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Fórum de Ciência e Cultura lança “O Espaço Autobiográfico”

 O Fórum de Ciência e Cultura (FCC) da UFRJ promoveu na última quinta-feira (17/06), o lançamento do livro “O Espaço Biográfico – Dilemas da Subjetividade Contemporânea”, de Leonor Arfuch, professora da Universidade de Buenos Aires (UBA). O evento contou também com um debate em que a própria autora esteve presente ao lado do professor Francisco Foot Hardman, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e de Consuelo Lins, professora da Escola de Comunicação (ECO) da UFRJ.

Leonor falou sobre a subjetividade da autoria em uma história e como o ficcional e o autoral muitas vezes se confundem na criação de uma narrativa. A autora citou o exemplo de histórias biográficas de pessoas mortas e desaparecidas contadas por pais e, algumas vezes, até por filhos que mal conheceram seus genitores. “Existe uma necessidade de falar do outro para se entender a própria história”, afirmou.

A maior vítima na perda de grandes histórias e documentação, como aconteceu nas ditaduras militares da América Latina, por exemplo, é a sociedade, que perde parte de sua própria história, e a identidade comum de uma cultura, segundo Leonor. “Mesmo quando há documentação, se confundem memória, imagem e imaginação na narrativa da história. Nunca existe uma narrativa contada de maneira totalmente real, até porque a percepção do real é muito subjetiva”, analisou.   

Para o professor Hardman, existem três cenários que exprimem algumas ideias do livro de Leonor. Os primeiros são os mais de 15 milhões de refugiados no mundo, sendo que mais de um terço deles está longe de seus países há mais de cinco anos. Para o docente, torna-se impossível tratar o espaço biográfico dessas pessoas, quando a própria situação física dificulta a criação de uma subjetividade.

O segundo cenário seria a narração do encontro entre o antropólogo Claude Levi-Strauss com uma tribo indígena no livro Tristes Trópicos (1955), e o choque cultural imenso que ambos sofrem. Segundo Hardman, é nesta narração – especificamente quando uma criança nativa imita o “teatro” de Levi-Strauss ao escrever em seu diário – é que se pode perceber como a escrita surge como fonte de poder na sociedade, pois é com nela “que se pode determinar, impor um ponto de vista. Cria-se um poder histórico”, afirma.

O terceiro e último cenário descrito por Hardman, foi o choro do jogador da Coréia do Norte, Tae-Se na hora da execução do hino nacional. Tae nasceu e foi criado no Japão, mas é filho de mãe norte-coreana. Para o professor, houve uma superexposição da mídia, controlada pela Federação Internacional de Futebol (Fifa) e com grande audiência. “O porquê de ele ter chorado, o que o levou a essa identidade com o país, com essa cultura, mesmo que uma cultura criticada de maneira tão tradicional, é um mistério. E acho que existe um direito ao silêncio e ao mistério que essa imagem trouxe”, completou.        

A professora Consuelo Lins, especialista em Cinema, destacou as semelhanças que tem a questão da narrativa tratada no livro de Leonor com o documentário cinematográfico. Segundo Consuelo, existe uma “crença cega” de que os documentários e as autobiografias são factuais e reais, sem discussão. “As pessoas pensam que só porque são histórias contadas são necessariamente verdadeiras, quando no fundo as pessoas relêem e reinterpretam a própria história de maneiras diferentes”, comentou.

De acordo com a docente, a utilização constante da entrevista para dar credibilidade às histórias também são temas recorrentes, tanto na autobiografia quanto no documentário.“O documentário Jogo de Cena (2007), de Eduardo Coutinho, mostra bem essas problemáticas. Não basta ter uma entrevista, mas tem que saber o que perguntar, o porquê e como perguntar”, concluiu.