Em feito inédito, Stevens Rehen, pesquisador do Instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ e membro afiliado da Academia Brasileira de Ciências, e seu grupo de cientistas do Laboratório Nacional de Células-Tronco Embrionárias da UFRJ, transformaram células do braço de um paciente com esquizofrenia em células-tronco e depois em neurônios, apresentando grandes avanços em relação à patologia.
Grave transtorno psíquico que causa alucinações, alterações do pensamento e no contato com a realidade, a esquizofrenia é uma doença sem cura e que já afeta dois milhões de brasileiros.
Na pesquisa, descobriu-se que os neurônios de pacientes esquizofrênicos consomem mais oxigênio do que neurônios saudáveis, mas não produzem mais energia. Os cientistas utilizaram a técnica de reprogramação celular em que é feita uma biópsia de uma célula extraída de um paciente. Na célula, é injetado um retrovírus que carrega um embrião. Então, essa célula se transforma numa célula-tronco embrionária que, devido a sua maior capacidade de diferenciação, pode ser reprogramada para formar diferentes tecidos. Neste caso, foi reprogramada como um neurônio que funciona normalmente.
“As principais vantagens dessa metodologia são a possibilidade de se acompanhar o processo de diferenciação das células-tronco em neurônios, a variedade de tipos celulares gerados, já que essas células-tronco podem se transformar em todos os tipos celulares, garantindo melhor previsão da resposta terapêutica e toxicológica, a utilização de diversos pacientes fornecendo informações sobre a variação genética de um amplo setor da população e testes farmacológicos feitos especialmente para cada um dos pacientes através da medicina personalizada”, explica Bruna Paulsen, do LaNCE-UFRJ e aluna de doutorado do pesquisador.
Na utilização dessa técnica criada no Japão em 2007, os cientistas escolheram reprogramar as células da pele dos pacientes devido a seu fácil acesso e manipulação. Entretanto, não é da pele que os novos neurônios surgem. “As análises foram feitas em neurônios derivados das células-tronco reprogramadas e não nas células da pele”, ressalta a cientista.
O grupo de cientistas revela que ainda existem estudos a serem feitos para o desenvolvimento de um tratamento realmente eficaz contra a patologia, apesar do grande progresso que fizeram. O ponto-chave da pesquisa é que com ela cada paciente pode ser estudado especificamente para que seu tratamento seja especializado. “Nosso estudo cria uma nova possibilidade de realização de testes farmacológicos de forma paciente-específica. Poderemos estudar os neurônios de um determinado paciente e buscar a melhor combinação de medicamentos/antipsicóticos para o caso dele especificamente,” revela Bruna Paulsen.
Segundo ela, além do avanço no estudo da esquizofrenia, com a reprogramação de células, a análise de outras doenças cerebrais também pode ser feita. ”A metodologia utilizada se aplica especialmente à modelagem de doenças que tiverem alguma causa genética. Particularmente no caso de doenças mentais em que o acesso às células afetadas, no caso neurônios, é mais difícil, essa metodologia se torna ainda mais atraente como modelo de estudo.“
A pesquisa, realizada inteiramente no Brasil, está voltada para uma patologia de difícil diagnóstico. A esquizofrenia apresenta múltiplos sintomas e, além disso, não há um gene específico que a caracterize. Para identificá-la, observam-se os sintomas e o histórico familiar. Entretanto, como os primeiros sintomas do transtorno aparecem, na maioria dos casos, na adolescência, os sintomas da doença podem ser confundidos com o comportamento natural para a idade, retardando o diagnóstico. A medicina personalizada aplicada na pesquisa pelos cientistas poderá trazer ainda mais avanços para o tratamento da esquizofrenia.