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Pesquisadores da UFRJ desenvolvem Luminol

Kit do reagente químico, usado para identificar presença de sangue em locais de crime, produzido pelo LASAPE é dez vezes mais barato que o importado.

Kit do reagente químico, usado para identificar presença de sangue em locais de crime, produzido pelo LASAPE é dez vezes mais barato que o importado.

A Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro vai ganhar um aliado para desvendar crimes em que haja ocultação de provas. Pesquisadores do Laboratório de Síntese e Análise de Produtos Estratégicos (LASAPE) do Departamento de Química Analítica, Instituto de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) desenvolveram uma nova abordagem de síntese e formulação para o Luminol, substância que detecta vestígios de sangue, mesmo em locais que tenham sido exaustivamente lavados com produtos de limpeza. A grande vantagem do kit de Luminol, desenvolvido com apoio da FAPERJ, é o seu custo: dez vezes menor que o similar importado.
Largamente utilizado por diversas agências de investigação criminal em todo o mundo, entre elas o FBI nos Estados Unidos, o Luminol formulado no LASAPE é um reagente que produz uma reação de quimioluminescencia sem necessitar a utilização da luz ultravioleta para caracterizar as manchas de sangue em locais sob suspeita de crime contra a vida humana. A sensibilidade química da substância é fantástica: ela consegue identificar manhas de sangue até a proporção de 1 em 1.000.000.000, mesmo em locais extremamente lisos, como azulejos, pisos cerâmicos e madeira, que inclusive já tenham sido lavados.
A eficácia do produto é tão grande que é possível detectar o sangue mesmo que já tenham se passado seis anos após a ocorrência do crime. Outra vantagem do produto é que a reação química produzida por ele não afeta a cadeia de DNA, possibilitando, assim, o reconhecimento dos criminosos ou das vítimas. “Se na época do assassinato do jornalista Tim Lopes, a polícia brasileira já utilizasse rotineiramente o Luminol, o trabalho dos peritos para descobrir o local do crime e fazer o reconhecimento dos restos mortais teria sido mais fácil”, afirma Cláudio Lopes, Professor do Departamento de Química Analítica da UFRJ.
O kit do Luminol pode ser utilizado em diferentes locais, como o interior de uma casa, em ambientes abertos ou mesmo dentro do porta-malas de automóveis, que são utilizados com freqüência para a ocultação e transporte de cadáveres por criminosos. Para verificar se há vestígios de sangue, os peritos precisam borrifar as duas misturas de substâncias que compõem o kit e que produzem a reação de quimioluminiscência, semelhante à produzida pelos vaga-lumes.
Durante a reação, que dura cerca de 30 segundos e pode ser repetida, os peritos têm a oportunidade de verificar se há ou não presença de sangue no local. As dimensões e o formato da mancha, como por exemplo sob a forma de gotas ou espirrado, também são informativas e podem ser observadas. Essas evidências contribuem para a perícia criminal determinar se o crime foi cometido no próprio local, se o corpo da vítima foi transportado até ele, e mesmo se houve tentativa de ocultação de provas ou de simulação de suicídio por homicidas profissionais.
Para testar a eficiência do kit do Luminol produzido no LASAPE, os pesquisadores da UFRJ cederam alguns kits para o Instituto de Criminalística Carlos Éboli (ICCE) da Polícia Civil do Rio de Janeiro. O reagente foi utilizado para a investigação de cinco homicídios ocorridos na jurisdição de diferentes delegacias da cidade do Rio de Janeiro e usado recentemente nas investigações sobre a morte do chines naturalizado brasileiro Chan Kim Chang, numa sala do presídio Ary Franco. De acordo com o laudo dos exames periciais, o Luminol sintetizado pelo laboratório foi aprovado pelo ICCE. O kit também foi fornecido para o Centro de Criminalística da Polícia Militar e tem sido utilizado nas aulas práticas do curso de Oficial da PM.
Recentemente, a nova abordagem de síntese do Luminol desenvolvida no LASAPE e a sua aplicação em Química Forense receberam menção honrosa na XXIV Jornada de Iniciação Científica da UFRJ. O projeto foi conduzido pelos Professores Cláudio Cerqueira Lopes, Jari Nóbrega Cardoso, Rosângela Sabbatini Capella Lopes, todos do Departamento de Química Analítica, Instituto de Química- UFRJ; pela pós-doutoranda Jaqueline Alves da Silva, que é bolsista da FAPERJ; e pela aluna de iniciação científica do curso de Química da UFRJ, Letícia Gomes Ferreira, que realizou em bancada todas as etapas da preparação da nova formulação.
De acordo com o Professor Jari Nóbrega Cardoso, o LASAPE tem capacidade para produzir 30 litros de Luminol por mês, volume suficiente para atender a demanda da Polícia Civil. A grande vantagem é que o kit feito na UFRJ poderia ser vendido a R$ 200, enquanto o similar importado chega a custar em torno de R$ 3 mil. Como o LASAPE não pode comercializar o produto diretamente, as secretarias de segurança e órgãos interessados precisam fazer um convênio com a Fundação Universitária José Bonifácio (FUJB) da UFRJ, para comprá-lo. Os recursos obtidos na comercialização serão reinvestidos na fabricação do reagente e empregados na manutenção das atividades de pesquisa do laboratório.
O baixo custo do kit pode ser explicado pela nova estratégia de síntese do reagente desenvolvida pelos pesquisadores da UFRJ. Segundo a Professora Rosangela Sabbatini Capella Lopes e a pós-doutoranda Jaqueline Alves da Silva, o processo de síntese é diferente do que geralmente é adotado para a obtenção do Luminol industrialmente, que exige condições reacionais sob alta temperatura e pressão. Outro fator determinante para a redução do preço é a nacionalização de todos os componentes utilizados. O pentacloreto de nióbio, é produzido e fornecido gratuitamente pela Companhia Brasileira de Mineração e Metalurgia (CBMM) de Araxá, Minas Gerais. Todo este novo trabalho de síntese e formulação do Luminol esta sendo patenteado no INPI, como forma de garantir as agências de fomento a pesquisa no país (FAPERJ, CNPq) e a própria UFRJ um retorno do investimento realizado no projeto.
Os pesquisadores do LASAPE estão se dedicando a sintetizar novos derivados oxigenados do Luminol. O objetivo principal é conseguir, através destas substâncias um aumento no tempo da reação de quimioluminescência, podendo ainda vir a ser encontrado neste grupo um reagente mais sensível à detecção de manchas de sangue comparativamente ao Luminol.
Segundo os pesquisadores do LASAPE o reagente Luminol também pode ser utilizado com outras finalidades, como no diagnóstico precoce do cancer do aparelho digestivo, ou na determinação quantitativa de álcool e vitamina C em bebidas, sucos e refrigerantes.