Em homenagem aos 90 anos da Revolução Russa e aos 140 anos da publicação da obra O Capital, de Karl Marx, completados neste ano, o Programa de Pós-graduação em Serviço Social, a Escola de Serviço Social (ESS) e o Laboratório de Estudos Marxistas José Ricardo Tauile (LEMA), todos da UFRJ, realizam o evento “A Atualidade do Socialismo e as lições da História”, que teve início nesta segunda-feira, dia 12 de novembro e termina dia 13.
Duas mesas-redondas marcaram a abertura no primeiro dia, enfocando temas como “Os significados da Revolução Russa no século XXI” e “O Capital e os sentidos do Socialismo na contemporaneidade”. Além do lançamento do livro “O Poder Global”, de José Luis Fiori, professor de Economia Política Internacional no Instituto de Economia da UFRJ, da inauguração da exposição “Revolução aos 90: o extraordinário e o cotidiano nas trilhas da Rússia”, com Gilberto Maringoni, jornalista, historiador e artista gráfico, e da apresentação do filme “Da Revolução de Outubro à Perestroika: imagens do Socialismo na União Soviética”, por Lécio Augusto Ramos, pesquisador de cinema.
Yolanda Guerra, coordenadora do Programa de Pós-graduação de Serviço Social, abriu o evento, destacando a importância dessa discussão num momento em que tanto a Revolução Russa quanto a obra de Marx completam este ciclo, considerando os desdobramentos do socialismo ao longo desse tempo e seus reflexos na sociedade contemporânea. “Retratar o significado da Revolução Russa nos dias de hoje está em considerá-la como uma grande inflexão histórica que culminou num conjunto de processos políticos e de requisições teórico práticas que evidenciaram a importância da democracia, do parlamento, da aliança operário-camponesa, dos conselhos, da ditadura do proletariado. Recuperar a atualidade das polêmicas, sobre a ação revolucionária e as controvérsias sobre as ações dos partidos e dos sindicatos, dos processos revolucionários de 1905 a 1917, é dar centralidade aos elementos basilares que subscreveriam o caminho trilhado pela classe trabalhadora ocidental no século XX e que permanecem atuais, especialmente se considerarmos as contradições e os desafios da universalização dos ideais de emancipação humana, originários do projeto da modernidade, e a grande crise sócio-econômica e cultural na qual se encontra a humanidade no século XXI”, disse Yolanda, que completa: “a Revolução Bolchevique expressa a força da aliança operário-camponesa que alcançou o poder de Estado na Rússia. Constitui-se um exemplo de justeza da teoria Marxista na sua capacidade de analisar cientificamente a realidade e ser um guia para a ação revolucionária”.
A cerimônia de abertura contou ainda com a declamação de composições de Vladimir Maiakovski, o poeta da Revolução, por Morena Marques, Ivy Carvalho e Marina Alecrim, alunas da ESS, e também com a execução do hino “A Internacional”, composta em 18 de Junho de 1888 por Pierre Degeyteer, operário de origem belga, com letra de Eugéne Pottier, operário francês, ambos anarquistas, que se tornou o mote da luta socialista.
Os significados da Revolução Russa
A primeira mesa do evento, mediada por Laura Tavares, Pró-reitora de Extensão da UFRJ, e composta por Raymundo de Oliveira, professor do Instituto de Matemática da UFRJ, Luis Fernandes, cientista político e presidente da Financiadora de Estudos e Projetos FINEP, e José Luís Fiori, discutiu os significados da Revolução Russa no século XXI, a partir da análise dos acontecimentos e seus reflexos nos dias atuais.
Raymundo de Oliveira aborda a temática estabelecendo uma linha de discussão entre os erros e acertos da Revolução Bolchevique. “Os fatores que podemos destacar como as maiores falhas dos governos socialistas são a falta de experiência e a visão maniqueísta da realidade. Isto é, não houve a percepção, que por outro lado a burguesia possui, de que a convivência de divergências secundárias pode ser transformada em características positivas. Essas diferenças foram transformadas em contradições: qualquer forma de pensamento que destoasse da lógica socialista estabelecida era tomada por inimiga do sistema”, explica. Quanto aos acertos, Oliveira cita diversos exemplos, como o estabelecimento do socialismo em Cuba, e os investimentos na área social. “A existência da bipolaridade contribuía, de certa maneira, para a manutenção da paz. Certamente a instauração do socialismo cubano teria fracassado se não fosse a União Soviética, da mesma forma que acredito que não teria ocorrido o massacre no Iraque se ainda existisse uma contraposição forte à política norte-americana. Quanto às medidas sociais, podemos destacar o maior número de creches por mulher já existente na Alemanha Oriental, a política de valorização do trabalho e não do capital, como defende a lógica capitalista de reprodução expandida, entre outras iniciativas”, enumera o palestrante.
Para Luis Fernandes, o tema em pauta remete à Revolução de outubro, e às contradições que Antonio Gramsci observa: “Esta foi uma revolução contra o capital como força político-econômica e contra a ‘O Capital’, de Karl Marx, por não ter ocorrido de acordo com os ideais presentes na obra”, parafraseia o palestrante, que explica: “Para Marx, a revolução deveria acontecer em uma potência capitalista, mas ocorreu em uma Rússia agrícola e pré-capitalista. Apesar disso, mudanças significativas foram alcançadas com a instauração da União Soviética. Internamente, houve rápida distribuição de renda e reforma agrária, além da expansão dos direitos sociais. No campo externo, a revolução trouxe para a agenda mundial a problemática da desigualdade social, além de contribuir para o processo de descolonização da África, devido à bipolaridade geopolítica existente no pós-guerra, representada por sistemas antagônicos”, afirma Fernandes.
José Luís Fiori, por sua vez, faz uma intervenção entre o desenvolvimento socialista contemporâneo, a revolução de outubro e seu livro “O poder global”. Fiori conta que a Rússia apresenta uma história que alterna grandes derrotas e rápido restabelecimento, superando na maior parte das vezes a situação favorável anterior. “A partir de 1990, devido a fatores como uma elite corrompida, burocracia histórica, privatizações em larga escala, a grande potência que era a União Soviética desapareceu em uma década, sendo também desfragmentada e sofrendo a intervenção da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) na Rússia. Surpreendente, entretanto, foi a rapidez com que o país se restabeleceu em cinco anos, adotando medidas como a recentralização do poder estatal firme e a reestatização do controle de serviços estratégicos, como petróleo e gás, acompanhadas de significativo crescimento econômico”, contextualiza o palestrante, que afirma: “se a Rússia atual superar sua posição de fornecedora de matéria-prima, gás e petróleo, alcançando níveis avançados de desenvolvimento tecnológico e industrial, tornando-se mais que uma potência bélica, uma potência econômica, é possível retomar sua hegemonia política antes existente”, defende Fiori.
Após as exposições dos palestrantes convidados, Laura Tavares abriu espaço para as questões e comentários do público, ocorrendo em seguida o lançamento do livro “O poder Global”, de José Luís Fiori.
O evento prossegue nesta terça-feira, dia 13 de novembro, com a formação de duas mesas redondas, “Os Grundrisse e a alternativa do comunismo” e “Estado, democracia e revolução”, além do lançamento do livro “O jovem Marx e outros escritos de filosofia”, de Georg Lukács, organizado e com introdução de Carlos Nelson Coutinho e José Paulo Netto, professores da UFRJ.
A programação acontece no Salão Pedro Calmon, no Fórum de Ciência e Cultura, que fica à Avenida Pasteur, nº250 – campus UFRJ da Praia Vermelha.