Pesquisa realizada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) apresenta resultados promissores para o tratamento de pessoas que sofrem de pressão alta. O objeto de estudo é uma substância extraída do cajueiro, a qual se mostrou eficaz no combate à hipertensão.
Quando os caules do cajueiro são agredidos, estes liberam uma resina de proteção, chamada exsudato. Após passar por um processo de purificação simples, essa resina é transformada em uma goma (polissacarídeos), que pode ser utilizada na produção de alimentos voltados para o tratamento de hipertensos.
– A grande vantagem é que não há produção de resíduos ao fim desse processo, uma vez que o etanol (mais conhecido como álcool etílico), utilizado na purificação, é eliminado muito facilmente através da evaporação –, ressalta Cheila Gonçalves Mothé, professora da Escola de Química (EQ/UFRJ) responsável pela pesquisa, que já trabalha com o cajueiro há 20 anos.
Resultados surpreendentes
Foram feitas análises químicas dessas substâncias, testando-as em ratos espontaneamente hipertensos, cujas reações são as que mais se aproximam da realidade humana. Respeitando um comitê de ética, os ratos foram alimentados com uma solução dessa goma, de concentração igual a 500mg/kg.
A cada semana em que esses testes eram realizados, a pressão do Grupo Controle (que não se alimentava com a goma do cajueiro) e a do Grupo Goma (que se alimentava com a substância) foi aferida, possibilitando a constatação de um dado relevante: houve uma diminuição de 25% na pressão arterial do último grupo.
Nos testes, observou-se uma série de outros aspectos positivos da goma do cajueiro para o sistema cardiovascular. “Em uma análise do miocárdio, por exemplo, o Grupo Controle apresentou destruição de parte desse tecido, enquanto que o Grupo Goma não”, informa Cheila. A preservação da estrutura do miocárdio dos ratos indica como a goma de cajueiro pode evitar o infarto, campeão de causa de mortes no Brasil.
Esses estudos resultaram de uma parceria entre a UFRJ e a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). O Departamento de Processos Orgânicos da EQ/UFRJ foi responsável pelas análises químicas da goma do cajueiro, além de viabilizar a idéia para os estudos, através da professora Cheila Mothé. O Departamento de Morfologia Cardiovascular do Hospital da UERJ, por sua vez, realizou a alimentação das cobaias, ou seja, os ensaios in vivo. Houve a colaboração de alunos de Graduação e Pós-graduação, junto a pesquisadores nacionais e estrangeiros.
Saúde Pública no Brasil
A professora Cheila Mothé, que também é a atual presidente da Sociedade Brasileira de Ciência e Tecnologia de Alimentos – Regional Rio (SBCTA), já desenvolveu alimentos a partir da goma de cajueiro. Como exemplo, podemos citar os sucos tropicais e a emulsão para salada, na qual substitui-se a quantidade de gordura pela goma.
Ela já possui as patentes desses alimentos, e Indústrias privadas mostraram-se interessadas em viabilizar tais produtos em escala comercial. No entanto, Cheila acredita que o ideal seria um interesse por parte do Governo – seja ele Estadual ou Federal – visando a progressos na área de saúde.
Segundo informações do Sistema Único de Saúde (SUS), referentes a 2006, cerca de 820 pessoas morrem, por dia, vítimas de hipertensão. “Estamos vivenciando um grave problema de saúde pública em nosso país, e o uso da goma do cajueiro no tratamento de quem sofre de pressão alta pode ser um grande passo para melhorias”, declara a professora.
Tomando como base dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), o Ministério da Saúde estima que, no Brasil, apenas 15 % dos hipertensos recebem algum tipo de tratamento. Os custos para obtenção da goma do cajueiro são baixíssimos, o que reforça a importância da pesquisa para o país. “Muitas pessoas podem ser beneficiadas com a goma principalmente as de baixa renda”, acredita Cheila.
Benefícios para o agronegócio
Cheila acredita que é possível incentivar o agronegócio do caju no estado do Rio de Janeiro – os testes mostraram que a qualidade do exsudato do cajueiro daqui é tão grande quanto a do Nordeste do Brasil. “O governo poderia incentivar o plantio de caju no Norte Fluminense, por exemplo, uma das regiões mais pobres do Rio”, opina a professora.
Além disso, várias seriam as vantagens para o estado, que apontam para o desenvolvimento sustentável: satisfaria o setor agrícola, aumentando o número de empregos; a goma poderia ser utilizada como alimento funcional, beneficiando tanto os que sofrem de doenças cardiovasculares, quanto os que necessitam tratar-se de desnutrição (através dos sucos); e os resíduos da Indústria de Alimentos poderiam se converter em biomassa, utilizada como combustível de fonte renovável – etanol, por exemplo. A professora Cheila já vem trabalhando na questão da biomassa, que atende aos esforços para combater o aquecimento global.
A pesquisa sobre o exsudato do cajueiro é inédita no mundo, pois a substância nunca havia sido testada antes. No entanto, a pesquisa não é valorizada no Brasil, e não são raras as circunstâncias, por exemplo, nas quais o exsudato é descartado, principalmente na Região Nordeste do Brasil. Ela conclui: “O Brasil precisa se voltar para suas potencialidades agrícolas, e acreditar mais nos seus pesquisadores e na tecnologia nacional”.