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Tempos de paz e rastros de guerra

 O projeto Ciência às Seis e Meia deste mês, organizado pela Casa da Ciência da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), contou com a presença de Domicio Proença Júnior, um dos pesquisadores e líderes do Grupo de Estudos Avançados da UFRJ, com a discussão do tema “Outro Setembro diante da Guerra”.

Domicio passou um breve histórico do ataque às torres gêmeas do World Trade Center nos Estados Unidos por dois aviões no ano de 2001, e comentou a política anti-terrorista que se instaurou no país desde então, a forma como isso afeta a vida cotidiana da população local e, principalmente, de pessoas que tentam ingressar no território norte-americano ainda que legalmente.

— A verdade é que métodos contra o terrorismo criam situações desconfortáveis e facilmente preconceituosas. Para entrar nos Estados Unidos, antes é necessário preencher um formulário entre as quais estão as perguntas “Qual é a sua religião?” e outra, que adoro, “Qual sua cor preferida?”. Por isso, aconselho os presentes aqui: se vocês gostarem de verde, podem se tornar suspeitos de terrorismo — ironiza o pesquisador.

Um ponto explicitado pelo palestrante foi a participação do corpo social contra essa violência organizada. “No ataque de 11 de Setembro, pode-se citar o último avião, em que os passageiros se uniram contra os transgressores, impedindo que o vôo atingisse seu destino contra a Casa Branca”. Segundo ele, chega um momento em que as pessoas reconhecem que vale arriscar suas próprias vidas em nome da pátria. O problema é que, em geral, logo depois predomina um remorso, um medo de se assemelhar ao terrorista. “Uma idéia ilustrada pelo filósofo Nietzsche ao dizer que quem muito luta contra monstros, acaba se tornando um. Por esse e outros motivos, fica um conflito em cada indivíduo de como reagir contra o terror”, reflete Domicio.

Nesta mesma luta, deve-se pensar os governantes e as saídas que eles estipulam para evitar ataques violentos. Uma sugestão é controlar as informações que circulam pelo fluxo virtual online. “Felizmente, isso é bastante criticado. O terrorismo, de forma alguma, deve servir de desculpa para controlar o conteúdo na internet”, argumenta o pesquisador.

Em seguida, o estudioso e diretor do Instituto Brasileiro de Combate ao Crime (IBCC), mencionou a tensão instaurada na América do Sul com a decisão do presidente venezuelano, Hugo Chávez, de comprar 20 aviões de guerra. “Não é uma corrida armamentista, como alguns mais histéricos definem, porém, não deixa de ser um perigo possível”. O Brasil deveria se preparar para isso, entretanto, Domicio esclarece que ter os aviões esbarra com complicações, tal como o alto custo de manutenção destas grandes armas em tempos de paz para que elas estejam prontas para vôo em tempos de guerra.

Seguindo no seu raciocínio, o pesquisador explicou um pouco os estudos estratégicos do Brasil, desde a expulsão da corte portuguesa, instaurando o império nacional com Dom Pedro I. Passou pelo medo dos brasileiros de o território ser invadido por alguma potência européia no período pós-napoleônico e pela Doutrina Monroe (de “América para os Americanos”), até os dias atuais.

Domicio concluiu a palestra apontando as falhas nos sistemas de defesa brasileiros e a não-exploração do potencial que há no país para melhorar esta questão. Ele mencionou os problemas na Marinha, que falha em assegurar as fronteiras marítimas e, então, o país sofre com a pirataria. “Além de prejuízos em mercadorias, acontecimentos assim inibem investimentos no Brasil”. Outro problema envolve a Força Aérea, que decretou situação de falência no ano de 2000. De acordo com o especialista, este fato reflete, hoje ainda, em carências estruturais que podem vir a pôr em risco a vida de muitos cidadãos.

— A delicadeza deste quadro deve receber a devida atenção. Um país cuja população não confia na sua Força Armada, logo estaria imerso em uma Guerra Civil. A primeira medida do povo seria definir como desarmar o Exército, a Marinha e a Aeronáutica. O passo seguinte: como recriar estes sistemas de defesa. Um empasse de difícil solução — argumenta Domicio.