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Memória

“Direito ao nosso corpo. Legalizar o aborto”

 Fotos: Marco Fernandes
  

Ana Cristina Pimentel, diretora de Mulheres
da UNE, Nilcéa Freire, ministra da Secretaria
Especial de Políticas para Mulheres (SPM), 
Lúcia Stumpf, presidente da UNE e represen-
tantes da União Brasileira de Mulheres, da
Confederação das Mulheres do Brasil, do
PCdoB/RJ e da Marcha Mundial de Mulheres.

A União Nacional dos Estudantes (UNE) lançou dia 27 de setembro, no campus da Praia Vermelha da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), sua nova campanha “Aborto seguro e legal! Uma responsabilidade do Estado com as mulheres”. Para expor os argumentos que levaram à decisão de iniciar uma luta nacional pela legalização do aborto, foram convidadas à mesa Ana Cristina Pimentel, diretora de Mulheres da UNE, Nilcéa Freire, ministra da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres (SPM) e representando a União Brasileira de Mulheres (UBM), Conceição Cassano, da Confederação das Mulheres do Brasil,  Beatriz Resende, coordenadora do Fórum de Ciência e Cultura (FCC/UFRJ), Ana Rocha, presidente da cede do Rio de Janeiro do Partido Comunista do Brasil (PCdoB/RJ), Nalu Faria, representante da Marcha Mundial de Mulheres (MMM) e Lúcia Stumpf, presidente da UNE.

Ana Cristina, estudante da Faculdade de Medicina na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), explicou que desde 2005, no I Encontro de Mulheres da UNE, ficou definido o apoio pela legalização do aborto, aprofundando a discussão pelo direito da mulher de decidir a respeito de seu próprio corpo. O objetivo, entre outros, é romper com a estrutura social que dita a maternidade como destino feminino obrigatório, daí o lema “Direito ao nosso corpo! Legalizar o aborto!”.

A ministra da SPM usou seu discurso para reforçar a necessidade de efetivar no Brasil o compromisso de rever as leis punitivas contra a interrupção forçada de uma gravidez. Neste sentido, elogia a iniciativa da UNE, considerando sua campanha importante por reunir a força jovem no combate a esta realidade clandestina do aborto que causa a morte de milhares de mulheres por ano no país. Contudo, Nilcéa adverte que “este é um direito que deve ser usado raramente, mas que precisa estar disponível para aquelas que se decidam por abortar. Assim, será garantido que a mulher, em sua escolha, não seja presa ou morra por ser obrigada a passar por um procedimento sem os devidos cuidados médicos”.

Conceição justifica que a luta representada pela UNE é, antes de qualquer coisa, uma reivindicação em defesa da saúde das mulheres. “Engravidar pode ser um acidente mesmo quando tomados todos os cuidados. Não há método contraceptivo que seja 100% eficaz, portanto, é preciso garantir o direito ao aborto sem que a mulher, que já está passando por uma situação naturalmente traumática, tenha que se sentir culpada”.  O elevado número de gestações interrompidas no Brasil indica, segundo ela, um problema econômico, a falta de planejamento familiar e a desinformação, haja vista que a maior parte dos abortos é realizada por mulheres assalariadas, de classes sociais desfavorecidas, que já têm até três filhos e desconhecem o uso adequado de métodos contraceptivos. Por isso, a campanha da UNE inclui na sua luta a exigência por soluções também desses obstáculos.

Beatriz, que compareceu ao evento representando Aluízio Teixeira, reitor da UFRJ, considera a legalização do aborto uma conquista importante nos direitos femininos. “É preciso garantir às mulheres a escolha de qual o melhor momento para dedicar-se à maternidade. Uma gravidez indesejada pode pôr fim a projetos de vida, forçando o abandono à faculdade, ao emprego, entre outras coisas. Ninguém diz aos homens quando eles devem colocar outros objetivos à frente de suas metas profissionais. Então, por que algumas pessoas consideram legítimo exigir de uma mulher que abandone tudo para ser mãe?”

Ana Rocha elogiou o fato de a juventude estudantil ter tomado a liderança por uma luta polêmica na sociedade.  “Quando o PCdoB, junto com a candidatura de Jandira Feghali, oficializou o apoio ao direito feminino sobre seu corpo, houve uma reação violenta dos grupos que rejeitam o aborto como uma escolha válida. O que eles não percebem é que os altos índices de mortalidade de mulheres que interrompem a gravidez clandestinamente tornam o caso uma questão de Saúde Pública que precisa urgentemente ser resolvido”. Ana ironizou que a sociedade tenha invertido as noções de direito individual e direito de intervenção pública. “Abortar, que é claramente um direito de escolha pessoal, tornou-se erroneamente uma ação de intervenção judicial quando foi classificado como crime. Já as condições favoráveis no país para uma mulher criar seus filhos, que é efetivamente um dever público, isso a sociedade deixa por responsabilidade inteira da mulher, abandonando-a nesta árdua missão”. 

Nalu Faria reiterou o argumento econômico ao declarar que o aborto é um problema para todas as mulheres, mas atinge principalmente as de classes sociais mais pobres. Os procedimentos clandestinos, que ocorrem em condições precárias de higiene e cuidados, não afetam pessoas de alto poder aquisitivo porque essas, mesmo ilegalmente, podem recorrer a abortos em clínicas de luxo.  Segundo ela, legalizar é democratizar o direito de uma mulher a não precisar pôr a própria vida em risco apenas por se ter escolhido interromper uma gravidez.

Lucia oficializou a campanha pela legalização do aborto ao final do evento, justificando que a UNE, caracterizada por sempre lutar pela plena democracia do povo, não podia permitir na sociedade uma censura contra aquelas que não desejam ter filhos na hora errada. Os estudantes estão unidos, de acordo com Lucia, para exigir que a mulher possa decidir por seu corpo. Além disso, a UNE tem a intenção de intensificar o acesso à informação sobre a questão do aborto para toda a população e ampliar esforços que viabilizem uma efetiva política de planejamento familiar. A luta teria duas frentes, uma que garantisse o aborto legalizado para quem deseja interromper a gravidez, e outra de auxílio às mulheres, principalmente jovens, que decidam encarar a gestação e dedicar-se à maternidade.