Categorias
Memória

UFRJ discute os dilemas da pós-modernidade

 Nos dias 5 e 6 de setembro, o programa de pós-graduação em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social – EICOS, do Instituto de Psicologia da UFRJ está realizando o I Seminário Internacional Clínica da Pós-modernidade. O evento propõe o debate das formas de subjetivação, de violência e dessimbolização na sociedade contemporânea, através de palestras ministradas por especialistas de diferentes instituições de ensino.

Na manhã de quarta-feira, foram discutidos os temas “formas de saber na cultura contemporânea”, pela psicóloga Marília Amorim, e “pragmatismo e naturalismo: atualidade de John Dewey”, pelo filósofo Patrick Berthier, ambos professores da Universidade Paris VIII. A abertura ficou por conta de Ana Szapiro, professora do programa EICOS/UFRJ, que destaca a complexidade do tema abordado e agradece aos convidados e à organização do evento por tornar possível a discussão dos conceitos que surgem na sociedade atual.

As formas de saber e do discurso na contemporaneidade

Marília Amorim abre o ciclo de palestras analisando as relações entre o discurso e os tipos de saber, que divide em três linhas: narrativa, demonstrativa e da situação. À última, a especialista presta especial destaque, pois essa seria a forma que exerce atualmente maior influência em nossa sociedade. “Precisa-se aprofundar a idéia de que para cada forma do saber existe um modo de dizer específico, particular”, define Marília, destacando que “o objetivo dessa discussão é fazer perceber que, a partir de determinado momento, as mudanças profundas que acompanham a sociedade ocidental alteram e transformam também essas formas do saber”.

Segundo a psicóloga, existe a necessidade de entender as marcas da pós-modernidade. “O período Moderno preza pela racionalidade, pela independência em relação ao religioso, ao mito. E o atual, pós-moderno, carrega quais características? Essa indagação nos leva ao novo paradigma da sociedade, que divide opiniões entre apocalípticos, entusiastas e críticos desse momento”, revela a palestrante, fazendo referência a um livro de sua autoria, publicado na França, chamado “Narrar, demonstrar e sobreviver: formas de discurso na sociedade contemporânea”.

Marília explica que o ser humano constitui-se na narração e no saber da sobrevivência: “a lógica do conhecimento e do combate estratégico estrutura-se no ‘saber produzir’ em uma situação imediata. Existe uma relação de força com os objetos, de luta com as ‘coisas’, acentuada na pós-modernidade. A expressão ‘se virar’ – no sentido de buscar algum objetivo, sem esquecer, entretanto, o sentido literal de movimento – define bem a polimorfia dos tempos atuais: é preciso possuir um corpo móvel e flexibilidade máxima, assumir todas as formas exigidas pelo contexto social”, compara a especialista.

Nesse contexto, a psicóloga destaca a flexibilidade como o imperativo contemporâneo. “Cada vez mais, a situação convoca o ‘se virar’, a transformação pelas circunstâncias. A identidade torna-se solúvel. O capitalismo, regente da sociedade ocidental e das leis de mercado, pede isso”, conta Marília.

A especialista enfatiza, entretanto, que o saber da situação não é recente. “O que é novo é o lugar que essa forma de inteligência ocupa, do mesmo modo que acontece com o saber da metamorfose discursiva. A forma do discurso, quando transformada em hegemônica, torna esse tipo de inteligência um elemento decisivo por colocar em crise o aparelho da enunciação – por exemplo, o Nazismo: a ordem, o nacionalismo ufanista, a superioridade ariana, a repressão aos judeus e outras minorias, são exaltados através da narrativa – levando a conseqüências enormes”, alerta a psicóloga.

Marília então define o saber pós-moderno como uma cultura marcada pela inversão de papéis e polimórfica. “A sociedade atual pode ser considerada um carnaval triste, onde se confundem os papéis do eu, tu e ele, impulsionados pelo destaque dado em nosso tempo ao saber da situação. Deve-se atentar, porém, aos problemas que surgem quando uma das três formas de inteligência parte para a autonomia: se essas linhas do saber se estruturam na história de forma a impedir um equilíbrio entre elas, é necessário adotar um pensamento crítico”, conclui a especialista.

Programação
Após a apresentação de Marília Amorim, Berthier, discutiu o pragmatismo e o naturalismo, sob a ótica do norte-americano, John Dewey, um dos fundadores da escola filosófica de pragmatismo e pioneiro no estudo da psicologia funcional. Ainda no primeiro dia do Seminário, foram abordados os temas “transgênese: digitalização e edição da vida e suas conseqüências culturais”, por Jonatas Ferreira, professor de Ciências Sociais da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), e “tecnologias da vida: os novos sujeitos”, por Rosa Pedro, psicóloga e professora coordenadora do programa EICOS.

O evento tem continuação nesta quinta-feira, com a realização de mais cinco palestras: clínica, pluralidade e dialética: os desafios da psiquiatria contemporânea; o imperativo da utilidade: efeitos sobre o sujeito na era biotecnológica; novas formas de subjetivação = novos sintomas; economia de mercado, economia política e economia psíquica; o mito de Ícaro e a banalização contemporânea. O Seminário Clínica da Pós-modernidade acontece no Salão Dourado do Forum de Ciência e Cultura, que fica à Avenida Pasteur, nº250 – campus UFRJ da Praia Vermelha.