Lúcia Ferreira, doutora em Linguística da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio), Ana Paula Goulart e Eduardo Granja Coutinho, ambos professores do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Escola de Comunicação (PPGCOM-ECO) da UFRJ, foram os palestrantes do evento “Comunicação, Cultura e Memória”, realizado na última quarta (17/03), no auditório Professor Manuel Maurício de Albuquerque, do Centro de Filosofia e Ciências Humanas da UFRJ (CFCH). O encontro teve como objetivo o debate interdisciplinar das mídias e sua relevância para a formação do imaginário.
Favela entre muros
De acordo com a linguista e professora do Programa de Pós-Graduação em Memória Social da UniRio, o discurso midiático ajuda a legitimar iniciativas como a política de construção de muros, implementada pelo atual governo do Estado do Rio, seu mais recente objeto de pesquisa. “Os meios de comunicação vieram para assumir o lugar de formadores de memória”, comenta. “Desse modo, se constrói um efeito imaginário de continuidade sobre a memória”, completa.
Para Lúcia Ferreira, a medida, que tem uma premissa de caráter ecológico, foi corroborada pelos grandes veículos de comunicação. “A ideia propagada vincula a construção do muro ao conceito de ordenação. O discurso se faz tão presente que os muros ganharam significação antes mesmo de serem construídos”, analisou.
Quando penso no futuro, não esqueço o meu passado
De forma convergente à fala de Lúcia Ferreira, Eduardo Granja Coutinho estabeleceu um elo entre os interesses das grandes corporações e as posições hegemônicas expostas por meio do discurso jornalístico. “A mídia negocia com os interesses do capital”, afirmou.
De acordo com o docente, o discurso das grandes mídias se apropriaria de signos do passado, esvaziando-os de seus valores históricos. Assim, qualquer elemento, mesmo os nascidos como símbolos de resistência, rebeldia ou crítica, poderia tornar-se produto comercializável. “Basta pensarmos em quanto as editoras lucram com a venda do Manifesto Comunista de Marx todos os anos”, exemplificou.
O docente lembrou ainda a obra do compositor Paulinho da Viola, considerado por ele um “intelectual orgânico” – segundo o conceito gramsciano -, como exemplo de discurso contra-hegemônico. Para Coutinho, o samba é a expressão genuinamente popular, manifestação da cultura como herança viva. “Paulinho da Viola é o próprio guardião da memória da cultura popular”, defendeu, antes de citar como exemplo o trecho da Dança da Solidão, de autoria do poeta. “Quando penso no futuro, não esqueço o meu passado”, recitou.