Categorias
Memória

Discutindo o futuro da Universidade

A Reforma Universitária proposta pelo governo federal foi o tema central do debate promovido na COPPE, na última quinta-feira, 31 de março. Representantes do cenário acadêmico, científico e sindical se reuniram para discutir as questões apresentadas ao Ministro da Educação, Tarso Genro, na tentativa de alterar o Anteprojeto da reforma.

agencia1840T.jpgA Reforma Universitária proposta pelo governo federal foi o tema central do debate promovido na COPPE, na última quinta-feira, 31 de março. Representantes do cenário acadêmico, científico e sindical se reuniram para discutir as questões apresentadas ao Ministro da Educação, Tarso Genro, na tentativa de alterar o Anteprojeto da reforma.
A mesa de debates foi moderada pelo ex-diretor da COPPE, Luiz Pinguelli Rosa, e contou com a presença da primeira secretária da Andes (Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior), Milena Martinez, além de Cícero Rodrigues, reitor da UFF e vice-presidente da Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes de Instituições de Ensino Superior). Estavam presentes, também, Luiz Davidovich, diretor da Academia Brasileira de Ciência (ABC), Ênio Candotti, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Nelson Maculan, Secretário de Educação Superior do MEC, Ângela Üller, diretora da COPPE e o reitor da UFRJ, Aloísio Teixeira.

As idéias

Em seu texto de abertura, Luiz Pinguelli destacou que a reforma universitária é uma questão urgente, pois modelo educacional superior brasileiro seria “cópia fiel do produtivismo americano”, baseado no neoliberalismo e na competitividade. Isso, segundo Pinguelli, levaria a uma inversão dos valores da universidade, que deixava de cumprir sua função social de formação e passava a ser um “centro de disputas de fundos e investimentos para pesquisas, não importando os valores éticos envolvidos”.
Apesar de reconhecer que a Reforma pode ser aperfeiçoada, o reitor da UFRJ, Aloísio Teixeira, foi o único a se mostrar favorável ao anteprojeto. “Eu gosto da Reforma”, afirmou o professor. “Se tivesse que escolher entre aprová-la agora ou jogá-la no lixo, não hesitaria em aprová-la. Sou crítico da Reforma da Previdência, da Lei da Inovação, das parcerias público-privadas e da política sócio-econômica do governo. Mas, eu gosto do projeto. Acho que pode ser melhorado, pois tem as idéias fundamentais de gratuidade do ensino e a questão nuclear de fortalecimento do ensino público”.
O reitor criticou, porém, as idéias de expansão propostas. Para ele, o aumento do número de alunos não se daria seguindo o modelo existente, mas através de uma ação articulada entre os três poderes e as universidades, com aberturas de novos campi fora de sua sede, como a UFRJ, que abrirá o curso de Biologia Marinha em Macaé.
Segundo Aloísio Teixeira, as propostas da Andifes e da ABC seriam um projeto de tutela da universidade por eles mesmos. Para ele, a autonomia é essencial, porém a universidade deve prestar contas à sociedade: “a universidade não pode ser resolvida dentro da academia. Ela deve prestar contas aos que têm delegação da sociedade”.
A Secretária da ANDES, professora Milena Martinez, ao contrário, mostrou-se insatisfeita e fez uma série de críticas às políticas adotadas pelo governo. “Nos surpreendemos negativamente com a proposta de Lula, que é parecida com a de FHC, e se baseia em diretrizes do Banco Mundial”, disse a professora.
Ela também mencionou a agenda criada pelo 24º Congresso da ANDES, que demonstra uma posição contrária à mercantilização do ensino superior. “O 24º Congresso da ANDES apresentou uma agenda que não pretende ser a lei orgânica para o ensino superior, mas se propõe ajudar a construir uma universidade fundamentada na produção de conhecimento, que é essencial na formação de nossa concepção de nação”, afirmou a professora, que cobrou do Estado reajustes salariais, uma relação de financiamento das universidades através do cálculo do PIB e métodos de assistência ao estudante universitário de forma a garantir sua permanência nos cursos. Ela defendeu ações afirmativas centradas na oferta de educação básica de qualidade, prioritariamente em territórios carentes, declarando que a melhor forma de transpor as desigualdades sociais seria através de melhorias nos ensinos médio e fundamental das escolas públicas, tirando o eixo principal das cotas raciais em ações afirmativas, apesar de não anulá-las.
Também a favor de políticas de assistência aos estudantes, o reitor da UFF, Cícero Fialho, discorda do artigo 41 do anteprojeto, que prevê, anualmente, uma aplicação da União de, no mínimo, 75% da receita constitucionalmente vinculada à manutenção e desenvolvimento do ensino nas instituições federais de educação superior. “Acreditamos que a proposta inicial do governo de 75% de financiamento é insuficiente. Deve ser calculado 18% em cima de toda a arrecadação federal”, declarou. Ao fim de seu discurso, o professor defendeu a educação à distância como uma forma viável de democratização do ensino.

Perda de qualidade

O professor Luiz Davidovich chamou a atenção para o crescimento do número de universidades particulares que, segundo ele, não foi acompanhado por uma fiscalização estatal pela garantia de qualidade. “Em 96, havia 700 estabelecimentos particulares de ensino, no final do governo FHC o número já era de mais de 1700”, destacou.
Ele também criticou a matriz de financiamento das IFES e o processo de escolha de carreiras do Vestibular. “Nossos cursos são engessados. Os jovens são obrigados a escolher uma especialização prematura de carreira, impedindo a abrangência de conhecimento”, afirmou.
Criticando a distribuição de recursos pelo país, o presidente da SBPC, Enio Candotti, mencionou a concentração de investimentos no eixo Rio-São Paulo, o que retardaria o progresso científico do Brasil. “O espaço de produção científica está mal distribuído pelo país”, declarou o professor, cobrando medidas efetivas do governo. Ênio disse, ainda, que a principal questão da reforma é “resolver a ‘equação’ de porquê faltam empregos em certas áreas de conhecimento e há doutores desempregados nos centros de pesquisa do país”.
Apesar de ser contra a substituição dos recursos estatais pelos privados nas universidades públicas, afirmando que seria obrigação do MEC garantir uma infra-estrutura satisfatória, a professora Angela Uller, Diretora da COPPE, demonstrou interesse na criação de melhores condições de intercâmbio entre a universidade e a dinâmica de crescimento do país. “Falta na Reforma uma atenção à interação das IFES com o nosso desenvolvimento sócio-econômico”, disse a professora, que classificou como inatingível a proposta do Plano Nacional de Educação do governo, que prevê o aumento da taxa de escolarização do país para 30% da população em 5 anos, e fez as contas: Só o aumento de 40% das vagas na universidades públicas até 2011 significa contratar 185 mil professores em seis anos, o que causaria um acúmulo de 4 milhões de alunos e resultaria num acréscimo de 7 bilhões no orçamento anual para pagamento dos novos professores”.
O Secretário de Educação Superior do MEC, Nelson Maculan, cobrou a criação de sistemas de crédito mais inteligentes, para garantir que os estudantes possam realizar atividades fora das universidades. Também defendeu uma intervenção do Estado nas universidades particulares de maneira que a qualidade de ensino seja priorizada, enfatizando a necessidade de aumentar o número de alunos cursando o ensino superior. “Tenho vergonha de dizer que apenas 9% dos jovens entre 18 e 24 anos estão em universidades, e menos ainda em universidades públicas”, lamentou o professor.