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Jovens infratores em debate no DH em Tela

O evento Direitos Humanos em Tela, realizado pelo Núcleo de Estudos de Políticas Públicas em Direitos Humanos (Nepp-DH), vinculado ao Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH) da UFRJ, em parceria com o Projeto Oficinas Culturais Cine Degase, exibiu na última quarta-feira (25/06), o curta-metragem Sonhos de futebol, filmado na unidade de interação do Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase).

O filme conta a história de três jogadores de um time de futebol da terceira divisão, que recebem uma falsa proposta: eles deveriam desfalcar o time na final do campeonato para jogar na Europa. Entre os temas retratados pelo curta, estão a corrupção e a gravidez na adolescência. Após a exibição, foi realizado um debate com a participação da professora Vera Malaguti, da Faculdade Direito da Uerj, Vera de Paula, coordenadora geral do Projeto Oficinas Culturais Cine Degase, Leila Ripoll, do projeto Oficinas Culturais e psicanalista do Espaço Brasileiro de Estudos Psicanalíticos (Ebep), e Hebe Signorini, do Instituto de Psicologia (IP) da UFRJ.

Para apresentar a ideia do projeto do Cine Degase, Vera de Paula disse que o objetivo era aproximar os menores infratores do mundo do cinema, com dignidade e respeito. “A gente pensou num projeto que levasse cinema com cidadania para os jovens do Degase”, afirmou.

Já Vera Malaguti abordou a relação entre juventude e prisão. A partir da obra Vigir e punir, do pensador francês Michel Foucault, a docente teceu uma breve explanação sobre a história do cárcere, a partir da Idade Média. “A prisão não nasceu com a natureza. Ela é uma produção política, econômica e cultural”, analisou a professora, segundo quem, o poder punitivo do Estado cresceu significativamente com o avanço do capital. “A prisão faz parte da história do capitalismo”, declarou Malaguti.

A professora da Uerj elogiou a decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos que determinou a libertação de 30 mil presos, no Estado da Califórnia, nos próximos dois anos. “A prisão é utópica. Os princípios que ela prometeu nunca foram cumpridos”, disse, em referência aos ideais de ressocialização e reeducação do detento.  Mais uma vez citando Foucault, Malaguti afirmou que a prisão “serve para reprimir as ilegalidades populares”. Segundo a especialista, “o que a polícia e o sistema judiciário estão punindo é a potencialidade da juventude”, completou. A docente elogiou ainda o projeto do Cine Degase e disse considerar ser necessário produzir mais canais de comunicação entre os presos e a sociedade externa. “Essa relação ‘nós’ e ‘outros’ é o que precisamos desvendar. Esse é um projeto libertário, onde a potência juvenil pode ser usada ao máximo”, resumiu.

Leila Ripoll, psicanalista e colaboradora do “Sonhos de futebol”, afirmou que o foco do curta-metragem é a interação dos jovens com a arte. De acordo com ela, os adolescentes do Degase demonstraram interesse e responsabilidade com o projeto. “Eles resistem à disciplina arbitrária, mas, durante as filmagens, eles foram extremamente dedicados”, recordou. A psicanalista não concorda que os jovens infratores sejam produto da “falta de limites”, como supõe o senso comum. Na opinião da especialista, “os meninos muito cedo percebem os duros limites que a vida lhes impõem”. Leila Ripoll afirmou ainda que o projeto deixou os jovens à vontade e não procurou aplicar nenhum  juízo de valor. “Eles não sabiam que eu era psicanalista. Eu era a ‘moça que conversa’. Isso favoreceu que eles dissessem muitas verdades”, concluiu.