Teve início o processo de escolha dos novos dirigentes da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior, a ANDIFES. A entidade, criada em 23 de maio de 1989, é a representante oficial das 58 instituições federais de ensino superior (IFES) na interlocução com o governo federal, com as entidades representativas de professores, de técnico-administrativos, de estudantes e com a sociedade em geral.
O reitor da UFRJ, Aloisio Teixeira, que figurava como um dos candidatos prováveis à presidência da entidade, lançou um convite aos reitores Alan Barbiero, da Fundação Universidade Federal do Tocantins, e João Carlos Brahm Cousin, da Fundação Universidade Federal do Rio Grande, concorrentes ao cargo: que retirem suas candidaturas e que, juntos, reiniciem o processo pela discussão de propostas para a ação da entidade.
Com o apoio dos demais dirigentes das universidades federais do Rio, Aloisio divulgou a “Carta aos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior”. No documento, ao mesmo tempo em que faz a crítica dos procedimentos adotados para a escolha das diretorias – usualmente construídos à margem do Conselho Pleno da Associação –, o reitor da UFRJ propõe que, antes do lançamento de candidaturas, se busque unitariamente o estabelecimento de um programa comum de ação para a entidade.
“A possibilidade de se construir essa unidade é grande, já que as convergências de opinião são grandes, e eventuais divergências não dizem respeito a questões de princípio que nos oponham”, afirma Aloisio no documento.
A Carta apresenta considerações sobre a conjuntura nacional e o papel da ANDIFES. “Não seria otimismo exagerado dizer que, nessas circunstâncias, o pior da crise, para a economia brasileira, já passou; a condição, no entanto, é que o governo combine em doses adequadas redução de taxa de juros e aumento do gasto público. Se a trajetória futura for essa, o sistema federal de educação superior e sua entidade de representação, a ANDIFES, devem entrar nessa discussão, não apenas por interesse próprio, mas porque isso corresponde ao interesse público.”
O manifesto avalia, ainda, os problemas, dilemas e avanços da política governamental para a educação superior. Destaca a necessidade da adoção de uma perspectiva programática para a ANDIFES, que sirva de referência para as ações da entidade durante os próximos doze meses. Essa pauta “deverá incluir necessariamente o retorno às bandeiras históricas da ANDIFES, a começar pela autonomia, mas entendendo que o momento é de descontinuidade e que não basta repetir o que vem sendo dito e feito nos últimos anos, ainda que a trajetória da entidade nesse período tenha sido coroada de êxito”.
Leia abaixo o documento na íntegra:
CARTA AOS DIRIGENTES DAS INSTITUIÇÕES FEDERAIS DE ENSINO SUPERIOR
Companheiras e companheiros.
A breve intervenção que fiz, em nosso Conselho Pleno de 6 de abril, complementada com o anúncio de minha candidatura à presidência da ANDIFES, no Seminário de 26 de abril e na sessão do Conselho Pleno, no dia seguinte, talvez não tenha sido perfeitamente compreendida. Por isso, retorno ao tema, retirando a oferta de meu nome e convidando os demais candidatos, reitores Alan Barbiero e João Carlos Cousin, a fazerem o mesmo. É possível que, com isso, possamos reiniciar o processo e conduzi-lo por um caminho que atenda aos interesses do conjunto das Instituições Federais de Ensino Superior.
Ao fazê-lo conto com o apoio dos demais dirigentes das instituições localizadas no Estado do Rio de Janeiro, professores Malvina Tuttman, Miguel Badenes, Ricardo Miranda e Roberto Salles.
A intenção, na primeira ocasião, era de tentar mudar os procedimentos usualmente adotados para a escolha de nossas diretorias, que tem ocorrido mediante articulações à margem do Conselho Pleno. É claro que havia — e há —, de minha parte, uma crítica a esses métodos, que excluem a possibilidade de se fazer uma discussão ampla sobre objetivos e metas que cada gestão deve cumprir. Na segunda ocasião, a finalidade de minha intervenção era a de adiantar alguns pontos que poderiam ser incluídos em um programa para os próximos 12 meses. Mas a própria apresentação desses pontos foi entendida como crítica aos encaminhamentos políticos anteriores — o que não era.
