Categorias
Memória

O “efeito CNN” na idade da Internet

Até algum tempo atrás, quando se queria saber de uma notícia de um conflito distante, recorria-se preferencialmente aos artigos escritos. Isso porque as câmeras de TV ainda eram muito grandes, pesadas e não apresentavam a fineza técnica das atuais. O rádio poderia ser uma solução, mas carecia do sentido da visão. No final das contas, a leitura dos jornais garantiria uma visão mais detalhada do que ocorria em lugares longínquos.

Esse cenário mudou no ano de 1989, com dois eventos que, pela primeira vez na história, foram transmitidos em tempo real para todo o mundo. Falamos da Queda do Muro de Berlim e do Massacre da Praça da Paz Celestial. Ambos foram os eventos propulsores do Cable News Network ou CNN, como é mais conhecido, o primeiro canal inteiramente voltado para notícias, nascido na década de 70.

Em um seminário promovido pela Escola de Comunicação da UFRJ (ECO), Giancarlo Summa, atual diretor do Centro de Informações das Nações Unidas para o Brasil (UnicRio), foi convidado para falar sobre o legado da TV de notícias e sua influência num tempo em que a internet torna as relações cada vez mais ágeis e espontâneas. Segundo ele, as influências da rede hoje são diferentes do que ocorria antes da era da internet – até mesmo por causa do declínio da própria CNN –, mas que, em compensação, o modelo foi readaptado: canais como Fox News ou o brasileiro Globo News são exemplos de que o all news desenvolvido pela CNN persiste. Além disso, o apelo ao imediatismo – inicialmente desenvolvido para a televisão – tendeu a evoluir com a chegada de mídias ainda mais rápidas, como os celulares com câmera, o Twitter e o YouTube. “Nos últimos 25 anos houve uma mudança tecnológica que afetou invariavelmente o jornalismo”, afirma.

Summa diz que tais efeitos têm limites, entretanto. Apesar de poder acelerar o processo de decisões políticas em alguns casos – a cobertura extensiva da Guerra no Vietnã, por exemplo, causou tal mal-estar no povo norte-americano que influenciou a retirada das tropas em abril de 1975, por exemplo –, ele não é capaz de mudar uma estratégia política anteriormente traçada. Um outro problema dessa corrida pela notícia mais “quente” seria a produção de muita informação errada, sem relevância ou mesmo inventada. 

Aliás, essa fluidez da notícia seria um dos pontos indispensáveis a uma guerra. Giancarlo Summa não oculta a hipocrisia da mídia em tempos de conflito. “Esconder a verdade: a face da guerra é esta”, afirma, lembrando o Bombardeio do Mercado de Sarajevo, ocorrido na antiga Iugoslávia, em 1994. O episódio, um dos muitos envolvendo as rivais etnias Croata e Sérvia, foi imediatamente atribuído, pela mídia mundial, como planejado pelos sérvios. Apesar de isso nunca ter sido formalmente comprovado, foi o suficiente para que a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) fosse acionada e colocada em contraposição aos sérvios.

Summa cita a famosa frase de Hiram Johnson: “A primeira vítima quando vem a guerra é a verdade.” Para ele, a questão da guerra acaba sendo de posicionamento, de modo a tornar um dos lados mais justo enquanto o outro faria o papel do monstro a ser derrotado. Neste sentido, a mídia teria papel não apenas como informativa, mas também como possível propagadora de ideias.