"As comunicações são o lugar hegemônico central da dominação neoliberal. Por isso, devemos lutar por um sistema midiático mais democrático”, explicou Maria Pia Matta Cerna, presidente da Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc) na América Latina e Caribe, em palestra durante mesa-redonda sobre sustentabilidade, promovida pelo “Seminário Internacional 10 Anos Depois”, no Fórum Social Mundial (FSM).
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Comunicação, um direito humano

"As comunicações são o lugar hegemônico central da dominação neoliberal. Por isso, devemos lutar por um sistema midiático mais democrático”, explicou Maria Pia Matta Cerna, presidente da Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc) na América Latina e Caribe, em palestra durante mesa-redonda sobre sustentabilidade, promovida pelo “Seminário Internacional 10 Anos Depois”, no Fórum Social Mundial (FSM).

De Porto Alegre – “Não é possível falar em sustentabilidade se não tivermos um espaço para debater comunicação. As comunicações são o lugar hegemônico central da dominação neoliberal. Por isso, devemos lutar por um sistema midiático mais democrático”, explicou Maria Pia Matta Cerna, presidente da Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc) na América Latina e Caribe, em sua palestra durante a mesa-redonda sobre sustentabilidade, promovida pelo “Seminário Internacional 10 Anos Depois”, no Fórum Social Mundial (FSM).

Maria Pia cita o recente episódio de derrubada do presidente Manuel Zelaya, em Honduras, como exemplo de interferência dos meios de comunicação contra um governo democraticamente estabelecido. “Há seis meses, houve um golpe de estado em Honduras, onde 98% dos meios de comunicação se juntaram aos interesses de empresas privadas para derrubar o governo. Durante muito tempo, o mundo ficou sem ter notícias do que estava acontecendo no país. Até mesmo as conexões de internet foram cortadas”, diz.

Políticas de comunicação na América Latina

No caso brasileiro, Maria Pia critica os rumos tomados pela Conferência Nacional de Comunicação, realizada em dezembro último, em Brasília. “O Brasil, assim como o Chile, tem uma dívida histórica com a sua política de comunicação que a Conferência não conseguiu pagar”, comenta a dirigente, em uma comparação a seu país de origem. “Na América Latina, vejo o Uruguai como um dos países com uma das melhores legislações de comunicação, pois foi o que conseguiu a melhor harmonia entre os seus atores sociais para o uso do espectro eletromagnético: estado, setor privado e associativo/comunitário”, analisa.

“Na Argentina, o governo Kirchner também tomou uma medida de muita coragem ao enfrentar o monopólio do Clarín”, elogia, em referência à nova lei de comunicações do país vizinho que proibiu uma mesma empresa a possuir canais de TV aberta e a cabo, reduzir de 24 para 10 as concessões de rádio e TV para um mesmo proprietário, além de criar uma entidade supervisora dos meios de comunicação, composta por entidades da sociedade civil e do governo, entre outras medidas.

Para Maria Pia, o mérito desses países tem sido implementar as leis que já existem, baseadas no princípio de que o espectro eletromagnético é um bem público e sua utilização é regulada através de contratos de concessão por tempo determinado. “Se as ferramentas existentes não forem empregadas, não há sustentabilidade. Há grandes anomalias em relação à legislação já existente. O espectro é um bem da humanidade que deve ser repartido. No Brasil, a TV Globo não aceita o debate. É como se apenas os empresários fossem aptos a possuir concessões. Mas há outros atores sociais que também têm esse direito”, afirma.

Rádios Comunitárias

O direito inalienável à comunicação é, para a dirigente, não apenas aplicável aos jornalistas. “Quando uma pessoa transmite uma mensagem através de ondas eletromagnéticas, meios impressos ou digitais, ela está exercendo a sua liberdade de expressão. O discurso que criminaliza as rádios comunitárias fere este princípio”, argumenta. “A rádio comunitária se carateriza não pelo seu tamanho, mas sim pelo seu foco, por serem geridas por atores sociais diversos, representantes de toda a comunidade”, explicou Maria Pia, completando com a defesa por uma legislação que regule a propriedade desses veículos. “Deve haver uma gestão que controle editorialmente essas rádios para evitar o monopólio por parte de igrejas ou partidos políticos e que deixe, mais uma vez, os movimentos sociais de fora”, afirmou.

Direito humano fundamental

Perguntada sobre o perfil conservador dos veículos de comunicação brasileiros que defendem o uso da força em reportagens sobre segurança pública, Maria Pia disse que a tendência não é apenas da imprensa nacional. “Isto se dá em todo o mundo. O sistema midiático é muito conservador. A comunicação também é um direito humano e sem ele não há como garantir os demais. A mídia não é o quarto poder. Deve ser onde se constroem as políticas públicas”, defende.

Instrumento de transformação

A internet é uma possibilidade, mas acaba por reproduzir o modelo dos demais meios, avalia a presidente da Amarc. “A política internacional ainda é pauta dos jornais diários. A briga pelo poder comunicacional ainda se dá pelas rádios, TVs e jornais. Temos que construir uma comunicação contra-hegemônica através de políticas públicas de regulação. A internet pode ser um instrumento de transformação, mas, para isso, ela precisa ser acessível, gratuita e não ser dominada pela publicidade”, conclui.