Na última quinta-feira, 29/4, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) recebeu do governo federal a notícia de que R$ 41,1 milhões de seu orçamento discricionário haviam sido bloqueados. Orçamento discricionário é a verba que a instituição tem para bancar seu custeio (água, luz, limpeza, segurança etc) e investimento (infraestrutura física). A notícia dramática não é nenhuma novidade frente à via crucis orçamentária que a maior universidade federal do país atravessa desde 2012.
Fato é que a regressão orçamentária da UFRJ se apresenta outra vez. De 2012 para cá, foram cortes sucessivos. Naquele ano, a Universidade tinha R$ 773 milhões em caixa. Desde então, mesmo com a inflação e aumento de vagas e de sua estrutura, o ciclo de subfinanciamento prosseguiu: em 2013 caiu para R$ 735 milhões; em 2014, para 611; depois, 606; em seguida, 541; 487; 430; 389; 386; e, agora em 2021, R$ 299 milhões. Em valores brutos, houve uma perda de, pelo menos, R$ 474 milhões de 2012 até agora.
A história continua: os R$ 299 milhões até então aprovados para a UFRJ não estão a salvo. Na verdade, somente R$ 146,9 milhões foram liberados, sendo que R$ 65,2 milhões já foram utilizados, restando apenas R$ 81,7 milhões. Isso porque R$ 152,2 milhões estão indisponíveis já que aguardam suplementação do Congresso Nacional, que não tem data para apreciação. Desse montante, o governo federal ainda bloqueou R$ 41,1 milhões. Ou seja, se o Congresso Nacional aprovar a suplementação orçamentária, só R$ 111,1 milhões serão disponibilizados à UFRJ, perfazendo, assim, um orçamento de R$ 258 milhões — um regresso da Universidade a seu orçamento real de 2008 (e nominal de 2011). Mas como era a UFRJ de 2008? Naquele ano, cerca de 34 mil alunos de graduação tinham vínculo com a instituição. Já agora, o número passa de 57 mil. A expansão da universidade foi nítida com o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni).
Para a reitora Denise Pires de Carvalho, é preciso mais orçamento, e urgente. “As universidades públicas brasileiras são responsáveis por mais de 90% da geração de conhecimento no país e têm sido instituições fundamentais no enfrentamento da COVID-19 por meio dos seus hospitais universitários e laboratórios de pesquisa. Há, hoje, 4 vacinas brasileiras em fases avançadas de testes clínicos sendo desenvolvidas por universidades públicas. No entanto, todo esse sistema educacional de nível superior está fortemente ameaçado pelos cortes orçamentários de 2021 — que vêm acontecendo de forma progressiva ao longo dos anos. Se compararmos o orçamento de 2021 com o orçamento de 2015, por exemplo, a UFRJ tem apenas metade do valor de custeio e não tem nenhum orçamento de capital para investir na sua infraestrutura física. Ou seja, temos metade do orçamento de custeio numa universidade que expandiu as suas atividades, que tem 9 hospitais e unidades de saúde funcionando, que demandam limpeza, segurança e medicamentos, além dos mais de 1.450 laboratórios de pesquisa. E nós precisamos pagar a luz, a água, a limpeza”, afirma.
Ao invés de subir, orçamento desce
“Neste ano de pandemia, esperávamos um aumento, um orçamento suplementar de, pelo menos, 20%. Jamais esperaríamos esse corte. Se pensarmos que o dólar aumentou muito nos últimos anos, temos um orçamento em dólar assustadoramente menor, o que inviabiliza o funcionamento dessas importantes instituições de estado no Brasil”, diz Denise.
Para ela, “é uma escolha que o país está fazendo, que é abandonar suas instituições públicas de ensino, pesquisa e extensão, a casa do saber, o local de geração do conhecimento, que pode trazer uma perspectiva de um futuro melhor para o nosso país com o almejado desenvolvimento socioeconômico”.
Por conta da situação orçamentária, a saída do ensino remoto fica prejudicada. “Sem dúvida nenhuma, o cenário afeta drasticamente o futuro retorno presencial porque todos esses cortes que se somam fazem com que seja impossível ampliar contratos de limpeza e de segurança. Muito pelo contrário, vamos ter que reduzir os contratos de limpeza, isso sem falar nas refeições dos estudantes. O Restaurante Universitário, voltando ao seu pleno funcionamento em uma época de possível retorno presencial, também é mais uma dificuldade. Além disso, existe a necessária adaptação de infraestrutura física, compra de álcool 70%, compra de equipamentos de proteção individual (EPIs) e aumento nos contratos de limpeza — iniciativas básicas que ficam inviabilizadas com os cortes, gerando atraso na possibilidade de retorno presencial”, afirma a reitora, que admite que a necessidade de redução ou revogação de contratos de serviços terceirizados “com certeza implicará demissões, aumentando ainda mais o número de desempregados em um país que já tem altíssimas taxas de desemprego, talvez das maiores taxas em termos históricos”.
