo, que envolveu infectar camundongos, auferir e analisar os dados dos animais e testar o tratamento. Os resultados foram, segundo Regina, surpreendentes. Em um dos casos, os dados demonstraram uma reversão nos sinais da doença.

Apesar de não comprovarem a eficácia do tratamento em humanos a professora é otimista: “É claro que quanto isso pode ser garantido na clínica, quando falamos de paciente, não sabemos, mas as evidências fazem com que a gente passe da bancada para o leito do doente”.

Em 2006, os primeiros experimentos em pacientes foram divulgados e publicados. Um grupo de 28 pacientes foi submetido ao tratamento e acompanhado por dois meses. A conclusão das experiências é de que o tratamento é seguro, factível e potencialmente eficaz.  No contexto de pesquisas na área clínica, o Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF) está envolvido e contribui para os estudos sobre o assunto. O Programa de Terapia Celular – o PROTECEL – produz estudos que apontam para a direção certa, como considera a professora. “Estamos no caminho certo”, concluiu Regina.

Segundo dia: estímulos, atenção e emoção: compreendendo o cérebro

No cotidiano, um indivíduo está constantemente sob efeito de estímulos visuais que, apesar de rápidos e passageiros, provocam forte influência em sua maneira de agir e de se comportar.

O segundo dia da IX Semana de Biomedicina abriu espaço para o assunto e convidou a professora Mirtes Garcia Pereira, da Universidade Federal Fluminense (UFF) para falar a respeito. O tema da palestra foi: “Interação entre atenção e emoção no cérebro”.

A observação e exame dos detalhes de gestos como uma piscadela revelam que uma imagem negativa pode ativar ou intensificar a ativação do sistema defensivo. Os voluntários para as experiências dessa pesquisa foram submetidos à seguinte situação: enquanto observavam uma imagem (positiva, negativa ou neutra) ouviam, em um fone, um som brusco, o que causava o ato de piscar.

Os resultados demonstram que a piscada durante a exibição da imagem negativa apresentava uma amplitude expressivamente maior. “Quando é mostrada uma imagem positiva, é causada uma inibição do sistema de defesa. Por outro lado, quando a imagem negativa é exibida, uma pré-ativação do sistema defensivo é causada. Com isso, as repostas são facilitadas”, explicou a professora.

Influência no comportamento

As conclusões de que os estímulos visuais alteram os reflexos defensivos são claras. Contudo, qual é a capacidade das imagens de alterar o comportamento? O método de pesquisa do grupo do LABNEC — Laboratório de Neurofisiologia do Comportamento — da UFF, para isso, se baseou na avaliação de execução de tarefas pelos voluntários. Foram apresentadas, em um computador, figuras agradáveis, desagradáveis e neutras. Logo após, foi solicitado aos voluntários que clicassem em um ponto na tela.

Os dados da pesquisa apontam que a resposta da ação do individuo quando o voluntário está observando estímulos negativos é mais lenta. Mirtes explica que isso pode ser devido a uma paralisação provocada pela ativação do sistema de defesa, “assim como uma presa ‘congela’ ao perceber a presença do predador”, compara a professora. Esses dados permitem uma conclusão muito evidente de que os estímulos negativos podem gerar prejuízos ao desempenho humano.

Essa interferência no comportamento, contudo, não é invariável. Ao deslocar a demanda de atenção para uma tarefa muito difícil, por exemplo, o estímulo negativo deixa de exercer o prejuízo sobre o reflexo do voluntário. Segundo a professora, o foco da atenção para uma atividade muito complexa causa uma espécie de “cegueira” e, com isso, os estímulos negativos passam despercebidos.

Além disso, as características de cada voluntário também devem ser levadas em conta. Para isso, foram atribuídos valores de “afeto positivo” e “afeto negativo”. Essas medidas ajudam a diferenciar o impacto de indivíduo para indivíduo. Os valores de afeto positivo ou negativo são determinados por meio da identificação do voluntário com situações e sentimentos bons, como alegria, ou maus, como tristeza ou raiva.

Os grupos que apresentam alto afeto positivo reduzem, por exemplo, a resposta de sudorese, sinal de estresse, quando são convencidos de que uma imagem desagradável que estão observando é ficcional. Esse tipo de regulação emocional já não é tão bem-sucedido nos outros grupos, verificando a diferenciação de pessoa para pessoa nos reflexos dos estímulos.

A Semana de Biomedicina termina na próxima sexta-feira, dia 17, encerrando a nona edição do encontro. Além das palestras e mini-cursos oferecidos, uma mesa redonda com o tema “Dez anos de Dolly” reúne para debates especialistas de diversas universidades.