Pioneiro na adoção de células da mucosa olfativa em pesquisas com células-tronco, o neurocirurgião português Carlos Lima apresentou ontem (24/3), no auditório Rodolpho Paulo Rocco, no Centro de Ciências da Saúde da UFRJ (CCS/UFRJ), as principais características da nova técnica que possibilita a retirada de material do próprio paciente, e não de fetos. A palestra atraiu, além de especialistas na área, grande número de portadores de deficiência por lesão medular ávidos por novidades para recuperação de movimentos.
O médico do Hospital Egas Moniz, de Lisboa, desenvolve o trabalho com células adultas desde 2001 e explicou durante a palestra que para a recuperação de movimentos é necessário não só o restabelecimento das conexões neurológicas, mas também um prolongado trabalho de fisioterapia. “É um processo que leva muito tempo e deve ser complementado por fisioterapia contínua, intensa e a longo termo. Não acredito que de um dia para o outro você pode ter (andando) uma pessoa que ficou meses ou anos com os músculos parados, com o sistema nervoso inativo”, afirmou ele.
Durante 45 minutos, o neurocirurgião, por meio de gráficos, vídeos e imagens, explicou como é o processo de recuperação de pessoas que ficaram paralisadas após sofrerem lesão na medula. Crítico das pesquisas com células embrionárias, ele acredita que é preciso “focalizar a nossa atenção naquilo que sabemos que tem potencial. Acho que é perder energia, dinheiro, e podem causar sofrimento alternativas que o próprio bom senso nos diz que não são naturais, que são contra a natureza”, diz ele se referindo às pesquisas realizadas com embriões, que trazem problemas éticos.
Para Carlos Lima, há uma verdadeira panaceia em torno do assunto “células-tronco”, como se elas pudessem resolver qualquer problema ou curar qualquer doença de forma fácil. No entanto, ele reconhece e vê de forma positiva que o tema reacendeu o interesse da sociedade pela ciência. “As células-tronco não vão conseguir lutar contra a passagem inexorável do tempo. É uma limitação sobre a qual temos de estar conscientes”, disse.
Ao esclarecer que o cérebro ensina ao longo do tempo como o corpo deve se comportar, ele revelou que não faz sentido buscar uma recuperação após prolongado período de inatividade ou em idade avançada, para frustração de muitos. Segundo ele, quanto mais rápida for iniciada a recuperação, com uma técnica diferenciada de marcha que dispensa até bandagens, maiores as chances de sucesso.
Ao final da palestra, Carlos Lima passou por uma sabatina do público. Embora 125 operações tenham sido realizadas com diferentes graus de recuperação dos pacientes, os especialistas na área buscavam comprovações científicas do resultado do trabalho desenvolvido pelo neurocirurgião português, enquanto os portadores de deficiência queriam saber quando a técnica começaria a ser adotada no Brasil, o que deve acontecer até o fim do ano, segundo representantes da ONG Novo Ser (www.novoser.irg.br), que participaram do evento.
Em resposta, Carlos Lima explicou que existem dados parciais da terapia disponíveis na internet, mas que outros ainda precisavam ser coletados e analisados antes de serem divulgados, o que demanda recursos vultosos. Antes de concluir, porém, o neurocirurgião frisou as dificuldades para o desenvolvimento do trabalho até o estágio atual e o quanto diversos interesses econômicos são contrariados ao longo da trajetória.