“Os dilemas da atenção à saúde mental” foi o tema da palestra conferida por Maria Cristina Ventura Couto, psicóloga do Instituto de Psiquiatria da UFRJ (IPUB), no Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG/UFRJ) na última quinta-feira (20/08). O evento, que ocorreu no Anfiteatro Nobre do IPPMG, faz parte do ciclo de palestras “As quatro estações”, promovido pelo Centro de Estudos Professor José Martinho da Rocha.
A convidada propôs uma abordagem do tema pensando na saúde mental como política pública, e não como campo especializado de atuação. Para ela a visão de criança que atravessou o século XX, de que ela é apenas um ser em desenvolvimento, é incompleta.
“Se tenho dela apenas essa ideia, estou sem condição de tomá-la como alguém que possa portar sofrimento psíquico, enigmas psíquicos subjetivos. Essa noção de criança engendra uma outra de que, se ela tiver algum problema, psíquico principalmente, o que vai ajudar a vê-la é a noção de deficiência”, explica a psicóloga.
De acordo com ela, quando a criança tem algum tipo de problema que se reflete no seu curso de desenvolvimento psíquico, pensa-se ser logo uma deficiência, um transtorno. “A hegemonia da noção de transtorno está mais nos ensurdecendo e cegando do que nos esclarecendo. A noção de transtorno é bacana se soubermos o limite e a potência dessa noção. Não se pode considerar tudo um transtorno”, argumentou Maria Cristina.
Grande parte do século XX foi encoberta pela ideia de que, se uma criança tinha problema, ela estava deficitada. Para esse problema mental eram organizadas respostas pela sociedade e pelo Estado. “Frequentemente se respondia a isso com instituições ou ações de cuidado de cunho eminentemente pedagógico e reparador. Grande parte de instituições de crianças com problema mental era filantrópica. Brilhantes para tratar de um certo problema, mas como lógica eram instituições pedagógicas para tratar de um problema mental”, relata a psicóloga.
Já no final do século passado é que foi admitida a ideia de que uma criança poderia não ser só deficiente mental, poderia também portar um problema mental, sem que esse fosse considerado uma deficiência. “Isso é muito novo no mundo. Recentemente os países de primeiro mundo vêm adotando políticas mais estruturadas de saúde mental”, conta a doutoranda de Psiquiatria e saúde mental do IPUB.
Segundo ela, um dos maiores dilemas enfrentados no país foi incluir o problema da saúde mental de crianças na agenda da saúde pública. A partir de 2001 é que esse problema começou a ser mais abordado. Alguns dos próximos desafios são a formação de recursos humanos e a ampliação da rede de cuidados.