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Escola de Comunicação da UFRJ discute a política das mídias

 A Escola de Comunicação da UFRJ – ECO realizou nessa terça-feira, dia 30 de outubro, a palestra sobre as situações midiáticas nos cenários nacional e mundial, proferida por Gustavo Gindre, jornalista e coordenador geral do Instituto de Estudos e Projetos em Comunicação e Cultura – INDECS. O palestrante abordou a temática física e teórica das novas tecnologias de comunicação, apoiado em inúmeros dados estatísticos sobre a distribuição informacional no território brasileiro e na política internacional.

Concentração como determinante da informação
Gindre comentou que a cidade do Rio de Janeiro é um espaço privilegiado para estudar a concentração extrema dos meios de comunicação no poder de pequena parcela da população: “Não é nenhuma novidade”, completou. Segundo o coordenador, poucos lugares possuem os dois jornais mais vendidos, o canal de televisão aberta mais assistido, as rádios FM e AM mais ouvidas, uma empresa de TV a cabo e outra via satélite, os principais provedores de acesso à Internet banda-larga, a terceira revista mais lida, sob a égide de apenas uma empresa de comunicação; “no caso a Rede Globo, que possui um monopólio da informação brutal, que se repete pela afiliadas em todo o país, somado ao conchavo político mantido pelos coronelismos locais”, observou o jornalista.

Gustavo Gindre lembrou que o Brasil está vinculado a esse mesmo cenário de concentração em escala mundial. Segundo ele, por trás de concessões de canais de comunicação e de conceitos diferentes existe apenas um dono, que concentra praticamente toda a produção de conteúdo: “Somente a Time Warner detém uma mega produtora de cinematográfica, o provedor de Internet AOL, gravadora, canal em TV paga, rede de cinemas nos Estados Unidos, entre outros”, declarou. Para o palestrante O objetivo de quem detém todo esse conjunto, é possuir tal vantagem sempre mantendo o circuito informacional dentro do mesmo grupo econômico, o se revela altamente lucrativo: “Esses grandes grupos acabam por engolir os pequenos que não têm estrutura para se manter na disputa”, disse Gindre.

Telecomunicações: elas estão chegando
O jornalista ressaltou que a nova tendência preocupante é a entrada de operadoras de telecomunicação no campo da mídia. Segundo Gustavo Gindre, Esse segundo momento de concentração já ocorre em outros países e está iniciando do Brasil: “Obviamente, elas começaram a invadir o cenário de mídia, já que é muito interessante, para quem possui a rede, que as pessoas estejam acessando um conteúdo próprio da empresa”, comentou. Outro problema, de acordo com o palestrante, está em as operadoras de telecomunicações faturarem muito mais do que os grupos de mídia. Gindre destacou que dentre as quatro grandes operadoras de telefonia fixa no Brasil — Telemar, Brasil Telecom, Embratel e Telefônica — A menor, Brasil Telecom, faturou no primeiro semestre de 2006 mais do que todas as emissoras de rádio e televisão faturaram juntas em todo o mesmo ano.

O jornalista explicou que o limite de capital estrangeiro exclusivamente para TV a cabo é de 49% teoricamente, mas na prática é ultrapassado; outra exigência é que empresas de telecomunicações podem ter apenas uma TV a cabo na cidade, sendo que a preferência ainda é das demais empresas interessadas: “Isso valia até semana passada, quando a Anatel, em ato simbólico, permitiu que a Embratel comprasse uma pequena operadora de TV a cabo em Minas Gerais, a Way TV”, disse Gindre. Segundo ele significa que a Anatel acabou de liberar a compra de TVs a cabo para as operadoras de telecomunicação: “Essa nova permissão tende a gerar ‘gigantes’ ainda maiores do que os já existentes no país”, avisou o palestrante. Também está em discussão, de acordo com o coodenador, uma proposta para unificar toda a legislação de TV paga no Brasil, o que certamente eliminará o limite de capital estrangeiro.

