Por Maria Rita Nader*
O cavaquinho é um dos instrumentos mais populares do Brasil e está presente no samba, no choro, no forró e até mesmo em alguns funks. Preservar a importância, a história e continuar estudando suas transformações musicais no mundo contemporâneo é o objetivo do pesquisador e músico Pedro Cantalice. Em 2018, ele foi o primeiro aluno a se formar em cavaquinho pela UFRJ e agora vai inaugurar, em dezembro, o espaço Instituto Memória do Cavaquinho, dedicado ao seu acervo físico e digital, discos e pesquisas. Além disso, irá promover cursos e eventos. Localizado no bairro de Vila Isabel, no Rio de Janeiro, o local tem como objetivo preservar a memória do instrumento. Cavaquinista e bandolinista, Cantalice promove festivais com artistas que tocam cavaquinho em diversos lugares do país todos os anos.
Em 29/10 deste ano, o músico reuniu-se virtualmente com o primeiro grupo totalmente dedicado ao estudo do instrumento. “O cavaquinho era um instrumento muito masculino. Na verdade, a cultura é machista, mas as coisas estão mudando e, assim, democratizando mais esse espaço. Hoje em dia, já tem muitas mulheres na roda de samba tocando, por isso esse é um dos assuntos possíveis de estarem presentes nos debates”, conta o músico. Ele lembra que o instrumento musical passou por diversas mudanças antes de chegar às universidades e aos debates críticos.
O nome do cavaquinho não era esse quando veio de Portugal para o Brasil em 1808, com a chegada da família real. Na época, ele se chamava “machete”. “O cavaquinho tem uma identificação muito grande com as camadas populares da população. A primeira citação que existe da imprensa brasileira foi na década de 1810, quando começaram a fazer anúncios de escravos fugidos que tocavam machete”, explica Henrique Cazes, músico e professor do instrumento na UFRJ.
No Brasil, o cavaquinho brasileiro tornou-se conhecido com a expansão do rádio, que possuía um instrumento em cada estação de uma capital do país. A partir dos anos 1940, o instrumento foi popularizado pelo artista Waldir Azevedo, mestre do cavaquinho e autor de choros clássicos como Brasileirinho e Delicado.
Segundo Cantalice, a criação do curso de bacharel em cavaquinho na UFRJ em 2011 por Henrique Cazes, foi importante para unir o conhecimento acadêmico da música clássica com a cultura popular do instrumento. “A universidade é um ponto muito importante para a cultura de um povo porque estuda profundamente um assunto e tem a importância de divulgação desses estudos, com as monografias, dissertações e teses”, diz Cantalice. Atualmente, existe um vasto acervo de literatura e metodologia com o curso e com o projeto Memória do Cavaquinho Brasileiro.
Um dos principais desafios em manter viva a memória dessa área é mostrar que, apesar de o cavaquinho ter a sua importância dentro do desenvolvimento no samba e no choro, o conhecimento sobre ele era disperso. “Meu trabalho é em parte de cavaquinho e em parte de psicólogo. Eu tenho que conseguir convencer as pessoas de que aquilo é importante. Fico feliz em fazer com que as pessoas tenham uma cultura musical que consiga dar ao cavaquinho uma dimensão mais ampla e além daquele início comercial”, afirma o pesquisador e músico Cazes.
Para Cantalice, as expectativas para o futuro do cavaquinho, tanto musicalmente quanto academicamente, são promissoras. “Eu fui para os Estados Unidos para dar um curso e na minha sala tinha dez pessoas norte-americanas tocando cavaquinho brasileiro”, ressalta. Segundo ele, escolas de samba e de choro ao redor do mundo utilizam o cavaquinho como o principal instrumento. Apesar de ter um símbolo forte na cultura brasileira, ele ainda não é reconhecido por todas as universidades. Até hoje, a UFRJ é a única com um curso de bacharel em cavaquinho. “Espero estar vivo para poder ajudar os doutores em cavaquinho e ver a gente completar esse primeiro estágio da literatura do instrumento, podendo oferecer vários caminhos e possibilidades. E vê-lo com respeito e com carinho”, finaliza o professor Henrique Cazes.
*Bolsista SGCOM.