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Matemática, Ensino e Cognição

— Todo matemático chega ao mundo como uma criança e depois se torna muito arrogante — disse em tom de brincadeira, David Tall, professor emérito em Pesquisa do Pensamento Matemático da Universidade de Warnick, Inglaterra, em sua palestra Historical and Individual Development of Mathematical Thinking: set-before and met-before (Desenvolvimento histórico e individual do pensamento matemático: set-before e met-before). O professor foi o primeiro palestrante do “IV Colóquio de História e Tecnologia no Ensino de Matemática” (HTEM) que teve início nesta segunda-feira, dia 5 de maio, às 11h, no Salão Nobre do Centro Cultural Horácio Macedo no prédio do Centro de Ciências Matemáticas e da Natureza (CCMN).

David Tall se propôs a esclarecer o problema do ensino da matemática nas escolas brasileiras e de quase todo o mundo: “os estudantes parecem não entender, os professores ensinam aos estudantes como passar nos exames, os estudantes passam nos exames, mas não compreendem a matemática.” Para isso, ele considerou a cognição humana e criou dois termos que estão no título de sua palestra: set-before e met-before. O primeiro se refere às habilidades genéticas que cada indivíduo tem para o pensamento matemático. Habilidades que são a fundação do pensamento matemático e que se mantêm as mesmas, por milhares de anos, no homem. Os três principais set-before seriam: o reconhecimento de diferenças e semelhanças que permite categorizar; a repetição de operações que possibilita operar automaticamente e a linguagem que nomeando operações nos permite pensá-las como conceitos.

Já o termo met-before se refere à estrutura mental pessoal que é resultado de experiências anteriores do indivíduo. Logo, segundo o professor, há muitos met-before possíveis na sociedade que variam de acordo com as experiências presentes. “Um exemplo de met-before é pensar que depois do número 2 vem o 3 e que a adição dá a idéia de aumento. Esses met-before, muito comuns no pensamento infantil e desenvolvidos pelo métodos das escolas, não funcionam para tudo. Ao se pensar em frações não é possível desenvolver uma seqüência estabelecida como a dos números naturais (inteiros não negativos) e ao utilizar a adição com números negativos não se obtém um aumento como resultado (-8 + 5= – 3). As crianças aprendem esses met-before como se fossem regras e depois eles não servem mais”, esclarece David e afirma que isto dificulta o aprendizado da matemática, pois  o cérebro usa as informações que já tem, que já viu antes, para construir novos conceitos.

— Utilizar os set-before é o cerne da questão no aprendizado. Se o estudante não consegue pensar no conhecimento como encapsulado, só lhe resta aprender o procedimento para passar nos exames. E deste modo ele não ganha o met-before, o que torna o aprendizado seguinte muito complicado — disse Tall que acredita que os set-before tornam o conhecimento mais poderoso, pois são capazes de comprimir o conhecimento adquirido em conceitos contáveis.

Segundo David todo matemático age a partir de seus met-before, até mesmo Platão. “O desenvolvimento do pensamento matemático vem das particularidades de cada sociedade, o set-before é igual para todos, desde o matemático mais renomado à criança que acabou de entrar na escola, mas a forma como ele se desdobra é diferente em cada cultura. Ao ensinar, o objetivo é encorajar o pensamento matemático, mas temos que levar em conta o met-before dos alunos”, alerta Tall.

Para ele quando um aluno inicia o aprendizado de algo da matemática, ele já tem algum conhecimento prévio relacionado, mesmo que seja muito basal. Por isso é necessário, por parte do educador, uma grande atenção e investigação para esclarecer as origens das eventuais dificuldades de compreensão do aluno.