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Memória

Uma visão norte-americana sobre energia e mudanças climáticas

O Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ) recebeu na última sexta-feira, dia 25 de maio, o norte-americano Howard Steven Geller, especialista em eficiência energética, para uma conferência sobre “a política energética americana no contexto das mudanças climáticas”. 

Geller é diretor executivo do Southwest Energy Efficiency Project (SWEEP), instituto voltado para o desenvolvimento tecnológico e difusão dos programas de eficiência energética em seis estados americanos: Arizona, Colorado, Nevada, Novo México, Utah e Wyoming.

Além do especialista norte-americano, também estiveram presentes na conferência Roberto Schaeffer, do Programa de Planejamento Energético da Coppe/UFRJ, e Luiz Pinguelli Rosa, secretário executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas (FBMC).

Problemas

Com a emissão de gases poluentes, em especial os provenientes da queima de combustíveis fósseis, o clima do planeta vem sofrendo alterações. Nos últimos séculos, a temperatura global aumentou cerca de 0,74 ºC.

Pode parecer pouco, mas as conseqüências desse aumento, apresentadas por Geller, são uma série de problemas ambientais, alguns já observados nos Estados Unidos (EUA), como a maior ocorrência de tempestades; furacões cada vez mais fortes e freqüentes; prejuízos para a biodiversidade marinha; impactos na agricultura e oferta de água, entre outros.

O aquecimento global também contribui para o derretimento das calotas polares, o que eleva o nível dos oceanos. Segundo estimativa do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), o nível do mar pode aumentar até 80cm nesse século.

Eficiência Energética

“Pesadelo no Planeta Terra: Nossos Múltiplos Desafios e o Que Nós Podemos Fazer Em Resposta” foi o título da apresentação de Howard Geller. Ele mostrou como os programas de eficiência energética nos EUA podem contribuir para a manutenção do meio ambiente, através de uma substituição das fontes de energia poluentes pelas renováveis, junto à implantação de novos hábitos de consumo no país.

Geller expôs dois cenários sobre a política energética norte-americana em meio às mudanças climáticas: um que ele chamou de Business-As-Usual (BAU), que consiste na previsão oficial do departamento de energia do governo norte-americano; e outro nomeado Alternative. “O cenário BAU gera custos altos para a economia e para o meio ambiente, enquanto que o alternative prevê medidas de eficiência energética que reduzem esses gastos”, explica o conferencista.

O cenário alternativo sugere o uso de fontes renováveis de energia, como a eólica, solar ou o biocombustível. O uso do etanol como combustível renovável é uma possibilidade no setor de transportes. Nos EUA, há projetos em fase de avaliação voltados para essa proposta.

Atualmente, as usinas de carvão mineral constituem a principal fonte de energia elétrica norte-americana. De acordo com o cenário alternativo, tal fonte energética pode ser substituída pelo gás natural. “20% da produção de energia elétrica precisa vir de fontes renováveis até 2020”, ressalta o especialista americano.

Além de incentivar as concessionárias de energia elétrica dos EUA a adotarem tecnologias renováveis, é possível dobrar a eficiência energética através de medidas como mudanças nos sistemas de ar-condicionado, aquecedores, equipamentos eletrodomésticos em geral, entre outras aplicações.

Os cidadãos norte-americanos, por sua vez, podem contribuir para o desenvolvimento sustentável, optando por imóveis mais econômicos e evitando o uso de automóveis. No entanto, mesmo no cenário alternativo, não há previsão de grandes modificações no comportamento dos americanos, em virtude da já consolidada cultura de consumo. Se aposta muito mais em tecnologias de combustíveis renováveis do que em uma conscientização da população.

Crise do Petróleo

Nos últimos 150 anos, houve grandes transformações na oferta e consumo de energia no mundo, desde o uso da madeira e carvão, até o petróleo – principal fonte de energia do século XX – e o gás natural, cujo consumo vem crescendo nos últimos 50 anos.

Após 1985, o consumo de petróleo no mundo permanece acima do crescimento das reservas desse recurso, o que evidencia seu caráter limitado enquanto fonte de energia. Hoje, mesmo com novas tecnologias e investimentos, a produção de petróleo chega à metade da produção máxima atingida no Alaska em 1970.

Segundo Geller, a tendência é uma futura crise energética, com pico nos próximos 20 anos. Tal crise certamente irá desencadear uma série de conflitos nos EUA, uma vez que o país é grande dependente das reservas petrolíferas do Oriente Médio (local onde, inclusive, já possui ocupações militares), ao contrário do Brasil, que é auto-suficiente em petróleo.

Além da ameaça à segurança nacional – devido ao esgotamento das reservas do “ouro negro” e à competição para exportação – a comunidade norte-americana tende a sofrer com mais problemas, como os relacionados à saúde, devido à poluição gerada com a queima de combustíveis fósseis: “Metade da população dos EUA mora em cidades com qualidade do ar abaixo dos limites estabelecidos”, explica Geller.

Governo Bush

A Ciência avança nos estudos quanto aos impactos do efeito estufa, mas nem sempre a política caminha no mesmo passo. Os Estados Unidos é o país que mais contribui no mundo com a emissão dos chamados Gases do Efeito Estufa (GEE) – como o Dióxido de Carbono (CO2) – e é aquele cujo governo se recusa a aderir ao Protocolo de Kyoto, através do qual vários países se comprometeram a reduzir a emissão dos GEE, causadores do aquecimento global.

– O governo Bush não têm esse comprometimento. Ele reconhece que o problema do efeito estufa existe, se limita a dizer que está estudando o caso, quando na realidade não fez nada para apoiar as políticas de eficiência energética nos últimos seis anos -, declara Geller.

Mas nem tudo está perdido na terra do Tio Sam. Geller citou que mais de 300 cidades do país com acima de 50 milhões de habitantes assumiram a responsabilidade de seguir as metas estabelecidas pelo Protocolo de Kyoto, independentemente da posição de Bush. “O estado da Califórnia, por exemplo, possui compromissos fortes em eficiência energética, fontes renováveis e redução dos GEE”, informa Geller.

Quando questionado pela platéia sobre a possibilidade do político americano Al Gore – que perdeu para Bush nas eleições e que lançou o documentário “Uma verdade inconveniente”, sobre o aquecimento global – vir um dia a assumir o governo americano, Geller opina: “Acho que a carreira política de Al Gore acabou. Ele está feliz como ativista ecológico, defendendo o combate ao efeito estufa, e está ajudando nesse sentido”.