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ONU recomenda fortalecimento das ouvidorias: universidades devem celebrar!

Para Cristina Ayoub Riche, ouvidora-geral da UFRJ, órgãos promovem os direitos humanos e dão transparência às instituições

A Organização das Nações Unidas (ONU) reconheceu, em documento recente, o papel ativo para a promoção e defesa dos direitos humanos por parte de instituições de ombudsman no mundo.

Isso significa que os organismos de ombudsman, ouvidorias, defensorías del pueblo, provedorias de justiça e organismos de mediação que atuam na promoção e proteção dos direitos humanos ganharam um reforço institucional muito importante, por evidenciar e estimular suas medidas de protagonismo para a defesa de direitos, para a promoção da boa governança e dos estados democráticos.

O documento publicado pela Assembleia Geral da referida Organização elogia o trabalho dos mediadores e incentiva fortemente os Estados Membros a adotarem diversas medidas, entre elas:

  • considerar a criação ou o fortalecimento de organizações independentes, provedoras de justiça e de instituições mediadoras em nível nacional e, onde aplicável, em nível regional ou local;
  • realizar atividades de conscientização sobre seus papéis e funções;
  • garantir que esses organismos tenham as ferramentas necessárias para o desenvolvimento adequado de suas tarefas, tais como analisar, contribuir para resolver casos de má administração, investigar e comunicar resultados;
  • apoiar as organizações de ombudsman e similares para que tenham exercícios independentes, com mecanismos de promoção e proteção dos direitos humanos, boa governança e respeito pelo Estado de Direito.

A resolução 75/186 é de 16/12/2020, data da reunião da 46ª sessão plenária da Assembleia Geral. Confira aqui a íntegra do documento, em espanhol, uma das seis línguas disponíveis.

Reconhecimento é importante para as ouvidorias universitárias

A pandemia da COVID-19 evidenciou uma crise profunda, multifacetada enfrentada pelo mundo nos dias de hoje, com problemas econômicos, sanitários, sociais e ecológicos que, segundo o físico teórico austríaco Fritjof Capra, não podem ser solucionados isoladamente.

Capra soube articular a física moderna a uma visão holística da vida no planeta e dos fenômenos naturais, inserindo a humanidade e suas ações nos ciclos de transformação da vida na Terra. “Existem problemas sistêmicos que estão interconectados. Para resolvê-los, precisamos pensar sistemicamente. A pandemia só pode ser vencida com medidas de cooperação”, ele afirma.

A pandemia da COVID-19 impactou profundamente a Educação. Nas ouvidorias de universidades e instituições de ensino, foi necessário refletir sobre novas ações que contribuam com gestores e com a comunidade universitária para enfrentarem as consequências desta conjuntura.

No Brasil, o cenário universitário tem milhares de estudantes em condição econômica vulnerável e servidores públicos enfrentando uma realidade que exige esforços hercúleos, inéditos na literatura ou em manuais. O trabalho das universidades públicas e de instituições científicas e de ensino tem sido ininterrupto na luta contra a propagação do coronavírus.

A Red Iberoamericana de Defensorías Universitarias acompanhou os desafios das instituições universitárias nos países ibero-americanos, identificando problemas comuns a diversos países, como a dificuldade socioeconômica de estudantes para terem acesso a aparelhos eletrônicos ou internet de qualidade, os conflitos geracionais que aumentam quando todos precisam conviver num mesmo ambiente, a falta de perspectiva em relação ao mercado de trabalho, o agravamento das questões de gênero, entre outros aspectos.

Entre os nossos vizinhos, as chamadas defensorías universitarias também têm buscado novas formas para lidar com o alto grau de estresse emocional que a sociedade enfrenta. Buscam formas ágeis e criativas para impedir evasão escolar, garantir ambientes saudáveis e acolhedores, pautados pela escuta empática, e o fortalecimento dos direitos humanos e universitários. A atuação em rede tem contribuído para uma visão e atuação sistêmica em relação às demandas cotidianas.

Foto: Raphael Pizzino (Coordcom/UFRJ)

RIdDU: uma iniciativa importante para as universidades

Como resultado da reunião bilateral entre a Conferência Estadual de Defensores Universitários (Cedu) e Rede de Defensores, Procuradores e Chefes de Organismos de Defesa dos Direitos Universitários (Reddu), em junho de 2015, na Universidade Politécnica de Madrid (Espanha), foi celebrado um acordo de colaboração para a criação da Rede Ibero-Americana de Defensores Universitários (RIdDU).

O projeto de criação da RIdDU culminou com sua constituição formal na Reunião de Fundação, organizada pela Universidade Nacional de Córdoba (Argentina), em setembro de 2018. Nessa reunião, foram aprovados os estatutos de funcionamento e a Comissão Executiva encarregada de conduzir o projeto para os dois anos seguintes.

Desde então, a mobilização das ouvidorias (ou defensorías) universitárias tem se fortalecido. Mesmo durante o triste 2020, uma série de reuniões virtuais garantiram a troca de saberes e práticas importantes entre as instituições, inclusive para discutir os direitos universitários durante a pandemia de COVID-19.

Ouvidorias: direito de quarta geração

A ouvidoria pública é um remédio constitucional que contribui para combater a apatia e a abulia social, ao estimular a participação popular, e que, ao mesmo tempo, busca aperfeiçoar e dar efetividade aos serviços que oferece ao público. É um dos meios multiportas de acesso à justiça, que também, a partir de uma demanda individual, pode identificar os gargalos institucionais e propor a adoção de políticas coletivas e difusas.

Considero que ouvidorias devem ser incluídas como direitos de quarta geração, isto é, direitos de solidariedade e de fraternidade, direitos fundamentais que dizem respeito à democracia, à informação certeira que gera conhecimento, à autodeterminação, à defesa e promoção da dignidade humana e ao pluralismo.

Muito oportuno lembrar aqui de Joaquín Herrera Flores: ele nos ensinou que os direitos humanos (incluídos os direitos sociais) não são categorias prévias nem à ação política nem às práticas econômicas. A luta pela dignidade humana é a razão e a consequência da luta pela democracia e pela justiça.

E é exatamente aí que reside a relevância de atuação das ouvidorias públicas, dos organismos de ombudsman e de defensorías del pueblo com um papel muito mais amplo, não só como um instrumento para mitigar a assimetria entre o cidadão e o Estado, mas uma atuação em que os direitos resultem na maior tangibilidade da dignidade humana.

Foto: Acervo Pessoal

*Cristina Ayoub Riche é professora do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas em Direitos Humanos (Nepp-DH) e ouvidora-geral da UFRJ