“Situação muito crítica”
Segundo Eduardo Raupp, pró-reitor de Planejamento, Desenvolvimento e Finanças da UFRJ, o cenário é desolador.
“É uma situação muito temerária para o nosso funcionamento. Nós temos poucos meses de fôlego, cerca de dois ou três, com base no orçamento livre. E mesmo com o orçamento condicionado vindo a ser aprovado, diante desse bloqueio a gente tem orçamento, no máximo, até o mês de agosto ou setembro. É uma situação muito crítica”, aponta.
“Mesmo com essa situação, estamos, no âmbito da UFRJ, fazendo todos os esforços para continuar assegurando as bolsas assistenciais e as bolsas acadêmicas. Vamos ter que revisar novamente todos os contratos e serviços, considerando o novo cenário. É uma situação ainda mais crítica que a do ano passado — quando o orçamento já era insuficiente, mas estava integralmente liberado para utilização e havia, pelo menos, recursos emergenciais para o combate à COVID-19, que, neste ano, já foram descartados pelo governo. Vamos ter que lidar com essa situação, possivelmente atingindo áreas que conseguimos preservar no passado, como assistência hospitalar e outras atividades essenciais da Universidade. Este é o trabalho que estamos fazendo agora: examinando os impactos para análise do corpo diretivo da UFRJ em todas as suas instâncias e compartilhando informações para que possamos tomar as melhores decisões”, conclui Raupp.
A UFRJ
Maior universidade federal do Brasil, a UFRJ é a primeira instituição oficial de ensino superior do país, com atividade desde 1792 (Escola Politécnica, a sétima escola de Engenharia do mundo e a mais antiga das Américas) e organizada como universidade em 1920. Presença registrada nas 15 melhores posições dos mais diversos rankings acadêmicos na América Latina, a instituição conta, hoje, com 172 cursos presenciais de graduação, 4 de graduação a distância, 315 de especialização e 224 programas de pós-graduação (mestrado, doutorado e pós-doutorado). Com mais de 1.700 ações de extensão, a Universidade está perto do povo.
Segundo o Ranking Universitário Folha, a UFRJ é a universidade mais inovadora do país, o que também se deve à sua pluralidade: seu corpo social é composto por mais de 65 mil estudantes (nesse âmbito, anualmente, 5 mil se formam na graduação e 2,6 mil dissertações e teses são produzidas), 4 mil docentes (sendo que 9 em cada 10 têm doutorado), 3,7 mil técnicos-administrativos atuantes nos hospitais da UFRJ e 5,6 mil em demais unidades.
A Universidade tem estrutura similar à de um município de médio porte. Antes da pandemia de COVID-19, a Cidade Universitária, campus principal, tinha circulação diária de cerca de 100 mil pessoas por dia. Compatível com o seu grau de relevância estratégica para o desenvolvimento do país, a UFRJ formou uma sucessão de ex-alunos notáveis, como o indicado ao Prêmio Nobel da Paz Osvaldo Aranha; os escritores Jorge Amado e Clarice Lispector; o arquiteto Oscar Niemeyer; os médicos Oswaldo Cruz e Carlos Chagas; os jornalistas Fátima Bernardes e Ali Kamel; e o matemático Artur Ávila, primeiro latino-americano a receber a Medalha Fields, prêmio oferecido a matemáticos com até 40 anos e considerado equivalente ao Prêmio Nobel.
Uma das instituições que mais produzem ciência no Brasil, a UFRJ possui dois campi fora da capital fluminense: um em Macaé e outro em Duque de Caxias. Com projetos de ponta nas áreas científica e cultural, a antiga Universidade do Brasil tem sob seu escopo 9 hospitais universitários e unidades de saúde, 13 museus, mais de 1.450 laboratórios, 45 bibliotecas e um Parque Tecnológico de 350 mil metros quadrados, com startups e empresas de protagonismo nacional e internacional.
Por Assessoria de Imprensa da Reitoria