O resultado foi que ampliamos o campo das articulações — que adquiram base regional — mas ainda à margem do Conselho Pleno, que é o espaço em que a unidade, com toda a sua diversidade, pode ser construída. Voltemos, portanto, ao início. Sem candidatos. Mas com urgência, pois certamente a expectativa de que pudéssemos realizar duas reuniões para discutir o assunto já está frustrada.
É importante que candidaturas surjam, mas que surjam à base de divergências substantivas sobre programas de ação; e, se for possível construirmos uma candidatura unitária, que o façamos, mesmo que não seja a de nenhum dos três nomes até agora apresentados.
E creio que a possibilidade de se construir essa unidade é grande, já que as convergências de opinião são grandes e eventuais divergências não dizem respeito a questões de princípio que nos oponham. Maior prova disso são as cartas já divulgadas pelos reitores Alan Barbiero e João Carlos Cousin, que, a meu ver, estabelecem bases sobre as quais se pode construir um programa comum de ação para a ANDIFES, para a próxima gestão. Darei aqui minha contribuição.
Comecemos por algumas considerações sobre a conjuntura nacional:
1) Vivemos uma crise econômica mundial de grandes proporções, cujas principais conseqüências têm sido a desvalorização dos ativos financeiros e a contração do crédito, acarretando redução dos fluxos de comércio, queda do movimento de capitais e retração dos níveis de emprego e de atividades econômicas, em todos os países; a probabilidade de que os efeitos dessa crise se prolonguem por alguns anos é alta.
2) O Brasil, obviamente, não ficou imune a ela; no entanto, os próprios equívocos da política econômica adotada até aqui, por paradoxal que possa parecer, acabaram constituindo-se em um ponto de partida favorável para enfrentá-la: é o caso da taxa de juros, que por não ter sido reduzida anteriormente, pode sê-lo agora com efeitos benéficos para toda a economia.
3) Não basta, no entanto, reduzir a taxa de juros e a razão para isso é simples; nas últimas décadas, as empresas que operam no Brasil fizeram uma reestruturação perversa, encerrando linhas de produção menos competitivas, alterando seu mix entre produtos produzidos internamente e revenda de produtos importados e tornando-se grandes aplicadoras no mercado financeiro. Reduzir simplesmente a taxa de juros, nesse momento em que as aplicações financeiras desabaram, significará apenas uma diminuição de seus custos financeiros e utilização desse benefício para recompor as margens de lucro.
4) Para que as empresas privadas voltem a investir, é necessário que o Estado invista antes, abrindo novas oportunidades lucrativas para o capital privado. Além do aumento do investimento público, no entanto, é necessário aumentar o gasto público como um todo, ou seja, custeio, inclusive pessoal, com a finalidade de manter a demanda efetiva em patamares elevados.
5) Não seria otimismo exagerado dizer que, nessas circunstâncias, o pior da crise, para a economia brasileira, já passou; a condição, no entanto, é que o governo combine em doses adequadas redução da taxa de juros e aumento do gasto público.
6) Se a trajetória futura for essa — e o sistema federal de educação superior e sua entidade de representação, a ANDIFES, devem entrar nessa discussão, não apenas por interesse próprio, mas por que isso corresponde ao interesse público — haverá recursos para garantir a continuidade dos programas em curso na universidade brasileira.
7) A conjuntura política é outro elemento a ser examinado. O próximo ano será dominado pela realização das eleições presidenciais; a partir de março todas as atenções estarão para ela voltadas. Qualquer que seja o resultado da eleição trará consigo mudanças nos quadros da administração central. A própria doença da candidata do Presidente Lula, cujo efeito sobre as tendências de voto do eleitorado é imprevisível, agrava essa situação de incerteza.
