Nos dias 18, 19 e 20 de junho, a Escola de Comunicação promoveu a II Semana de Quadrinhos da UFRJ. O evento trouxe profissionais de diversas áreas, alguns bastante conhecidos do grande público, com o objetivo de discutir temas relacionados às artes seqüenciais.
Ano passado, a I Semana de Quadrinhos discutiu temas como charges e o humor em jornais, história, educação e cultura nas HQs, e a construção da identidade nos quadrinhos. Participaram das mesas figuras conhecidas, como Aroeira, Miguel Paiva e Adão Iturrusgarrai. Além disso, oficinas, exposição de trabalhos amadores e profissionais, exibição de animações e um concurso de charges também complementaram e deram maior interatividade ao evento.
No dia 18, segunda-feira, o tema da mesa foi “Mercado Editorial de HQs”. Participaram dela André Diniz, da Editora Nona Arte, André Dahmer, criador dos quadrinhos “Os Malvados” e Marcelo Campos, da Fábrica de Quadrinhos.
No dia 19, o tema foi “Vertentes das HQs”, e contou com a presença de Carlos Latuff, Chico Caruso, Cláudia Bolshaw e Jaguar, que abriu a mesa de debates. Jaguar, pseudônimo de Sérgio de Magalhães Gomes Jaguaribe, é um dos maiores e mais reconhecidos cartunistas brasileiros. Começou sua carreira na década de 50, na antiga revista manchete. Por influência de seu chefe no Banco do Brasil, Sérgio Porto, mais conhecido como Stanislaw Ponte Preta, passou a dedicar sua carreira ao humorismo. Foi um dos fundadores da revista O Pasquim, surgido no final da década de 60, em oposição à ditadura militar no Brasil. Atualmente, escreve para a revista O Dia.
Jaguar comentou sobre o início da sua carreira, e a rotina durante a época do Pasquim. “A minha profissão é cartunista, mas eu sobrevivo mesmo como chargista, e também escrevendo crônicas. No Pasquim eu fazia de tudo um pouco, desde o trabalho de office boy até o de cronista”. Afirmou também, que se considera um desenhista preguiçoso, por não se ater muito a detalhes, e não gostar de desenhar cenários.
Em seguida, Chico Caruso iniciou sua fala. Caruso é cartunista, chargista, músico e humorista. Já trabalhou em diversos veículos da grande mídia, e, desde a década de 80, trabalha pro Jornal O Globo. Em discurso bem-humorado, comentou que no final dos anos 60 queria desenhar quadrinhos, e sempre foi muito sintético em desenhos, assim como Jaguar. Não gosta de produzir fundos nem cenários. “Hoje trabalho no O Globo, e minhas animações também são animadas por computador, no Fantástico e Jornal Nacional.” Apesar de suas múltiplas funções, é especialista em charges – linguagem universal, em um plano mais geral, segundo ele.
Cláudia Bolshaw, coordenadora do Núcleo de Animação da PUC-Rio, contou um pouco de sua experiência dentro deste trabalho. “Apesar de fazermos muitos trabalhos políticos, de cunho social, também fazemos piadinhas. Para passarmos uma boa idéia, não precisamos ser tão rápidos quanto Jaguar e Caruso. A animação dá mais trabalho, mas ao mesmo tempo, temos maior controle sobre ela. Podemos controlar melhor o tempo”, afirma Claudia.
Além disso, a professora exibiu dois filmes feitos no Núcleo. O primeiro era o Manifesto 15 de Agosto, uma fotografia animada, sobre o horário eleitoral gratuito, e o segundo foi um filme totalmente produzido e animado por crianças com Síndrome de Down, do Instituto Helena Antipoff.
Carlos Latuff foi o último a discursar na mesa. Latuff é um ativista artístico, e produz desenhos copyleft – sem direitos autorais – para o movimento zapatista, do México. Em 1999, após uma viagem aos territórios ocupados da Cisjordânia, transforma-se em defensor da causa palestina. Começou falando sobre o início de sua carreira, e como passou a seguir os rumos de hoje. “Comecei em 90 trabalhando na imprensa sindical, mas não por questões ideológicas, mas por falta de espaço mesmo. Em 1997, fiz contato com os zapatistas, e aquilo mudou completamente minha visão de mundo. Foi a partir daí que comecei a desenvolver trabalhos copyleft. Em 1999, após a viagem à palestina quando passei a dedicar meu trabalho artístico a eles, muitos começaram a me chamar de anti-semita.” Latuff construiu sua carreira fora das grandes mídias, no meio alternativo. Porém, tem feito trabalhos não tão ideológicos, como por exemplo as tiras de quadrinhos de Cho Seung-Hui, o “matador” sul-coreano.
No dia 20, o tema da mesa foi “HQs como Identidade Cultural”. Participaram do debate Álvaro de Moya, Moacy Cirne e Carlos Patati. Moya, o primeiro a falar, é jornalista, escritor, produtor e diretor de cinema e televisão, além de chargista, ilustrador e produtor de quadrinhos com temática nacionalista. Em seu discurso nostálgico e espontâneo, disse que começou a desenhar quadrinhos antes mesmo de aprender a ler, com os gibis do Flash Gordon de seu irmão. “Muito tempo depois, em 18 de setembro de 1950, fiz os letreiros do show de inauguração da TV Tupi em São Paulo. Em 18 de junho de 1951, fui um dos responsáveis pela primeira exposição de história em quadrinhos no mundo, com originais do Flash Gordon, entre outros. Naquela época não nos demos conta da importância disto. Só 12 anos depois os intelectuais europeus começaram a estudar história em quadrinhos, e aí que percebemos.”, afirmou Moya.
Depois, foi a vez de Moacy Cirne. Professor aposentado do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal Fluminense, é considerado o maior estudioso brasileiro das histórias em quadrinhos. “Comecei e dar aula sobre quadrinhos, na UFF, em 1972. Minha preocupação sempre foi mostrar que o quadrinho tem uma importância acadêmica.”, disse o professor.
Carlos Patati, roteirista de quadrinhos e um dos autores do “Almanaque dos Quadrinhos”, comentou sobre suas pretensões nesta arte: “Nunca tive ambição de desenhar bem, mas escrevo para as pessoas desenharem. Existe uma diferença grande entre o roteirista e o desenhista, algo que às vezes as pessoas confundem.” Discursou, ainda, sobre as diferenças regionais no quadrinho. “Existe uma tradição no Brasil de se valorizarem quadrinhos de humor. Diferente da Argentina, em que o quadrinho de aventura é muito bem-visto.”
Os três artistas, ao final, celebraram a arte de Hugo Pratt, desenhista de quadrinhos italiano que criou o célebre personagem Corto Maltese, além de outras séries.
A II Semana de Quadrinhos contou ainda com mostra de animações, nos três dias, exposição e feira de livros e oficinas de Computação Gráfica e Animação, Manga, Edição de Revista Independente e Animação Stop-Motion.
O evento foi realizado pelo Programa de Educação Tutorial da Escola de Comunicação (PET-ECO), com o apoio da Fundação Universitária José Bonifácio, ECO, ECO-Pós, Animarte e a Pró-reitoria de Pós-graduação e Pesquisa.