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Sustentabilidade dialoga com arquitetura em aula inaugural

José Filgueira Lima realiza aula inaugural na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ e afirma "o arquititeto hoje precisa ser uma espécie de coordenador de equipe, para integrar conhecimentos".

 Foto: Marco Fernandes
 "Lelé": a era do arquiteto  que
    projeta solitário acabou".

"Sempre que acabamos um trabalho, sentimos que ele deixou muito a desejar”, afirmou Lelé, ou melhor, o arquiteto José Filgueiras Lima, em entrevista após a realização da aula inaugural da Faculdade de Arquitetura. Pode parecer um contrasenso, enunciado aos 76 anos de idade e mais de 50 de vida profissional que logrou obras espalhadas por todo o Brasil. Não é. Revela o perfil de um homem que gosta de trabalhar em equipe e  zela pelo aperfeiçoamento constante de seus projetos, fruto de uma olhar crítico que lhe instiga a procurar soluções tecnológicas, a manter-se jovem a partir do conhecimento.

Fazer dos erros e falhas um aprendizado. Esse, talvez, o recado subjacente da aula inaugural, que lotou o Salão Azul do prédio da reitoria, reunindo na manhã do dia 25, mais de 300 pessoas entre estudantes e professores.

Na companhia do professor Gustavo Rocha Peixoto, Diretor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ, Lelé exibiu e comentou um vasto elenco de imagens que revelavam diversas etapas de obras, boa parte realizadas pelo Centro de Tecnologia da Rede Sarah (CTRS), entidade de natureza pública fundada em 1990. Com a responsabilidade de implantar hospitais dedicados ao atendimento de vítimas de  politraumatismos e problemas locomotores, objetivando sua reabilitação, o CTRS é mantido com recursos do governo federal  e tem na equipe gerenciada por Lelé um de seus principais  arquitetos. Ele demonstrou soluções arquitetônicas utilizadas nos hospitais da rede , em capitais como Belém, Belo Horizonte, Macapá,  Salvador, São Luís do Maranhão e Rio de Janeiro, que brevemente será inaugurado no bairro de Jacarepaguá.

O conceito de sustentabilidade desde sempre fez parte da implementação dessas obras, onde Lelé procura, por exemplo, aproveitar ao máximo a luz e a ventilação natural, reduzindo o uso ar condicionado e de iluminação artificial. As vantagens desse aproveitamento racional do meio ambiente local são evidentes: “ Em nosso hospital de Salvador, o custo mensal de energia é de 80 mil reais. Se ele tivesse ar condicionado e  luz elétrica ao longo de todo o dia, o custo seria da ordem de 500 mil” , destaca Lelé.

Indagado sobre a importação de padrões de arquitetura projetados no exterior, Lelé cita outro exemplo da capital baiana. Trata-se dos abrigos para usuário de ônibus, que em Salvador deveriam assegurar sombra e passagem de vento. “Acontece que importaram um desenho, muito bonito por sinal, de Richard Meyer, porém, feito para o clima de Nova York, que dispõe de um vidro por trás. Então, as pessoas, ao invés de ficarem na frente do abrigo, ficam atrás, por ser mais fresco”.
Para ele “a globalização utilizada dessa forma, leva a uma imitação do que se faz de melhor no mundo “civilizado”, traduzindo, por vezes, em grandes equívocos”.

Feliz por partilhar com muitos jovens suas idéias, a aula inaugural da FAU se deu em meio a um curso de três dias ministrado por Lelé, denominado: “Tecnologia a Serviço da Arquitetura”, que termina nesta quinta-feira.

Carioca, José Filgueiras formou-se arquiteto em 1955 pela Escola de Belas

 Foto: Marco Fernandes

Artes, da qual desmembrou-se a Faculdade Nacional de Arquitetura, da então Universidade do Brasil, hoje UFRJ. Sua carreira teve início durante a construção de Brasília, onde atuou como protagonista do nascimento da capital federal, construindo, projetando e colaborando com Oscar Niemeyer. Trabalhou na implantação da Universidade de Brasília (UnB), junto à  equipe do Centro de Planejamento da UnB, período (1962) em que iniciou sua pesquisa teórico-experimental sobre elementos pré-fabricados, desenvolvida ao longo de toda sua trajetória profissional.

Apelidado de Lelé, por conta de jogos de futebol, José Filgueiras Lima diz que a figura romântica do arquiteto trabalhando solitariamente em seus projetos acabou: “ O caminho para todas as profissões é a integração. Eu vejo o arquiteto como uma espécie de coordenador de equipe, que tem de integrar diversos saberes e inovações tecnológicas”, sentenciou.