Vale também uma palavra sobre o que se vem passando na educação superior no país. Sem abdicar das críticas em relação a vários aspectos da ação do governo federal, não há como deixar de reconhecer os avanços realizados no campo da educação superior. Tais avanços, perceptíveis desde os primeiros dias do governo, tomaram forma na gestão do Ministro Tarso Genro e vem-se consolidando na gestão do Ministro Haddad. Alguns pontos podem ser destacados:
a. estabelecimento de um clima de diálogo, imprescindível para que se possa pensar o futuro da universidade brasileira: nenhuma proposta apresentada pelo governo deixou de ser levada ao conhecimento público com antecedência, para que pudesse ser discutida.
b. recuperação dos orçamentos, reduzidos durante o todo o governo anterior; este avanço, vale frisar, é ainda insuficiente —quase diria, será sempre insuficiente.
c. retomada dos concursos públicos para contratação de docentes e criação de novas universidades e novos campi nas universidades existentes.
d. restabelecimento do protagonismo, por parte do sistema público federal de educação superior.
e. proposição de desafios para o sistema federal, mediante o Programa de Reestruturação e Expansão e as modificações no ENEM, para possibilitar sua utilização nos processos de ingresso na educação superior.
Finalmente, algumas palavras sobre o sistema federal de educação superior e sua entidade de representação, a ANDIFES:
1. O sistema federal de educação superior é formado hoje por 58 instituições, que, em seu conjunto, desempenham, papel insubstituível, proporcionando educação integral aos jovens, preparando-os para profissões de nível superior e para o exercício da cidadania, valorizando as múltiplas formas de conhecimento e expressão (técnicas e científicas, artísticas e culturais), refletindo criticamente a sociedade em que vivem e participando do esforço de superação das desigualdades sociais e regionais.
2. Esses objetivos são atingidos através de múltiplas ações, entre as quais se destacam:
– a educação em nível superior — pública, gratuita e universal;
– o trabalho de pesquisa e investigação científica, filosófica e tecnológica, voltado para o desenvolvimento da ciência e da tecnologia e para a criação e difusão da cultura;
– a criação artística;
– a divulgação da cultura e dos conhecimentos científicos e técnicos, que constituem patrimônio da humanidade, através do ensino nos níveis fundamental, médio e superior, de graduação e para graduados, da extensão e da difusão dos resultados da pesquisa, bem como por meio de outras formas de comunicação;
– a formação de cidadãos movidos pelo desejo de aperfeiçoamento cultural e profissional permanente e capazes de contribuir para o desenvolvimento científico e tecnológico, para a criação cultural e para a valorização da ciência, do pensamento reflexivo e crítico e das conquistas da razão humana;
– o estudo dos problemas da sociedade humana como um todo, especialmente os da sociedade brasileira, e a busca de soluções para eles;
– a prestação de serviços especializados à comunidade;
– a contribuição, através de todos os meios à sua disposição, para a formação de uma opinião pública informada acerca dos grandes temas do desenvolvimento científico, tecnológico e cultural e dos desafios enfrentados para a construção de uma sociedade social e ambientalmente justa;
– a extensão, aberta à participação da população, visando à difusão das conquistas e benefícios resultantes da criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica geradas na instituição.
3. As instituições que compõem o sistema federal, no entanto, guardam entre si grandes diferenças e formam um tecido fragmentado e de grande heterogeneidade — nenhuma delas, é bom frisar, isenta de problemas. Poderíamos, com risco de grande simplificação, apontar quatro subconjuntos:
a. Instituições criadas recentemente, com problemas de escassez de recursos financeiros, humanos e materiais para se implantar definitivamente, principalmente as que foram criadas antes do REUNI;
b. Instituições localizadas em regiões distantes dos grandes centros, sofrendo igualmente da escassez de recursos, aqui agravados pelas dificuldades na fixação de pessoal docente e de pesquisa, bem como de constituição de uma infra-estrutura sólida para o desenvolvimento da pesquisa;
c. Instituições antigas e consolidadas, porém de porte menor, que necessitam de apoio e cooperação para garantir a continuidade das linhas em que já adquiriram grau de excelência elevado e avançar em novas áreas do conhecimento;
d. Instituições de maior porte, em geral localizadas nos grandes centros, cujos problemas são de natureza variada e talvez devam ser vistos cada um de per se.