Distribuição ratifica as classes sociais
No Brasil, a desigualdade no campo da comunicação é extremamente estratificada. Gustavo Gindre afirmou que somente 16 milhões de indivíduos, dos mais de 180 milhões, possuem TV paga em suas residências, ou seja, um em dez brasileiros têm TV paga. O CD mais vendido do Brasil em 2006 atingiu 0,5% dos brasileiros. O cinco maiores jornais — O Globo, Folha de São Paulo, Extra, Estadão e Zero Hora — somados vendem por dia o equivalente a 0,7% da população. As três revistas mais lidas — Veja, Época, Isto é — vendem 1,01% em um dia. Quanto ao mercado de livros, 55% são didáticos ou escolares. As salas de cinema só existem em 10% das cidades brasileiras; e nos últimos 13 anos somente 16 filmes nacionais ultrapassaram a barreira de 1% de espectadores: “Ou seja, o brasileiro médio não compra CD, nem livro, não vai ao cinema, não lê jornal, nem revista. Existe um imenso universo de pessoas que parecem viver em outro mundo, tamanha a exclusão”, lamentou Gindre.

Segundo o jornalista os únicos meios que conseguem extrapolar esse limite são a radiodifusão — rádio e TV — e a Internet, mais recentemente. Quanto à televisão, o palestrante afirmou que Rede Globo vem amargando o ano de 2007 com menos de 50% dos aparelhos ligados no canal. Mas, ainda assim, significa muito para a Globo ter cerca de 47% dos aparelhos a seu favor, sendo que 93% da população possui TV em casa, segundo o IBGE. O coordenador comentou que a novidade da última década foi a ultrapassagem do rádio pela televisão em termos de audiência, mesmo com a portabilidade do primeiro. Já a Internet, possui um pouco mais de 10%, mesmo sendo o Brasil campeão da exclusão digital. Atualmente, estima-se que apenas 20% dos lares, segundo o jornalista, tenham Internet e somente 300 cidades do país possuem acesso à banda-larga: “Um grande impasse é o preço elevado da contratação desse serviço, pior ainda é que nem todos que estão dispostos a investir têm acesso infraestrutural, mesmo dentro das cidades que comportam as operadoras”, declarou Gustavo Gindre. Segundo ele, nos chamados “não-lugares” — geralmente as periferias, a desigualdade acaba se internalizando e se torna natural para a sociedade.

Legislação
A legislação para os meios de comunicação no Brasil, de acordo com o palestrante, é absolutamente caótica. A regulamentação da TV e do rádio é a mesma desde 1962. Gindre explicou que a lei não é alterada por que há um enorme jogo de interesses entre o governo e os meios: “Quando tentaram mudar, 52 vetos do Presidente da República foram derrubados nas votações do Congresso Nacional”, contou o jornalista.

Para o coordenador, a legislação comunicacional brasileira deveria ter uma série de medidas que já são consolidadas no restante do mundo, como a obrigatoriedade da contratação de produções independentes, que na Espanha é exigida inclusive em dialeto local: “No Brasil a diversidade é vista como problema e se traduz em, por exemplo, uma equipe de fonaudiólogos da Globo requisitados para eliminar os sotaques de repórteres das emissoras afiliadas pelo país”, observou Gustavo Gindre.

Segundo ele, a lei para comunicação brasileira não tem limite de propriedade, visto que a única disposição legal sobre esse caso é que não pode haver cinco emissoras no mesmo nome, o que não impede que famílias como a Marinho, a Sarney, a Magalhães dominem grande parte das transmissões do país. De acordo com o palestrante, a Constituição de 1988 até hoje não foi regulamentada para a comunicação, porém ela ratifica a proibição dos monopólios e oligopólios, a produção independente obrigatória e prevê, inclusive, a criação de três sistemas de comunicação um estatal, um privado e um terceiro de prestação de serviços. “Porém, somente o Conselho de Comunicação Social se efetivou na constituinte”, lamentou Gindre.

O jornalista não mediu esforços em afirmar que o Brasil caminha na contramão da convergência de mídias, visto que em 1997 o presidente Fernando Henrique dividiu a lei da comunicação entre operadoras de telecomunicação e radiodifusão. Segundo o coordenador, para o cenário da convergência a lei de 1962 não serve mais: “A questão é: quais as leis que podemos implementar para que a disseminação da comunicação seja mais democrática?”, questionou Gindre. Para ele, deve-se, sobretudo, garantir infra-estrutura e qualidade com preços reduzidos: “Devemos nos perguntar se deve se respeitar ou não o princípio de neutralidade da rede, visto o poderio dos provedores de Internet no monitoramento dos dados enviados postos em rede”, concluiu Gustavo Gindre.