Os conflitos de interesses na pesquisa científica foram debatidos, na quinta (18/03), no auditório do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (IESC). A palestra, parte do seminário “Conflitos de interesses na pesquisa científica – a relação universidade e indústria farmacêutica em foco”, foi ministrada por Miguel Kottow, professor da Universidade do Chile.
Durante sua fala, Kottow realizou uma reflexão conceitual: frisou a distinção entre os conflitos de interesses genuínos e os dilemas éticos. Para ele, a expressão “conflito de interesses” só pode ser utilizada em referência a uma disputa interna do indivíduo, na qual ele deve decidir entre duas opções interessantes que não podem ser cumpridas simultaneamente. “O conflito genuíno não oferece danos a outras pessoas e quase nunca envolve problemas éticos”, explica.
Como exemplo, Kottow citou a postura de um médico diante da decisão de informar ou não o diagnóstico de câncer a um amigo. Neste caso, o profissional pode optar por não comunicar a doença ao paciente, adotando uma postura paternalista, ou decidir pela honestidade e contar a verdade. Em nenhuma das hipóteses, o médico, segundo Kottow, feriria a ética.
Já os dilemas éticos, que, na maior parte dos casos, se disfarçam de conflitos de interesses, mas não o são, acontecem quando a decisão do indivíduo ou grupo privilegia seu próprio interesse em detrimento de um dado compromisso obrigatório. “Se um médico, por exemplo, receita um remédio apenas porque recebe uma comissão do laboratório fabricante do produto, embora este não seja o mais adequado, ele está cometendo uma falta ética”, observa.
Kottow afirmou que os comitês de Bioética em Investigação em Seres Humanos costumam enfrentar uma série de dilemas éticos. Entre eles, o professor destacou o uso de placebos em situações para as quais existem terapias comprovadamente eficazes. “Há também o caso do pesquisador que manipula o resultado de seu trabalho para atender interesses do patrocinador”, lembrou.
Para evitar a confusão entre o conflito de interesses e o dilema ético, Kottow sugere, como primeiro passo, mudar a forma de conceituar as situações. Segundo ele, “não devemos tratar a falta ética como um simples interesse, porque ela não é moralmente neutra”. Além disso, o professor propõe que todos os conflitos sejam declarados e reconhecidos publicamente.
O seminário “Conflitos de interesses na pesquisa científica – a relação universidade e indústria farmacêutica em foco” continua na manhã desta sexta-feira (19/03) com a palestra Ciência e consciência. Que interesses se devem considerar?”, de Maria Luisa Pfeiffer, da Universidade de Buenos Aires.