4. Tais diferenças e os problemas que encerram são de natureza estrutural e devem ser corrigidos através de ações conjuntas, a médio e longo prazo, para as quais a cooperação entre as instituições e a ação da ANDIFES são decisivas. Esse aspecto do problema é a base da unidade que podemos e devemos construir.
5. É natural que os dirigentes dessas instituições consagrem seu tempo e suas energias para tentar resolver os problemas que enfrentam; isso não se contrapõe à construção da unidade a que nos propomos.
6. Outras diferenças existem: as que dizem respeito a visões de mundo não coincidentes, a conceitos de universidade divergentes e à natureza substantiva de propostas a serem desenvolvidas. Essas diferenças são bem vindas e devem ser a base de um debate saudável, que pode dar origem a disputas eleitorais.
A combinação desse quadro heterogêneo com os avanços realizados e com a incerteza em relação ao futuro coloca para a ANFIFES um horizonte diferente do que tem vivido nos últimos anos. Os próximos 24 meses exigirão do conjunto dos dirigentes ações firmes para:
§ consolidar as conquistas realizadas, com a construção de um marco institucional que garanta sua continuidade em qualquer governo;
§ estabelecer novas bases de interlocução com o governo que será eleito em 2010.
Para o cumprimento dessas tarefas, que exigirá o comprometimento não apenas dos dirigentes, mas de todo o corpo social das instituições federais de educação superior, as próximas diretorias da ANDIFES devem assumir um papel de protagonismo absoluto no debate da educação superior brasileira.
A pauta para os próximos 12 meses deverá incluir necessariamente o retorno às bandeiras históricas da ANDIFES, a começar pela autonomia, mas entendendo que o momento é de descontinuidade e que não basta repetir o que vem sendo dito e feito nos últimos anos, ainda que a trajetória da entidade nesse período tenha sido coroada de êxito. É preciso estabelecer metas concretas, que reflitam o grau de amadurecimento do sistema e que tenham uma dose de realismo e sentido prático suficiente para que possam ser alcançadas.
AUTONOMIA:
1ª meta: dotação orçamentária sob a forma de orçamento global, liberados em duodécimos mensais.
2ª meta: autorização para remanejar os recursos orçamentários entre rubricas, programas, projetos e categorias de despesas.
3ª meta: revogação da Lei nº 9192, de 21/12/1995, e do Decreto no 1.916, de 23/05/1996, e sua substituição por norma legal que garanta às universidades federais o direito de escolher seus dirigentes, na forma de seus estatutos e regimentos.
4ª meta: retorno das procuradorias às universidades, como procuradorias especiais e com pleno direito de representação judicial e extrajudicial das instituições federais de educação superior, além das atividades de consultoria e assessoramento jurídico.
FINANCIAMENTO:
1ª meta: estabelecimento de regras automáticas para o reajuste da dotação das IFES, com garantia, em simultâneo, de recursos adicionais necessários para a criação de novas instituições;
2ª meta: garantias para o cumprimento da medida, já anunciada pelo MEC, que permita às IFES transferir automaticamente os saldos orçamentários não utilizados em determinado exercício, a crédito de recursos próprios, no exercício seguinte.
3ª meta: garantias para o cumprimento da medida, também já anunciada pelo MEC, que permita incorporar automaticamente a seus orçamentos as receitas próprias auferidas pelas IFES, como crédito suplementar, independentemente de autorização do Congresso.
4ª meta: definição, em regulamento próprio, aprovado nos conselhos superiores das IFES, de normas e procedimentos para a elaboração, execução e controle do orçamento, garantida a prestação pública e anual de contas, previamente submetida à auditoria externa, não só da dotação orçamentária, como da aplicação de todos os seus recursos.
POLÍTICAS DE PESSOAL:
1ª meta: autorização para dimensionar seu quadro de pessoal docente e técnico-administrativo e estabelecer a sua lotação, dentro dos limites estabelecidos em seu orçamento;
2ª meta: autorização para realizar contratações de pessoal em caráter temporário, vinculado a projetos de ensino, pesquisa, extensão e desenvolvimento institucional, nos limites de seu orçamento;
3ª meta: competência para autorizar docentes e pessoal técnico-administrativo a participar de atividades científicas e culturais no exterior, nos termos de seus estatutos e regimentos e dentro dos limites estabelecidos em seu orçamento.
