Categorias
Memória

Adib Jatene faz retrospectiva da Saúde no Brasil

 A 7ª Conferência Carlos Chagas Filho ocorreu na última quarta-feira (22/10), no auditório do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho (IBCCF), com vídeo-conferência para o auditório do Bezão, localizado no Centro de Ciências da Saúde (CCS). A comunidade acadêmica compareceu em peso para prestigiar o ilustre convidado desta edição, Adib Jatene, ex-ministro da Saúde e professor emérito da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).

Tânia Ortiga, coordenadora de Extensão do IBCCF, foi responsável pela abertura do evento: “Estamos numa conferência que ocorre anualmente em homenagem ao fundador do Instituto de Biofísica. Este ano, em especial, o encontro encerra a participação do Instituto na Semana Nacional de Ciência e Tecnologia”.

Em seguida, Olaf Malm, diretor do IBCCF, falou sobre o sucesso do evento “Descobrindo a biofísica” e de planos para o futuro: “Temos o objetivo de criar um acervo de documentos de cada laboratório do Instituto de Biofísica”. Para apresentar o palestrante, o diretor convidou Antônio Paes de Carvalho, pesquisador do IBCCF, que declarou: “O Adib é uma pessoa de extraordinárias realizações. Ele olha o problema, analisa, resolve em sua cabeça e já parte para a solução prática. Tem uma enorme história como cirurgião cardíaco, trabalhou no Brasil e desenvolveu grandes inovações e equipamentos”.

Adib Jatene iniciou seu discurso propondo uma revisão no panorama da Saúde no Brasil. Ele relembrou a situação em que a Igreja Católica reconheceu a morte cerebral como o momento exato da morte de fato, na época em que Carlos Chagas filho era diretor da Academia Pontifícia de Ciências. “Foi um seminário com duração de dois dias que contou com trinta participantes. Dentre eles, apenas dois brasileiros. Eu estava lá”, apontou o ex-ministro.

– Iniciei a Faculdade de Medicina em 1941, portanto, venho participando de uma evolução da área de saúde há 60 anos. Naquela época, era um setor bastante limitado – observa Adib. De acordo com ele, a partir de 1961, ocorreram importantes modificações no país, como a transição democrata, epidemiológica e tecnológica. Posteriormente, com Juscelino Kubitschek na presidência, o Brasil ingressou na Revolução Industrial, o que resultou em migrações de zonas rurais para urbanas.

Adib Jatene relatou que nas áreas em que se instalava a população vinda do campo não havia a infraestrutura necessária para saneamento, habitação, segurança e transporte. “A água era obtida por cisternas que conviviam com fossas sépticas, o que era responsável por uma mortalidade infantil significativa”, aponta o professor.

Ele indicou a necessidade das indústrias oferecerem assistência médica aos seus trabalhadores nesta época, o que marcou o início dos planos de saúde. “Existiam poucos aposentados, por isso havia uma sobra de recursos, utilizada inclusive em grandes obras, principalmente na área de saúde. Como o Rio de Janeiro era a capital federal e como os principais institutos estavam aqui, começaram a ser construídos os grandes hospitais da previdência. Foi quando se tentou buscar um atendimento a toda a população”, explica Jatene.

No período seguinte, que ele considera de 68 a 88, esta busca se intensificou. Porém, Adib acredita que ocorreram dois problemas: a unificação dos institutos de previdência, e a revolução, que tirou da estrutura do serviço público os cargos de maior destaque e melhor remunerados, antes selecionados por concursos. “Daí por diante todo o sistema passou a ser o da confiança, de livre profissão. Os novos ocupantes não eram da área médica, não conheciam os problemas e não tinham colaboração dos que ficaram proibidos de ascender a tais cargos. Isto significou que substituímos a meritocracia pela barganha política”, conclui o ex-ministro.

Nesta época houve a criação das disciplinas de medicina social e preventiva, com objetivo de fazer com que a atenção fosse dada não apenas aos doentes, mas à comunidade como um todo. “Quando começou a se criar os conjuntos habitacionais, eu era Secretário da Saúde do Estado de São Paulo. Quis montar um posto de saúde para atender a um deles, destinado a vacinar crianças, mas não foi possível. Isto me fez classificar estes conjuntos como imobiliários e não populacionais, pois não apresentavam os elementos necessários à vida saudável dos indivíduos”, constata Adib.

Jatene considera fundamental o atendimento tanto à comunidade como um todo quanto ao indivíduo. “Quando alguém numa família está doente, as pessoas ficam aflitas, angustiadas, com medo, precisam ser atendidas e receber atenção. Eu digo sempre que o oposto do medo não é a coragem, é a fé. É preciso acreditar”, aconselhou Adib, emocionando a platéia.

Em 1981, ocorreu a VIII Conferência Nacional de Saúde, em Brasília, com forte participação popular. O relatório proveniente do encontro serviu de base ao capítulo de saúde da Constituição. “Estávamos caminhando no sentido de estabelecer um novo modelo do sistema de Saúde”, indica o professor. Em 1988, com a Constituinte, ficou estabelecido no artigo 196 que saúde era um direito do cidadão e dever do Estado, precisava ser oferecida com integralidade ao nível municipal, com participação social. “Discutiu-se muito se o país agüentaria ou não realizar um atendimento desta dimensão. Acredito que os problemas que enfrentamos no setor de Saúde são pela falta de recursos, e não por deficiência na gestão, causa citada pela maioria das pessoas”, conclui Adib.