Foto: Marco Fernandes |
Oswaldo Alves apresenta novidades conquistadas pela comunidade científica a partir da manipulação nanométrica. |
A fim de dar continuidade a série de conferências a respeito da Nanotecnologia, a Coordenação de Programas de Estudos Avançados da Universidade Federal do Rio de Janeiro (COPEA/UFRJ) convidou Oswaldo Luis Alves, da UNICAMP, diretor do Laboratório de Química de Estados Sólidos e do Instituto do Milênio de Materiais Complexos. O especialista aprofundou a questão das perspectivas e aplicações dos nanomateriais a fim de demonstrar que a tecnologia nano já incorpora o cotidiano social.
Um nanômetro, ilustra Oswaldo, corresponde a um bilionésimo do metro, uma linha de grandeza em que até mesmo proteínas, vírus e bactérias são relativamente grandes. Porém, a dimensão nano, ainda que ganhando mais espaço nas discussões acadêmicas e midiáticas apenas agora, já era manipulada no ano 300 d.C., quando homens modelaram espadas com o chamado aço de damasco, ou aço de Wootz, conhecido por sua alta resistência e eficiência de corte. Em 1912, há também indícios em revestimentos produzidos no Irã, que apresentavam efeitos de cores possíveis somente com a nanotecnologia — o fenômeno da iridiscência, presente nas borboletas azuis, que consiste na interferência de estruturas nano no caminho percorrido pelo raio de luz, ocasionando cores diferenciadas. A taça de Licurgo, que remonta do século IV d.C., é mais um exemplo. Ela foi produzida em vidro rubi acrescentado de nanopartículas de ouro, adquirindo uma coloração vermelha sempre que absorve a luz azul, sua cor complementar.
Como conquistas mais recentes, o palestrante citou o fulereno, um poliedro montado, em 1985, a partir de 60 átomos de carbono. Esse mesmo tipo de átomo foi utilizado na construção de nanotubos, em 1989. Não demorou muito também para estudiosos desenvolverem a nanoescrita, inaugurada com a sigla IBM desenhada com 35 átomos de xenônio sobre uma superfície metálica. A litografia dip-pen — método de escrita direta que utiliza a ponta de prova de um Microscópio de Força Atômica para definir padrões sobre uma superfície —, ressalva Oswaldo, permite muito além de escrever a bíblia na cabeça de um alfinete. É uma ação capaz de impor estruturas específicas em uma área, com o posicionamento preciso de átomos e moléculas, estando associada à fabricação de semicondutores. A eletrodisposição de nanoestruturas, outro exemplo dado pelo especialista, é uma atividade dominada por Cingapura e pela Coréia com o objetivo de aumentar a capacidade de armazenamento de informações, de que resultou o pen-drive.
Em seguida, Oswaldo cedeu mais detalhes a respeito da propriedade de auto-organização de algumas estruturas nano que podem ser utilizadas na formação de nanosistemas, haja vista que permitem uma maior riqueza de interações. A Engenharia de Cristais faz parte deste setor, assemelhando-se, nas palavras do pesquisador, às peças de lego. “São blocos de construção que adquirem formas complexas e podem, portanto, conferir inteligência aos sistemas que venham a ser elaborados.
Retomando a questão dos nanotubos de carbono, Oswaldo apresenta as engrenagens moleculares. “Basta acrescentar em cada nanotubo algumas barras laterais que permitam um encaixe e inicie uma dependência de movimentação. Mais ainda, posicionando um nanotubo dentro de outro com essas alças, está aplicado em escala nano o princípio do motor”.
Para esclarecer mais a utilidade da nanotecnologia, o especialista foi extenso. Explicou os sistemas de superfície nanocatalisadoras, que aumentam a eficiência da catálise — velocidade de reações químicas —, permitindo causar menos débito ambiental e molecular, reduzindo automaticamente os prejuízos. A tecnologia nanocatalítica foi utilizada na província chinesa de Shenhuam para a conversão de carvão em diesel. A utilidade se encaixa também na confecção de protetores solar e substâncias lubrificantes. Avanços nesta área de estudo, segundo Oswaldo, beneficiam até mesmo telefones celulares que podem vir a ser carregados por células movidas ao calor solar. É possível, ainda, otimizar a energia eólica com a adição de nanocompósitos — a base de nanotubos de carbono — nas pás dos rotores. Assim, diminui-se o peso da estrutura e aumenta-se a resistência, bem como é elevada a capacidade de geração de energia. Os mesmos tubos podem ser aplicados para substituir os filamentos nas lâmpadas, ampliando a luminosidade.
Oswaldo prossegue. “Em dimensão nano, foi desenvolvida uma tinta auto-limpante para carros. Ela já é utilizada em alguns modelos da Mercedes Benz, pois não risca e não perde o brilho, além de possuir uma propriedade hidrofóbica que impede a água de escorrer. As gotas literalmente rolam e levam consigo a sujeira. Os benefícios de superfícies repelentes à água foram aplicados no Pilkington Activ, um vidro auto-limpante — ele foi acrescido de óxido titânico, substância que, em contato com a luz solar, decompõe as sujeiras que grudam no vidro e permitem que elas sejam facilmente carregadas pelas gotas de água rolantes”.
Outras novidades que incluem as meias bactericidas, compostas de nanopartículas de prata. São indicadas principalmente para pessoas que sofrem de diabete aguda e têm os pés danificados. Tecidos com a mesma propriedade podem vir a ser utilizados na confecção de lençóis para leitos em hospitais, reduzindo casos de infecções hospitalares. Materiais implantáveis e bio-aborvíveis pelo homem também são possíveis graças à nanotecnologia. A simulação de ossos para reparação de lesões é uma realidade. Sensores implantáveis, a exemplo do Cardiomems, compõem as conquistas. São microchips sem fio implantados no corpo, capazes de interpretar informações como o fluxo sanguíneo e a pressão. Implantes cocleares e retinas artificiais, respectivamente para casos de deficiência auditiva e visual, estão entre as possibilidades de êxito pela dimensão nano.
Oswaldo finalizou sua palestra com a mensagem de que “é necessário atrair os jovens para a questão da nanotecnologia, estimular pesquisadores com mentalidade industrial, aumentar os investimentos na área, introduzir no Brasil uma cultura de patentes, gerar um esforço pela regulamentação dos estudos em nano e suas metodologias, instituir limites éticos e cuidados, além de promover um espaço para o diálogo entre a comunidade científica e a sociedade a respeito dos benefícios que podem surgir do universo nanométrico. Melhorias que englobam a energia, o tratamento de água, a remediação ambiental, práticas da medicina, da agricultura e muito mais”.