Outra questão que continuará a ocupar o centro das atenções é a dos hospitais universitários. Embora tenhamos avançado na formulação de propostas e na discussão, tanto com o MEC quanto com os Ministérios da Saúde e do Planejamento, ainda estamos distantes de uma solução adequada e definitiva.
HOSPITAIS UNIVERSITÁRIOS:
1ª meta: resolver o problema do pessoal extra-quadro dos hospitais universitários, mediante uma das duas soluções:
– criação de vagas para contratos temporários de trabalho para profissionais de saúde, em número compatível com as necessidades dos hospitais, a serem preenchidas por processos seletivos simplificados;
– instituição da categoria de profissionais de saúde substitutos e criação de uma banco de profissionais de saúde equivalentes, que permita sua permuta por profissionais efetivos, a serem contratados através de concursos públicos.
2ª meta: constituição, em conjunto com o Ministério da Saúde, de um programa de valorização dos hospitais universitários, com recursos para custeio e investimento próprios.
Essas metas correspondem à continuidade e atualização das lutas históricas da ANDIFES e do conjunto, das IFES, não apresentando por isso nenhuma originalidade.
Há, no entanto, algo novo que decorre da implantação do REUNI, desdobrado agora na proposta do novo ENEM. O REUNI elevou os recursos para custeio e para despesas de capital das IFES, associados a projetos de expansão e reestruturação; por outro lado, as possibilidades de democratização e mobilidade que o novo ENEM podem permitir estão a exigir mais recursos para a assistência estudantil.
Os eixos dessas novas ações, que já estão em curso e que também correspondem a lutas históricas da ANDIFES, passam por:
i. Expansão: continuar o processo de expansão, mediante a criação de mais vagas (diurnas, noturnas, interiorizadas…);
ii. Integração: integrar as áreas de conhecimento, não apenas na pesquisa, mas no ensino, principalmente no ensino de graduação;
iii. Flexibilização: promover ampla revisão das estruturas de administração acadêmica e criação de novos itinerários formativos, mobilidade estudantil e reformas curriculares.
iv. Acesso: criar de novas modalidades de ingresso, alternativas e complementares ao vestibular, a partir da iniciativa do MEC, relativa ao novo ENEM.
v. Permanência: desenvolver políticas ativas de cidadania universitária para os estudantes (residência, alimentação, bolsas, laboratórios de informáticas, bibliotecas, espaços de cultura e cidadania etc.)
Todas as instituições federais de ensino superior encontram-se envolvidas em programas com esses conteúdos. No entanto, o REUNI tem uma data definida para encerrar-se e, se isso acontecer, não só não conseguiremos alterar as estatísticas que nos colocam em uma medíocre posição no ranking mundial, em termos de cobertura da população na faixa etária adequada, como arriscamos a ver desperdiçados os esforços já feitos, pela impossibilidade de se dar continuidade a eles.
Urge, portanto, que o REUNI adquira o status de política de Estado, mediante a construção de uma institucionalidade própria que garanta sua continuidade ao longo do tempo. Para isso, devemos elaborar uma proposta de criação de um fundo contábil, com recursos definidos em lei; para ter acesso a esses recursos, as instituições federais de ensino superior deverão apresentar projetos e programas a serem avaliados por um conselho amplamente representativo, que os examinará e julgará, através da avaliação do desempenho acadêmico das entidades proponentes e da pertinência dos projetos às prioridades do país no campo da educação, bem como da ciência, da tecnologia e da cultura.
Além disso, outros mecanismos de apoio financeiro devem ser construídos para permitir a consolidação e desenvolvimento das instituições que enfrentam dificuldades, seja em decorrência de sua localização, seja em decorrência do pouco tempo decorrido desde sua fundação. Tais recursos devem ter origem tanto no MEC quanto no MCT e se destinarão a prover a criação de infra-estruturas de ensino e pesquisa e a fixação do pessoal docente e de pesquisa. A maior integração entre as várias instituições também deve ser um objetivo a alcançar com a consolidação dos mecanismos já existentes e a criação de novos.
