Categorias
Memória

Exigências no setor elétrico

 Diante das discussões constantemente presentes na mídia a respeito do petróleo, exploração do pré-sal e uso de energia elétrica, A IX Semana de Geofísica, organizada pela professora Paula Ferrucio do departamento de Geologia da UFRJ e pela Sociedade Brasileira de Geofísica (SBGF), aborda o papel da geologia e da geofísica na geração de energia elétrica. A abertura ocorreu no Salão Nobre do Centro de Ciências Matemáticas e da Natureza (CCMN) e reuniu a professora Ângela Rocha, decana do Centro; professor Antônio Abel Gonzalez, vice-reitor da Universidade Estadual do Norte Fluminense; Francisco Dourado, diretor de Geologia do departamento de Recursos Minerais (DRM), dentre outras personalidades.

De acordo com Paula Ferrucio, o objetivo do evento é apresentar, aos alunos de graduação e pós-graduação, o que está sendo feito no âmbito da geologia: “Cada semana tem um tema e este ano será sobre energia elétrica. A idéia surgiu do fato de que a geologia está presente na base dos processos de geração de energia, uma vez que quem descobre as reservas de petróleo, urânio, carvão e ferro são os profissionais da geologia, e toda a parte de elétrica estruturada usando hidroelétrica precisa dessa ciência. Esse evento é importante porque trazemos o mundo de fora para o ambiente acadêmico”.

Esteve presente, ainda, Adilson de Oliveira, professor do Instituto de Economia (IE/UFRJ), para proferir a palestra “Mercado Elétrico: É preciso avançar” um breve histórico sobre o uso da energia elétrica no país e perspectivas futuras.

Adilson de Oliveira traçou, durante a palestra, o perfil do mercado atacadista brasileiro: “O Brasil tem forte incerteza quanto ao comportamento da demanda: a oferta é condicionada pela hidrologia, ou seja, a energia elétrica depende basicamente do regime de chuvas; e pertencemos a um país com diversidade de situações regionais. Em certas regiões não há mais como construir centrais, como já está se tornando o caso do Sudeste, mas em outras, como a Amazônia, isso é viável. Acredito que a demanda pela geofísica seja grande nos próximos anos“.

O palestrante informou que a necessidade de se ter reservatórios para períodos de baixa pluviosidade, aliada aos danos ambientais e sociais gerados pelos reservatórios hidroelétricos, levou à criação de reservatórios térmicos para funcionar nos meses de inverno, o que exige novos combustíveis, como carvão mineral, para geração de energia.

Para Francisco Dourado, diretor do DRM, o grande problema do Brasil está na falta de planejamento. “Nosso país não pensa a longo prazo, no futuro. Não sabemos ainda que tipo de minerais podem ser encontrados porque nunca houve um programa perspectivo nessa área”.

Adilson de Oliveira acredita que a demanda a curto prazo será principalmente de Petróleo, mas salientou a importância do carvão mineral e da geração nuclear: “O mundo não é estático, está em constante transformação. Amanhã é o petróleo, mas a longo prazo pode ser que outras fontes de energia sejam necessárias, entre elas o carvão mineral e a possibilidade de geração de energia nuclear”.

Ao analisar o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o palestrante informou que a gestão de riscos impetrada por ele foi baseada na descentralização parcial, com custos e benefícios embutidos nos preços dos contratos, e que culminaram no racionamento energético: “Isso evidencia a ineficiência da gestão de riscos. Ter necessidade de fazer um racionamento indica a vulnerabilidade hidrológica do país. Não se tratou apenas de má administração, mas as próprias regras foram mal formuladas”.

Para o professor, o atual governo do Presidente Lula entendeu a necessidade de se lançar um olhar a longo prazo. Foi criado o conceito de energia nova, segundo a qual, a partir de 2002, aquele que construir centrais obtém a garantia de que a sua energia vai chegar ao mercado com preço pré-fixado por 15 anos, reservando, para a energia velha, aquilo a que a nova não puder atender.

Ao final da palestra, Adilson de Oliveira levantou a necessidade de se ter um avanço no setor elétrico e se manifestou acerca da possibilidade de um novo racionamento: “Para avançarmos é preciso segmentar a gestão de riscos através da criação de níveis mínimos para os reservatórios em novembro e disponibilidade mínima de gás natural para geração de energia térmica, o que o governo já tem feito. Não acredito que haja como faltar energia, se as regras do atual governo forem mantidas. Mas é preciso que se acabe com o conceito de energia nova e velha, de forma que os preços possam ser equalizados. Precisamos preservar a gestão centralizada do risco de racionamento, mas descentralizar a gestão de riscos de mercado.

A Semana de Geofísica segue até o dia 5 de setembro, com as palestras “Gás natural” e “O petróleo, a Petrobrás e os Desafios”, proferidas, respectivamente, por Marcelo Murta e Sylvia Anjos, ambos da Petrobrás. Na quinta-feira, dia 4, ocorre a divulgação do livro “Sal – Geologia Tectônica”, de Sylvia Anjos, que aborda de forma didática os princípios de disposição dos elementos nas bacias sedimentares.
 
Evolução do Setor Elétrico

De acordo com o palestrante, o setor energético, em particular, está passando por mudanças já há algum tempo. No período pós-guerra, conhecido como época de ouro do setor elétrico, foram construídas centrais maiores, que possibilitaram que, com o mesmo investimento, mais pessoas fossem atendidas e os custos reduzidos. Havia, por volta da década de 50, o que se chamava de política de financiamento doce, que consistia no oferecimento de baixas taxas de juros pelos governos, o que contribuiu para o crescimento do setor elétrico e a oferta abundante de energia barata.

Após o crescimento começaram a surgir algumas críticas teóricas quanto ao repasse de custos operacionais: a capacidade ociosa de energia, empresas com tendência a formar alianças com fornecedores e construir sempre o mesmo tipo de central (conservadorismo) e  capacidade dos monopólios de induzir o governo a lhes ser útil. Segundo Adilson de Oliveira, a melhor solução encontrada foi estimular a concorrência.

Na década de 80, o Estado brasileiro entrou em dificuldades financeiras, época de contenção tarifária, e diversas obras foram paralisadas, o que levou a outros problemas tais como a necessidade de que fossem construídas mini-centrais de forma a reduzir os impactos ambientais e de definir outros mecanismos de gestão de riscos.

A reforma setorial trouxe a concorrência como forma de redução dos custos, além da idéia de que as pessoas usam a energia diferentemente umas das outras e que o mercado é capaz de gerir riscos mais eficientemente do que o sistema monopolista.