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Pelo Campus Sociedade

Direitos de pessoas com deficiência são discutidos no Fórum de Ciência e Cultura

Evento foi realizado pelo Laboratório de Arte, Cultura, Acessibilidade e Saúde e teve a participação de Anna Paula Feminella

Pessoas com deficiência possuem direitos em todas as áreas. E esses direitos precisam ser retomados durante o governo eleito. Foi esse o cerne da palestra Pela Retomada da Perspectiva de Direitos Humanos  na Agenda da Defesa de Direitos das  Pessoas com Deficiência, que aconteceu na segunda-feira, 27/2, na sede do Fórum de Ciência e Cultura (FCC) da Universidade Federal do Rio de Janeiro. A  atividade foi desenvolvida pelo Laboratório de Arte, Cultura, Acessibilidade e Saúde, do Departamento de Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade, em conjunto com a organização não governamental Escola de Gente, que tem como propósito colocar a comunicação a serviço da inclusão na sociedade. O encontro contou também com o apoio da Diretoria de Acessibilidade (Dirac) da UFRJ e do projeto Um Novo Olhar, parceria entre a instituição e a Fundação Nacional de Artes (Funarte).

No auditório cheio, Anna Paula Feminella, secretária nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, trouxe à tona uma reflexão sobre os direitos das pessoas com deficiência de uma forma ampla. Feminella, que se tornou mulher com deficiência em 2003, sobre  a invisibilização. – apesar do grande número de pessoas com deficiência no país, sobre as múltiplas formas de opressão que essas pessoas com deficiência podem sofrer, além da necessidade de políticas públicas de estado voltadas para a área.

Feminella, que iniciou sua exposição sobre o assunto com frases de Simone de  Beauvoir − “Que nada nos limite, que nada nos defina, que nada nos sujeite! Que a liberdade seja nossa própria substância, já que viver é ser livre!” –, fez questão de afirmar que “as complexidades se intensificam, dependendo dos marcadores sociais que as pessoas carregam”, evidenciando que “os sistemas de opressão são muitos”, afirmou Anna Paula.

Segundo a secretária, para ampliar a visibilidade das pessoas com deficiência, é necessário que o papel de articulador seja exercido por todos da sociedade, de forma a oferecer qualidade no acesso e efetividade das políticas públicas:  “Em qualquer política pública, em qualquer evento, a gente precisa contemplar os aspectos da acessibilidade”.

As políticas públicas são ações que têm como objetivo solucionar alguma questão da sociedade, são processos desenvolvidos pelo Estado. Elas são divididas entre políticas de Estado e políticas de governo. As de Estado são mantidas independentemente do governo que estiver no poder. Já as de governo, como o próprio nome sugere, dependem da vontade política dos governantes e por isso são mais fáceis de serem descontinuadas. De acordo com Feminella, um dos desafios da Secretaria é tornar a inclusão de pessoas com deficiência uma política de Estado.

A secretária destacou ainda que os direitos humanos não podem estar garantidos apenas na lei. Eles precisam existir na prática, nos territórios, precisam estar no cotidiano. Ela garantiu que esse também é um dos compromissos do Ministério. Na opinião da debatedora, ainda vivemos numa sociedade capacitista, que hierarquiza vidas e enxerga as pessoas sem deficiência dentro de um padrão de normalidade e as com deficiência como anormais e doentes.

Feminella enfatizou a necessidade de a avaliação de pessoas com deficiência ser biopsicossocial, e não biomédica, como é realizada hoje em dia. De acordo com a Lei nº 13.146/15, o  Estatuto da Pessoa com Deficiência, “a avaliação da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar, e considerará os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo; os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais; a limitação no desempenho de atividades; e a restrição de participação”. Cabe ao Poder Executivo criar meios e instrumentos para que a avaliação seja realizada.

Nesse sentido, Feminella considera a instauração da avaliação  biopsicossocial mais um desafio para o Ministério que integra. De acordo com definição do Senado Federal, “a avaliação biopsicossocial é um procedimento técnico de verificação que busca avaliar os direitos das pessoas com deficiência, como forma de identificar individualmente de que modo ela desabilita ou prejudica a autonomia plena na vida profissional e cotidiana, entre outros aspectos de sobrevivência”.

“A avaliação biopsicossocial retira a identificação da pessoa com deficiência como uma CID(Código Internacional de Doenças). Ela nos desloca da condição de passivo e nos distancia da relação que muitas pessoas ainda fazem da deficiência como doença”, disse a secretária. Feminella  também salientou a relação existente entre o capacitismo, que ela acredita ser estrutural, e a pobreza: “Estamos mais presentes nos territórios mais empobrecidos. O capacitismo estrutural desemboca no assistencialismo. As políticas públicas nos empurram para o empobrecimento, para a necessidade de assistência social”.

A secretária frisou, entre as consequências da situação, a falta de emprego para as pessoas com deficiência. Considerar o capacitismo algo estrutural da nossa sociedade significa que ele está presente há tanto tempo entre nós que faz parte da estrutura social, estando enraizado e inclusive sendo tratado como algo natural. Feminella destacou que o governo inclusivo é um objetivo fundamental do Ministério. Para isso, é necessário falar sobre as políticas afirmativas para vencer o capacitismo, pois são elas que ajudam a democratizar os espaços. Citando, ainda,  a Lei nº 8.213/91, Lei de Cotas para Pessoas com Deficiência, afirmou que não acredita que ela funcione de forma efetiva: “A Lei de Cotas precisa funcionar; ela tem 30 anos e ainda não funciona. As políticas públicas precisam funcionar”.

A palestra também contou com a participação da plateia. Antônio Borges, professor da pós-graduação em História das Ciências e das Técnicas e Epistemologia (HCTE/UFRJ) e especialista em Tecnologia Assistiva, opinou sobre o que devemos e podemos fazer para que as pessoas com deficiência tenham uma vida melhor: “A primeira coisa é tornar o indivíduo mais poderoso, que a pessoa com deficiência tenha mais acesso ao que ela precisa. A segunda coisa é fazer com que quem gravita ao redor dessa pessoa conheça mais sobre ela. E a terceira é fazer com que o mundo seja mais acessível, onde as coisas funcionem melhor, onde não existam barreiras, onde haja respeito. A acessibilidade tem que ser considerada um direito de todos”.

Também participaram da mesa debatedora: Márcia Cabral, superintendente de Saberes Tradicionais, do FCC; Amélia Rosalvo, diretora de Acessibilidade Cultural da UFRJ; Claudia Werneck, jornalista formada pela UFRJ e fundadora da Escola de Gente. Patrícia Dornelles foi a responsável pela abertura do evento.