Finalmente, há que se estabelecer uma vinculação orgânica entre os diversos níveis da educação nacional, com preponderância e liderança do ensino superior, uma vez que caberá a ele formar os educadores que conduzirão as atividades nos demais níveis. Essa é a forma de se romper com o gargalo existente no ensino médio, que continua sendo o grande obstáculo ao desenvolvimento da educação brasileira. Com isso, estaremos cumprindo o desiderato de Anísio Teixeira, que afirmou, há quase 75 anos atrás: “para haver ensino primário, é necessário que exista antes o secundário, e para que o secundário funcione é preciso que existam universidades”.
TRANSFORMAR O REUNI DE UM PROGRAMA DE GOVERNO EM UMA POLÍTICA DE ESTADO:
1ª meta: criação de um Fundo de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino Superior, destinado a promover a expansão e a reestruturação das instituições federais de ensino superior, bem como a melhorar continuamente suas atividades de ensino, pesquisa e extensão.
2ª meta: estabelecimento, em ação conjunta do MEC e do MCT, de programas e de recursos específicos destinados a apoiar as instituições localizadas em regiões distantes, bem como as de criação recente, em fase de consolidação.
3ª meta: envolvimento orgânico e permanente entre as IFES e o ensino básico público, através da valorização das licenciaturas, de participação das universidades nos processos de avaliação do ensino básico e da criação de programas de capacitação e qualificação continuada, stricto e lato sensu, para os professores da rede pública.
Finalmente, a ANDIFES não pode ausentar-se do debate sobre o papel das Fundações de Apoio. Nem ficar na expectativa das decisões e adaptações a serem feitas pelo MEC e pelo MCT.
Todos sabemos que as fundações são um subproduto do modelo de financiamento adotado no período ditatorial, para permitir transferências de recursos para programas de pós-graduação e pesquisa, desprezando a estrutura convencional das universidades existentes. No entanto, é possível construir um modelo de fundação de apoio, submetida ao controle dos colegiados superiores das universidades e capaz de agilizar processos de gerenciamento de pesquisas, aquisição de equipamentos, construção de infra-estrutura, em benefício do ensino, da pesquisa, da extensão e do desenvolvimento institucional. Não há porque as universidades reproduzirem no seu interior pesadas estruturas para dar conta de atividades que não são compatíveis com suas finalidades; isso encarece desnecessariamente a educação superior.
REFORMAR E FORTALECER AS FUNDAÇÕES DE APOIO:
1ª meta: elaboração de projeto de lei sobre fundações de apoio, mais específico que a legislação anterior, estabelecendo de forma clara e insofismável suas finalidades e possibilidades de atuação, bem como as formas de controle social a que devem estar submetidas.
As propostas aqui contidas não têm a pretensão da originalidade, mas apenas de sistematizar objetivos a serem alcançados nos próximos 12 meses. A ação da entidade nesse período, para ser coroada de êxito, deve potencializar as múltiplas formas que já vêm adotando nos últimos anos:
– contactos com as autoridades federais, particularmente no âmbito dos ministérios da Educação e da Ciência e Tecnologia;
– investidas sobre o Congresso Nacional, formulando projetos de lei que atendam às necessidades do sistema;
– estabelecimento de contatos permanentes com o Poder Judiciário;
– busca de novas formas de atividades conjunta com o Ministério Público, a Controladoria Geral da União e o Tribunal de Contas da União;
– presença permanente nos debates sobre a educação brasileira, principalmente mediante publicação de artigos nos grandes órgãos da imprensa.
– articulação com as demais entidades de representação da comunidade universitária, seja de docentes, de técnico-administrativos e de estudantes.
O debate que ainda podemos fazer, no curto espaço de tempo que nos resta, é o caminho para avançarmos em direção a novas conquistas nos próximos meses, consolidando de forma definitiva o sistema federal de educação superior e estabelecendo um novo ponto de partida em direção ao futuro da educação brasileira.
Estou certo de que essa é a escolha que faremos e que o Conselho Pleno é o espaço adequado para essa discussão.
Saudações universitárias,
Aloísio Teixeira
Reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro