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Mesa-redonda debate a relação entre política e esporte em Cabo Verde e Angola

Na última quarta-feira (02/06), o simpósio internacional “Esporte, Colonialismo e Pós-colonialismo nos países africanos de língua oficial portuguesa”, organizado pelo Fórum de Ciência e Cultura (FCC-UFRJ), em conjunto com o Programa de Pós-graduação em História Comparada do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ (IFCS), a Escola de Educação Física e Desportos (EEFD-UFRJ) e o Ministério dos Esportes, realizou a mesa-redonda “O esporte no período pós-independência: identidade e lutas políticas”, com a presença dos professores Fernando Borges, da Universidade de Santiago, Cabo Verde, Marcelo Bittencourt, do Departamento de História da Universidade Federal Fluminense (UFF), e José Gonçalves, economista e jornalista de origem angolano-brasileira.

Fernando Borges apresentou seu estudo de caso “Futebol no Cabo Verde Moderno”, feito com base em uma pesquisa realizada, com formulários em português, na região de Santiago. A língua, apesar de ser oficial do país, representou uma barreira. “O crioulo é a linguagem do dia-a-dia”, explicou o professor.

A maioria da população local, que totaliza de 500 mil habitantes, é fã de clubes de fora do país, principalmente as agremiações portuguesas. “Isso pode ser explicado, em parte, pela maior visibilidade do campeonato português”, observa Fernando. “Os cinco canais de TV aberta transmitem mais jogos de times portugueses do que o campeonato local”, revela.

Essa escolha, segundo Fernando Borges, pode ser explicada porque a população cabo-verdiana “não tem um nacionalismo clássico, devido à identidade mestiça do povo de Cabo Verde, que procura algo de fora e tenta fazer pontes com outros países”, comenta. Em seguida, o professor exemplifica: “o país faz parte da comunidade de nações francófonas, mesmo sem falar francês”, disse.

Angola

Os professores Marcelo Bittencourt e José Gonçalves dividiram-se na apresentação do caso angolano. Enquanto Bittencourt pesquisou em jornais antigos, dos anos 1950 e 1960, Gonçalves valeu-se de sua experiência de vida e de depoimentos de amigos angolanos para traçar um histórico da relação entre política e esporte no país. Durante as referidas décadas, Portugal adotou um discurso oficial de integração com as colônias, sem distinção entre etnias. Porém, de acordo com Bittencourt, não era bem o que acontecia de fato. “A cor era decisiva nos papéis sociais”, afirmou. Um exemplo de divisão não-expressa oficialmente era a localização de cada grupo social nos estádios angolanos. “Os preços de determinados setores eram incompatíveis com a renda média da população negra”, destacou.

Outro mecanismo esportivo, segundo o palestrante, representativo politicamente são os clubes. “As instituições esportivas reivindicavam maior intercâmbio de jogadores e participação de clubes das colônias nos campeonatos de Portugal”, revela. No entanto, a reivindicação por maior envolvimento da metrópole nas atividades esportivas surte efeito apenas após o início do conflito armado pela Independência do país, em 1975. A partir de então, “o governo colonial se aproxima dos esportes para implementar a ideia de uma nação portuguesa pluricontinental”, elucida Bittencourt.


José Gonçalves revela que, neste período de ditadura colonial, o esporte era uma válvula de escape para a população. “A crítica esportiva era a única a não sofrer com a falta de liberdade e, por isso, ia longe”, afirma o economista. “O ministro dos esportes reclamava de ser o bode expiatório de todas as críticas ao governo”, completa.

Avançando até os dias de hoje, Gonçaçves sublinha a ligação entre os clubes que já venceram o campeonato local e grandes empresas do país. “Somente seis clubes venceram campeonatos angolanos, todos apoiados por grandes organizações, seja a companhia aérea, as forças armadas ou a empresa petrolífera local”, finaliza.