Difícil dizer qual o momento mais comovente da cerimônia de entrega das medalhas Chico Mendes, realizada no último dia 1º, no Salão Nobre do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS). O evento, promovido pelo Grupo Tortura Nunca Mais, marcou os 20 anos do prêmio e homenageou aqueles que sofreram ou combateram a tortura,"> Difícil dizer qual o momento mais comovente da cerimônia de entrega das medalhas Chico Mendes, realizada no último dia 1º, no Salão Nobre do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS). O evento, promovido pelo Grupo Tortura Nunca Mais, marcou os 20 anos do prêmio e homenageou aqueles que sofreram ou combateram a tortura,">
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Cerimônia dos 20 anos da Medalha Chico Mendes é realizada no IFCS

Difícil dizer qual o momento mais comovente da cerimônia de entrega das medalhas Chico Mendes, realizada no último dia 1º, no Salão Nobre do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS). O evento, promovido pelo Grupo Tortura Nunca Mais, marcou os 20 anos do prêmio e homenageou aqueles que sofreram ou combateram a tortura,

Difícil dizer qual o momento mais comovente da cerimônia de entrega das medalhas Chico Mendes, realizada no último dia 1º, no Salão Nobre do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS). O evento, promovido pelo Grupo Tortura Nunca Mais, marcou os 20 anos do prêmio e homenageou aqueles que sofreram ou combateram a tortura, seja nos anos de chumbo do regime militar, seja nos dias atuais de política de extermínio praticada pela polícia de Estado. O encontro foi presidido pela dirigente do Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro, Cecília Coimbra e contou com a presença da diretora do IFCS, Jessie Jane, do secretário nacional dos Direitos Humanos, Paulo Vanucci, entre outros.

O primeiro a receber a homenagem foi o líder do movimento negro Abdias Nascimento, combatente da causa desde a década de 1920. Mesmo amparado por uma cadeira de rodas e com dificuldades na fala, Nascimento lembrou a história do protesto contra a exclusão de negros da Guarda Municipal de São Paulo, sua primeira luta. Desde então batalhou pelos direitos humanos na sociedade civil e como deputado federal e senador, quando criou projetos de políticas públicas de inclusão social. “Poucos hoje sabem dos projetos que criei, mas a história um dia me fará justiça. Espero um dia estar vivo para ver o negro brasileiro ascender até as mais altas instâncias de poder”, disse emocionado.

O cantor, compositor e cineasta Sérgio Ricardo também foi lembrado por sua trajetória de engajamento. Conhecido do grande público por quebrar o seu violão e atirá-lo contra a platéia, quando classificou a canção “Beto Bom de Bola” para as finais da competição e ser impedido de executá-la pelas vaias do público. Sérgio Ricardo também dirigiu filmes de temática social e compôs trilhas sonoras para o cinema, durante o período do Cinema Novo. É ele quem assina as composições de “Deus e o Diabo na Terra do Sol”, clássico de Glauber Rocha e o roteiro musical de “O auto da compadecida”, de Ariano Suassuna.  “Quero dizer que em uma época em que estavam surgindo Gil, Caetano, Chico e outros, meu santo de devoção sempre foi Sérgio Ricardo”, disse Paulo Vanucci. “Eu talvez seja o mais sortudo dos esquerdistas aqui presentes porque não fui preso. Mas tive os meus melhores amigos mortos e torturados pelo regime militar”, afirmou o artista.

O discurso mais inflamado e repleto de indignação foi o de Márcia Oliveira Jacintho. Em 2002, ela teve o seu filho Hanry, de 16 anos, executado por policiais militares que ocupavam o Morro do Gambá, em Lins de Vasconcelos. O comando da operação alegou que o jovem fazia parte de uma quadrilha de traficantes, mas as análises de balística e de corpo de delito comprovaram que o tiro havia sido à queima roupa e em trajetória descendente, algumas das características de uma execução. 

Apesar do medo, Márcia iniciou as investigações por conta própria, munida de gravador e máquina fotográfica, concluiu o ensino médio e a Faculdade de Direito e conseguiu comprovar o dolo dos policiais. Dois deles foram condenados a penas de 9 e 3 anos de prisão. “Aqueles que tem a obrigação de zelar pelas vidas de nossos filhos, torturam e matam. O secretário de Segurança Pública disse que as mulheres da favela geram criminosos em seus ventres. Eu quero dizer que lá também há mães que criam seus filhos com muito carinho e amor. E, independente de ser traficante ou não, a polícia não tem o direito de matar ninguém. Mas eu vou continuar lutando para que outras mães não sofram o mesmo que eu, pois não tenho medo de morrer. Metade de mim já foi enterrada junto com meu filho”, desabafou.